Brasil nada ganha e perde muito

By | 18/04/2023 1:25 pm

Loquacidade irresponsável de Lula na China põe em risco a imagem do Brasil como neutro nos grandes conflitos, sem que o País tenha ganhado nada, a não ser a desconfiança ocidental

(Editorial do Estadão, em 18/04/2023)

Imagem ex-libris

Não pode ser outra a explicação para o comportamento de Lula em sua recente viagem à China, ocasião em que transformou o Brasil em sabujo dos interesses chineses só e exclusivamente para se distanciar dos Estados Unidos, o velho vilão da esquerda brasileira.

No afã de parecer independente dos americanos, Lula esteve a um passo de alinhar o Brasil à Rússia na guerra criminosa de Vladimir Putin contra a Ucrânia. Não se sabe exatamente o que o Brasil ganhou com esses gestos tresloucados de Lula, mas sabe-se o que está perdendo: sua tradicional imagem de país equilibrado, neutro em relação aos principais conflitos, mas defensor intransigente dos direitos humanos – como, aliás, está expresso no artigo 4.º da nossa Constituição. Isso sem falar em ruídos desnecessários com parceiros relevantes, como Estados Unidos e Europa.

Na viagem à China, Lula se destacou por sinalizar o alinhamento do Brasil a uma ordem internacional baseada no autoritarismo e na força em oposição a uma ordem baseada no direito internacional e na valorização dos direitos humanos, do pluralismo político e das liberdades civis. Tudo a pretexto dos “interesses econômicos”.

De fato, as transferências tecnológicas da China são do interesse do Brasil. Para simbolizá-lo, Lula poderia visitar um dos muitos fornecedores chineses. Mas selecionou a dedo a Huawei, epicentro de um entrevero no Ocidente por suspeita de espionagem, e lá bradou que “ninguém vai proibir que o Brasil aprimore sua relação com a China”.

Lula também resolveu bajular os chineses ao defender a substituição do dólar pela moeda chinesa nas transações internacionais, sugerindo que a prevalência do dólar é mais um sinal do imperialismo americano. Em um par de frases, deixou claro que, obnubilado pela ideologia, desconhece que o mundo prefere negociar com uma moeda emitida pelo banco central autônomo da maior democracia do mundo, cujos pesos e contrapesos impedem que o câmbio e o fluxo de capitais sejam controlados por um autocrata, como é na China.

Mas um dos pontos altos do vexame da viagem de Lula foi o momento em que, ao falar da guerra na Ucrânia, voltou a equiparar o agressor, a Rússia, ao agredido, a Ucrânia, e a condenar os EUA e a Europa por ajudarem os ucranianos a restaurarem sua soberania. As declarações de Lula não produziram nada a não ser indignação e indiferença e não melhoraram um centímetro a posição do Brasil na pretensão de integrar o time de mediadores do conflito. Hoje, aliás, o Brasil, graças à loquacidade irresponsável de Lula, é cada vez mais visto como não confiável, por sua aparente simpatia por russos e chineses. Em visita ao Brasil, o chanceler russo, Serguei Lavrov, não deixou por menos: “As visões do Brasil e Rússia são únicas”, numa referência à Ucrânia. Não foi desmentido pelo governo brasileiro – e nem poderia, porque Lula disse textualmente que a Ucrânia é tão culpada pela guerra quanto o país que a invadiu.

Em outro momento particularmente irresponsável, Lula resolveu apoiar “fortemente” a China na sua querela com a democrática Taiwan. Mesmo que a declaração não mude o entendimento tradicional do Brasil, ela poderia ser evitada no momento em que a China ameaça retomar Taiwan à força, desafiando os Estados Unidos.

Como se observa, Lula entregou dedos e anéis aos chineses e russos em troca de um punhado de acordos comerciais pouco relevantes, e sem levar nem mesmo um protocolar apoio à pretensão brasileira de integrar permanentemente o Conselho de Segurança da ONU. Lula quer se apresentar como um dos grandes estadistas do mundo. Se depender do que se viu na viagem à China, será visto apenas como peão no Grande Jogo chinês – ou, para usar as palavras benevolentes da revista Economist, como “ingênuo”.

Comentário

Category: Blog

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *