Liberar abertura de cursos de medicina é correto, mas não resolve disparidades
(O que pensa a Folha em editorial, em 08/04/2023)
O Ministério da Educação autorizou a abertura de novos cursos de medicina em instituições privadas de ensino superior, que havia sido barrada por portaria de Michel Temer (MDB) em 2018, sob o argumento de que a proliferação de escolas diminuíra a qualidade.
O problema maior da educação médica no país, porém, não está no número de cursos, mas na formação deficiente e na distribuição desigual entre as regiões.
No ano da portaria de Temer, o Brasil era o segundo país com maior número de faculdades de medicina no mundo: 322 para cerca de 210 milhões de pessoas. A Índia, primeira colocada, tinha 400, mas com o sêxtuplo da população. Nos EUA, eram 131 para cerca de 320 milhões de habitantes.
A quantidade não é acompanhada de qualidade. No exame realizado pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, que não é obrigatório para o exercício da profissão, mais da metade dos prestantes acaba reprovada.
A formação poderia melhorar se avaliações como a do Cremesp se tornassem obrigatórias para a atuação profissional —assim como ocorre com os formados nos cursos de Direito, que precisam passar na prova da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Em relação ao número de médicos por habitantes, não temos excesso de profissionais. Há 502.475 médicos no país, com média de 2,4 profissionais para cada mil habitantes, enquanto a média da OCDE é 3,2, e 4 em Portugal.
Há distorções, repita-se, na distribuição: 55% dos médicos estão no Sudeste, que tem 42% da população, enquanto o Nordeste tem 18% dos profissionais e concentra 27% dos brasileiros. No Rio de Janeiro, há 3,7 médicos por mil habitantes, mas no Maranhão há 0,8.
Para minar essas discrepâncias, a nova regra condiciona a criação de vagas e cursos ao chamamento público —quando o governo federal indica em quais municípios as faculdades poderão ser abertas, considerando as necessidades do Sistema Único de Saúde (SUS).
A volta do programa Mais Médicos, reformulado com incentivos para fixação dos profissionais, é outro recurso para tentar sanar disparidades regionais.
Mas problemas complexos exigem mais do que medidas paliativas. É preciso oferecer condições de trabalho atrativas para médicos e úteis à população, como infraestrutura e novas tecnologias capazes de gerar resultados duradouros.
Comentário nosso
Temos aí dois problemas, onde um pode resolver o outro. Se faltam médicos e a maior falta é justamente em determinadas áreas, por que não condicionar os financiamentos do FIES, destas novas faculdades, à prestação de serviço pelos novos médicos justamento no programa Mais Médicos. Quem pagasse o próprio curso, podia escolher para onde ir. Quem usasse o FIES teria que prestar serviço na Mais Médicos por determinado tempo ou até pelo tempo de vigência do contrato do FIES. (LGLM)