Emenda não é propina nem modo sujo de fazer política. É instrumento democrático de distribuição do poder. O problema é sua perversão, como no orçamento secreto
Emenda parlamentar não é pagamento de propina. É dinheiro público destinado a finalidades públicas. A diferença da emenda parlamentar consiste apenas no fato de que, em vez de ser o Executivo a indicar sua destinação concreta, é o parlamentar quem o faz. É equivocado, portanto, tratar a priori a distribuição de emendas como um modo sujo de fazer política. Mais do que ingenuidade, essa visão denotaria desconhecimento sobre a própria política, que não se resume à discussão de ideias e propostas, mas envolve decisões sobre onde e como gastar o dinheiro público. Partilhar o poder é também dividir essas decisões.
Não há rigorosamente nenhum problema em que parte dos recursos públicos tenha sua destinação definida por parlamentares, e não pelo Executivo. Trata-se de configuração institucional própria dos regimes democráticos, nos quais não existe Poder absoluto. O Legislativo não apenas aprova a lei orçamentária, autorizando os gastos, como define a destinação concreta de parte dos recursos. Entre outros benefícios, essa sistemática permite a descentralização decisória e a proximidade com as necessidades e interesses da população. Por exemplo, muitas emendas parlamentares são dedicadas às Santas Casas de Misericórdia, à construção e reforma de escolas ou à iluminação e pavimentação pública.
O problema das emendas parlamentares está em sua perversão, como ocorre com o chamado orçamento secreto, criado no governo Bolsonaro. Não há transparência no procedimento relativo às emendas de relator (RP-9), no qual não se sabe qual parlamentar indicou o destino da verba. Assim, o eleitor fica impedido de fazer a indispensável responsabilização política de seus representantes no Congresso. A população tem o direito de saber sobre a atuação concreta de cada parlamentar, para premiá-lo ou para puni-lo nas urnas das eleições seguintes. Ao mesmo tempo, essa opacidade estimula o mau uso dos recursos, por ineficiência, atendimento de interesses escusos ou mesmo desvio de verbas.
A falta de transparência no uso de recursos públicos é causa de muitos problemas. Precisamente por isso, ela é incompatível com o Estado Democrático de Direito. No fim do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a inconstitucionalidade do orçamento secreto. A Corte não declarou que as emendas parlamentares são inconstitucionais. E sim que as emendas RP-9, em razão da ausência de identificação do proponente e da opacidade sobre seu destinatário, violam os princípios constitucionais da transparência, da impessoalidade, da moralidade e da publicidade. Infelizmente, apesar da orientação do STF, continua não havendo plena transparência na distribuição de várias emendas, o que merece a mais firme reprovação. Cumprimento de decisão judicial não é algo optativo, mas um dever.
Outro ponto que merece atenção diz respeito ao valor das emendas parlamentares. Não faria sentido, por exemplo, que boa parte dos recursos públicos tivesse sua destinação definida pelos deputados e senadores, e não pelo governo. O Executivo é o gestor, por excelência, do orçamento público. No entanto, nos últimos anos, em razão de vários fatores – entre eles, a falta de disposição do presidente Jair Bolsonaro em governar –, o Congresso ampliou consideravelmente os valores destinados às várias emendas parlamentares. Isso é um problema sério.
Há muitas correções a serem feitas nas emendas parlamentares. Mas, para tanto, o primeiro passo é compreender seu funcionamento e seus objetivos, sem criminalizá-las.
Comentário nosso
Realmente. O problema não é a emenda parlamentar em si. O problema é a maneira como é tratada esta emenda. Os parlamentares só as destinam aos seus currais eleitorais, num jogo de cartas marcadas em que uma parte da emenda volta para o parlamentar e a outra parte o prefeito aplica como bem entende. Por que as obras construídas pelas prefeituras sempre custam mais caro do que qualquer obra da construção civil? Por que o preço das obras municipais vai encobrir as propinas que foram pagas com o valor pretensamente gasto na obra. Por que as obras demoram a terminar? Por que enquanto estão sendo construídas, mais verbas lhe são destinadas através das emendas parlamentares e mais propinas são pagas a todas as partes envolvidas. Nós temos um caso gritante em Patos que é o chamado Teatro Municipal. Faz quase vinte anos que está sendo construído e dizem que ainda precisam de uns quinze milhões para terminá-lo. Por que tem deputado que nunca trabalhou e tem verdadeiras fortunas de patrimônio? Por que tem prefeito que nunca trabalhou e sai rico das prefeituras, embora escondam os bens adquiridos em nome de terceiros? O canal do Frango não tem nem três quilômetros de extensão e custou vinte e sete milhões de reais, enquanto na mesma época Ricardo Coutinho construiu oitenta quilômetros de estrada, passando por Quixaba, Cacimba de Areia, Passagem, Areia de Barraúnas, Salgadinho e Assunção e só gastou oitenta milhões de reais. Por que esta diferença gritante de preço? E a estrada de Ricardo está inteira e o canal de Frango caindo aos pedações? (LGLM)