Texto é de autoria de Danielle Cunha, filha de Eduardo Cunha; recusa de abertura de conta bancária a político ou qualquer pessoa investigada vira crime com pena de prisão
A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira, 14, em votação relâmpago, um projeto de lei que pune o que chama de “discriminação” contra políticos. O texto é de autoria da deputada federal Danielle Cunha (União Brasil-RJ), filha do ex-deputado Eduardo Cunha. Vista como instrumento para blindar alvos da Operação Lava Jato, a proposta pretende colocar na cadeia quem recusar serviços, em instituições financeiras, para um político ou para seus parentes.
O texto aprovado na Câmara transforma em crimes de discriminação contra políticos as seguintes condutas praticadas por representantes de bancos, corretoras ou outras empresas do sistema financeiro: recusar a abertura ou a manutenção de contas bancárias, negar a concessão de empréstimo, ou rejeitar a prestação de outros serviços financeiros.
A versão aprovada na Câmara trata como pessoas politicamente expostas (PEPs) não só políticos eleitos e seus familiares, mas também a cúpula de órgãos militares, da magistratura e de partidos. A proposta foi criticada, sobretudo, por deputados do PSOL e do Novo, base e oposição a Lula, respectivamente. A última versão do texto ampliou para qualquer pessoa investigada, processada ou réu essa blindagem contra recusas de instituições financeiras.
Homem de confiança de Lira, o relator Cláudio Cajado (PP-BA) só entregou o relatório final, com o texto substitutivo, depois que a proposta entrou em votação por volta das 20h30. O presidente da Câmara conseguiu aprovar, em menos de 30 minutos, o requerimento de urgência, com 318 votos a favor e 118 contrários. Logo na sequência já colocou o projeto na votação do mérito da matéria, mesmo sob protesto de parlamentares.
O texto de Cajado, porém, retirou trechos da proposta original de Danielle, como o artigo que aumentava a punição para o crime de injúria quando praticado contra políticos – o que era visto como uma atuação em causa própria da deputada, uma vez que seu pai foi alvo de investigação de crimes de corrupção. Lira era próximo de Cunha, que comandava o Centrão, e hoje controla esse bloco de parlamentares.
Deputados pediram para Lira adiar a votação, pela falta de relatório final, mas ele negou a questão de ordem, sob o argumento de que o regimento permitia a análise a jato, mesmo sem o texto protocolado no sistema.
“Esse projeto assegura, sim, privilégios e dificulta investigações. Cria uma espécie de proteção a laranjas, a quem pratica ‘rachadinha’. É legislação em causa própria. Isso só vai fazer com que sejamos mais ofendidos nos aeroportos e para isso já há legislação. Ou vocês desconhecem que já há os crimes de calúnia, injúria e difamação?”, criticou o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ).
Nas redes sociais, o deputado cassado Deltan Dallagnol (Podemos-PR), que foi coordenador da Lava Jato em Curitiba, criticou a proposta. “É realmente indignante ver algo tão absurdo ser aprovado na Câmara dos Deputados! Será que em breve seremos presos por chamarmos o político pego com dinheiro na cueca de corrupto?”, escreveu. Ele também publicou um vídeo sobre a iniciativa dos ex-colegas.
Sem nenhuma menção a um caso concreto, defensores da proposta alegaram em discursos que até seus sobrinhos já tiveram contas negadas em bancos, pelo simples fato de serem parentes de políticos. “É inadmissível qualquer parente nosso ter sua conta sustada simplesmente porque é filho ou parente de político. Isso não é privilégio”, afirmou o deputado Elmar Nascimento (União Brasil-BA), líder do partido e cotado para suceder Lira na presidência da Câmara.
Pessoas politicamente expostas, segundo o texto aprovado na Câmara:
- Detentores de mandatos eletivos dos Poderes Executivo e Legislativo da União
- Ocupantes de cargo, no Poder Executivo da União, de ministro de Estado ou equiparado; natureza especial ou equivalente; presidente, vice-presidente e diretor, ou equivalentes, de entidades da administração pública indireta; e direção e assessoramento superior – DAS de nível 6 ou equivalente
- Membros do Supremo Tribunal Federal, do Conselho Nacional de Justiça, dos Tribunais Superiores, dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais do Trabalho, dos Tribunais Regionais Eleitorais, do Conselho Superior da Justiça do Trabalho e do Conselho da Justiça Federal
- Membros do Conselho Nacional do Ministério Público, o procurador-geral da República, o vice-procurador-geral da República, o procurador-geral do Trabalho, o procurador-geral da Justiça Militar, os subprocuradores-gerais da República e os procuradores-gerais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal
- Membros do Tribunal de Contas da União, o procurador-geral e os subprocuradores-gerais do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União
- Presidentes e tesoureiros nacionais, ou equivalentes, de partidos políticos
- Governadores, os vice-governadores, os secretários de Estado e do Distrito Federal, os deputados estaduais e distritais, os presidentes, ou equivalentes, de entidades da administração pública indireta estadual e distrital e os presidentes de Tribunais de Justiça, Militares, de Contas ou equivalentes de Estado e do Distrito Federal
- Prefeitos, os vice-prefeitos, os vereadores, os secretários municipais, os presidentes, ou equivalentes, de entidades da administração pública indireta municipal e os presidentes de Tribunais de Contas de Municípios ou equivalentes
Comentário nosso
Ladrões do Congresso não querem mais ser chamados de ladrões, nem sofrer qualquer tipo de recusa pelo fato de terem sido processados pelos crimes que cometerem. Tiveram a “cara de pau” de aprovar isso na Câmara e o projeto agora vai para o Senado. Ou seja querem continuar a roubar e tirar do cidadão o direito de recriminá-los e puni-los por isso. Em outras palavras, ladrões de gravata não querem mais ser chamados de ladrões. (LGLM)