O presidente da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro, deputado Arthur Maia (União-BA), foi um dos que não resistiram à tentação de se arvorar em editor de jornal, tentando controlar, ora vejam, o que o jornalismo pode ou não publicar. No dia 28 passado, Arthur Maia editou uma norma que vedava aos profissionais de imprensa credenciados para cobrir os trabalhos da CPMI a publicação de documentos classificados como “confidenciais” pelo colegiado. Quais seriam as consequências mundo afora se o jornalismo publicasse apenas o que o poder estatal autoriza publicar?
Não é papel do presidente da CPMI – nem de qualquer outra autoridade – definir que tipo de informação o jornalismo pode levar a conhecimento público. O Estado simplesmente não dispõe dessa atribuição. Ainda mais contraditório é o fato de que a norma restritiva para a imprensa foi editada por quem preside uma comissão parlamentar que investiga um ataque contra a Constituição que reconhece a liberdade de imprensa como garantia fundamental do Estado Democrático de Direito.
Além de evitar a publicação de documentos ditos “confidenciais”, a norma censora se prestava, nas palavras de seu idealizador, a “proteger o direito à intimidade e a vida privada” dos deputados e senadores membros da CPMI, haja vista que o conteúdo de algumas mensagens trocadas entre eles por celular veio a público por meio de veículos jornalísticos.
Aqui se vê como a pretensão de controlar a imprensa sempre se apresenta revestida de bons motivos. No caso em tela, como pretensa defensora do direito à privacidade dos parlamentares. Mas, apesar das vestes aparentemente civilizadas, a justificativa é inteiramente descabida. Não cabe controle prévio da imprensa. E, na hipótese de eventual equívoco por parte do jornalismo, há sempre a possibilidade de posterior responsabilização pelas vias judiciais. Como dissemos neste espaço, “um jornal não lava as mãos pelo que publica. Ele é responsável pelo conteúdo que sai em suas páginas, sejam impressas ou digitais” (ver editorial O limite da imprensa já está na Constituição, 20/8/2023).
A imprensa, livre e independente, incomoda. Não é por outra razão que jornalistas e veículos de imprensa figuram entre as primeiras vítimas dos déspotas e autoritários que ascendem ao poder. Por isso, no regime democrático, a liberdade de imprensa é ponto inegociável. Impor qualquer limite ao trabalho jornalístico além do que está estabelecido na Constituição é uma afronta ao Estado Democrático de Direito. Entre outros graves danos, deixaria a população refém do poder estatal.
A imprensa é “o cão de guarda da sociedade”, diz o conhecido aforismo. De fato, a constante vigilância exercida pelo jornalismo é proteção – algumas vezes, a única – da população perante o Estado, em suas diversas esferas.
Diante da repercussão negativa do caso – que veio justamente da denúncia feita pela imprensa –, o presidente da CPMI recuou do ato que impôs sanção aos jornalistas que divulgarem informações confidenciais vazadas por membros do colegiado. Manteve, no entanto, a decisão de proibir que profissionais da imprensa capturem “imagens de conteúdo privado de terceiros sem autorização”.
Todo esse episódio lembra a importância da defesa das liberdades. Mesmo num colegiado do Congresso cujo objetivo é investigar atos antidemocráticos, tenta-se restringir a liberdade de imprensa. Ou seja, o preço da liberdade continua sendo a eterna vigilância.
Comentário nosso
A tentativa do presidente da CPMI de blidar os parlamentares que participam da comissão é absolutamente indefensável. Pelo que se dá a entender, era justamente isto que queria o deputado Artur Maia. Impedir que a imprensa divulgasse fatos que poderiam indispor os parlamentares com seus colegas ou determinadas autoridades ou pessoas que estão sob julgamento. A única justificativa para um fato deixar de ser divulgado pela imprensa é quando a sua divulgação, pode prejudicar as investigações, prevenindo determinadas pessoas de que aquele fato pode vir a prejudicá-lo e facilitando que ele se previna escondendo provas ou tentando calar testemunhas. Isto a imprensa sempre entendeu quando acompanha qualquer processo. Determinadas informações, se divulgadas podem atrapalhar as investigações, beneficiando o infrator. Nunca se divulga o nome dos suspeitos dos crimes enquanto eles estão soltos e podem impedir ou atrapalhar as investigações. Ou mesmo quando estão presos, mas tem outros parceiros em liberdade e sua prisão pode alertá-los. A imprensa inclusive deve ficar em alerta quando recebe determinadas informações que visam com sua divulgação desviar a atenção da polícia ou da Justiça. Tem um advogado que tem ocupado espaços da imprensa nacional divulgando notícias que depois ele próprio desmente, numa tentativa de amedrontar outros envolvidos no crime, talvez para tirar vantagens disso. Quem vem acompanhando os acontecimentos da famosa “venda de jóias da União” sabe do que estamos falando. (LGLM)