Por previsão constitucional, o presidente da República tem competência para indicar ao STF, dentre os “cidadãos com mais de 35 e menos de 70 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada”, quem ele quiser. Mas isso não significa que ele deva escolher de forma arbitrária ou irresponsável, sem ponderar as consequências da sua escolha tanto para a Corte como para o País. Esse cuidado é especialmente importante nos tempos atuais, em que o STF se encontra sob constantes ataques e ameaças.
Cabe advertir, desde logo, que Lula da Silva foi eleito para fazer diferente do modo como atuou Jair Bolsonaro. Indicar Cristiano Zanin para o STF seria seguir exatamente o mesmo padrão adotado por Bolsonaro, baseando a escolha presidencial exclusivamente no vínculo pessoal com o indicado. Nesse modo de proceder, há muitos erros, a começar pela compreensão antirrepublicana de que o ministro do STF deva ser um representante do presidente da República na cúpula do Judiciário.
Por ocasião da sabatina de Kassio Nunes Marques no Senado, dissemos neste espaço: “Sem maiores pudores, o presidente Bolsonaro admite que deseja se valer do poder de indicar novos ministros do Supremo para colocar amigos na Corte – e que, uma vez lá dentro, eles continuem atuando como amigos e defensores de seus interesses. Mais do que magistrados, Jair Bolsonaro almeja aliados – se possível, vassalos – do governo dentro do STF. Logicamente, o Senado não pode ser conivente com essa declarada tentativa de subjugar o Supremo a interesses subalternos” (Sem aprovação automática, 20/10/2020).
Ora, caso Lula da Silva venha a indicar Cristiano Zanin, a crítica seria rigorosamente a mesma: despudoradamente o presidente da República vale-se de uma atribuição constitucional para atender a seus interesses particulares. Essa eventual indicação explicitaria que a escolha de um integrante da Corte constitucional é feita segundo os mesmos critérios utilizados para definir um advogado para representação na Justiça. Ou seja, significaria perverter o funcionamento das instituições democráticas, que devem servir ao interesse público, não aos interesses particulares de quem está no poder.
Ressalta-se que não é simplesmente o fato de Cristiano Zanin ter sido advogado de Lula que torna desaconselhável sua indicação para o STF. É a ausência de qualquer conhecimento sobre suas posições jurídicas e sua específica compreensão do Direito e da Constituição. Não há nenhum elemento a justificar a escolha de seu nome para o STF além da circunstância de ter sido a voz de Lula da Silva em diversas ações penais. Seria realmente peculiar – talvez o mais correto seja dizer que se trata de deboche – que Lula da Silva, tendo diante de si o imenso conjunto de pessoas constitucionalmente aptas a integrar o Supremo, venha a escolher precisamente Cristiano Zanin, seu advogado. Tal atitude expressaria não apenas desconsideração por muitos nomes altamente qualificados, mas verdadeira insegurança. Do que Lula tem tanto medo? Quais podem ser as razões para evitar um nome técnico, sobre o qual não haja nenhuma sombra sobre seu notável saber jurídico e sua reputação ilibada, optando por recorrer a seu advogado?
A defesa do Estado Democrático de Direito não se coaduna com o exercício do poder para obter vantagens pessoais. Ao contrário do que fez o bolsonarismo, cargo público não é para servir à vida pessoal. Se Lula da Silva está preocupado com o Supremo, se deseja colaborar no fortalecimento da autoridade da Corte constitucional, não deve indicar seu advogado. As instituições democráticas não são quintal de cultivo de interesses particulares.