As lucrativas férias dos juízes (seguido de comentário nosso)

By | 16/06/2023 10:59 am

Com dois meses de descanso remunerado, juízes relaxam e ainda ganham um extra vendendo parte das férias

 

(Editorial do Estadão, em 16/06/2023)

 

Imagem ex-libris

Levantamento recente do Estadão mostrou que, nos últimos seis anos, os tribunais gastaram ao menos R$ 3,5 bilhões com a compra de férias de juízes, desembargadores e ministros. Esse valor se deve ao fato de que as férias dos magistrados são de 60 dias. E muitos deles trocam parte dos dois meses de descanso anual, um evidente exagero, pelo recebimento de uma remuneração adicional, que não entra no cálculo do teto constitucional, atualmente de R$ 41,6 mil.

Ter “férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal” é um direito constitucional de todos os trabalhadores, urbanos e rurais. Segundo a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), na redação dada pelo Decreto-Lei 1.535/1977, as férias integrais têm duração de 30 dias corridos.

No entanto, a Lei Orgânica da Magistratura (Lei Complementar 35/1979) estabeleceu para os juízes um regime diferenciado, mais confortável. “Os magistrados terão direito a férias anuais, por sessenta dias, coletivas ou individuais”, diz o art. 60.

Trata-se de um escárnio com o princípio da igualdade, fundamento do Estado Democrático de Direito. Por lei, todos têm 30 dias de férias. Mas justamente aqueles que têm a tarefa de aplicar a lei para todos dispõem de um regime próprio, que assegura – não se sabe a razão – o dobro de tempo de descanso.

Vendo a agradável benesse dos juízes, os membros do Ministério Público também quiseram o mesmo tratamento. E conseguiram. A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei 8.625/1993) dispõe que “o direito a férias anuais, coletivas e individuais, do membro do Ministério Público, será igual ao dos magistrados”. De novo, o deboche com a igualdade. Aqueles incumbidos pela Constituição da “defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” não almejaram um período de férias igual ao de todos os trabalhadores brasileiros, urbanos ou rurais. Quiseram ser como os juízes.

A previsão legal de férias em dobro para alguns viola o dispositivo constitucional de que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. E pior, ao assegurar o privilégio para juízes e promotores, a lei criou um problema adicional. Aqueles funcionários públicos que deveriam ter mais profundamente incorporado o princípio republicano da igualdade – só assim poderão interpretar e aplicar bem o Direito para todas as pessoas – são tratados pela própria lei como indivíduos de categoria superior, a merecer o dobro de férias.

A previsão legal de férias de 60 dias é inconstitucional e inteiramente disfuncional. Ela não contribui para a melhor distribuição da Justiça. Ao contrário, faz com que o intérprete do Direito, seja na função de magistrado, seja na de membro do Ministério Público, se sinta acima do restante dos cidadãos. E – detalhe não pequeno – a pretensa superioridade sobre os outros não é dada por algum devaneio particular, mas pelo próprio texto legal, o que, por óbvio, nenhuma lei tem autoridade para fazer, já que contraria a Constituição.

 

Comentário nosso

Concordamos plenamente com a opinião do Estadão. Férias de 60 dias para juízes e promotores é uma afronta ao trabalhador comum. Este só tem 30 dias de férias e geralmente vende dez dias, para pagar os “penduras”.  Com uma remuneração de mais de quarenta mil reais por mês, juizes e promotores certamente não têm apertos financeiros e, se vendem parte das férias é por que não precisam de descanso.  Esta venda de parte das férias é outra afronta aos demais trabalhadores. Eu, quando em atividade, gozava os trinta dias e as folgas que por acaso tivesse conseguido.  (LGLM)

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Category: Blog

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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