No texto, o BC voltou a mencionar as incertezas que têm marcado o cenário internacional. Já de início, a autoridade monetária destacou que o ambiente externo se deteriorou. Desde a última reunião do Copom, em fevereiro, Silicon Valley Bank e Signature Bank fecharam nos Estados Unidos; para conter o espraiamento da crise bancária, autoridades suíças obrigaram o UBS a comprar o Credit Suisse. Ainda assim, o economista-chefe interino da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Álvaro Pereira, destacou que a inflação segue como a principal preocupação mundial. As decisões mais recentes do Federal Reserve (Fed) e do Banco Central Europeu (BCE) convergem nesse mesmo sentido.
O Banco Central brasileiro tem o mérito de ter iniciado o ciclo de aumento dos juros mais cedo que seus pares, mas isso não quer dizer que o trabalho esteja concluído. No curto prazo, o índice oficial de inflação subiu 0,84% em fevereiro; 65% dos 377 subitens que compõem o indicador tiveram aumento de preço. Serviços, um dos setores mais sensíveis aos efeitos da política monetária, aumentaram 1,41% no mês passado. Em 12 meses, o IPCA acumula alta de 5,60%, ainda acima da meta. No médio prazo, as expectativas para a inflação deste ano e de 2024 subiram nas últimas semanas e permanecem superiores ao intervalo de tolerância.
O cenário é complexo e inspira muita cautela, mas houve quem esperasse uma demonstração de boa vontade com o governo Lula por parte do BC. Só se o ato estivesse investido na mais pura fé. Afinal, a despeito do esforço do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o principal e mais aguardado anúncio da equipe econômica foi adiado para abril. As premissas da proposta que substituirá o teto de gastos seguem desconhecidas, mas isso não impediu que elas fossem bombardeadas por integrantes do governo. Essas críticas, afinal, não dizem respeito aos detalhes do projeto, mas à própria necessidade da âncora e ao que ela representa em termos de responsabilidade fiscal.
A ausência de um arcabouço crível tem sido a principal responsável pela desancoragem das expectativas do mercado em relação aos juros futuros e à inflação. Haddad tem plena consciência disso, diferentemente de muitos de seus colegas de Esplanada que se recusam a aceitar esse aspecto inexorável da economia. A reunião do Copom nem havia acabado, mas o ministro da Casa Civil, Rui Costa, já havia dito que a atuação de Roberto Campos Neto à frente do BC era um desserviço para a população.
Em um debate econômico contaminado pela disputa política, o presidente do BC seria um perfeito bode expiatório. Além de ter sido indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro ao cargo, ele fez questão de votar vestido com uma camisa da seleção brasileira. Mas essa narrativa não resiste à realidade dos fatos. A decisão de manter os juros não foi somente dele, mas dos outros oito diretores que integram o colegiado do Copom.
A tentativa de personificar a discussão pode até agitar a claque de apoiadores, mas também expõe a falta de argumentos técnicos de quem coordena esses ataques. Isso, sim, é um verdadeiro desserviço ao País. O governo pode espernear à vontade, mas isso não muda a principal missão institucional do BC, que é proteger a estabilidade do poder de compra da moeda. Do lado fiscal, se assim desejar, o governo tem muito a contribuir para o cumprimento desse objetivo.
Comentário do programa
Os analfabetos políticos precisam saber que a independência do Banco Central, existente em países sérios, visa justamente evitar que sejam tomadas decisões meramente políticas para atender aos interesses partidários do Governo de plantão. Economia é coisa séria. não pode ficar exclusivamente ao livre arbítrio dos politiqueiros. Medidas políticas têm que ser justificadas pelo bem público e não por interesses partidários. Fazendo eco com o editorialista, se Lula quer juros mais baixos tem que fazer a sua parte, com medidas que combatam realmente a inflação. E não com medidas meramente eleitoreiras. Brasil acima de tudo (de verdade!) e o resto que vá para o lixo! (LGLM)