Para Lula, a mudança faz sentido. Ele quer indicar pessoas de seu círculo pessoal para o STF – escolheu seu advogado, agora quer alguém com quem possa “trocar ideias” – e, naturalmente, prefere que a sociedade não saiba como votam essas pessoas.
No entanto, perante os valores constitucionais, a mudança proposta não faz nenhum sentido. “Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade”, diz o art. 93, IX da Constituição. Estes dois princípios interdependentes, a fundamentação e a publicidade, legitimam as decisões da Justiça.
Trata-se de um tema fundamental. O Judiciário é parte necessária do regime democrático. Sem Justiça independente, não há democracia. Mas a dimensão democrática do Judiciário não decorre da eleição de seus membros (eles não são escolhidos pelo voto popular), tampouco da concordância de suas decisões com a opinião pública em um determinado momento (os juízes não devem atuar buscando a aprovação popular). Ela provém da aplicação da Constituição e das leis, aprovadas pelos representantes eleitos pelo povo.
É precisamente este binômio – fundamentação e publicidade das decisões judiciais – que garante que os juízes aplicarão a Constituição e as leis, e não suas vontades, ideias e convicções políticas. O texto constitucional prevê hipóteses excepcionalíssimas de sigilo processual, com o objetivo de preservar bens individuais ou coletivos – não para proteger o magistrado.
A sugestão feita por Lula não envolve, portanto, mero detalhe burocrático. A publicidade e a fundamentação das decisões judiciais asseguram uma característica essencial da Justiça: os juízes servem à lei.
Lula tem razão quando – ao referir-se à razia de seus próprios correligionários contra o ministro recém-nomeado, Cristiano Zanin – diz que, “do jeito que vai, daqui a pouco um ministro da Suprema Corte não pode mais sair na rua, passear com sua família, porque tem um cara que não gostou da decisão dele”. Mas a solução não está em restringir a publicidade das decisões judiciais.
É intolerável toda e qualquer agressão contra ministros do Supremo. Além de ferir direitos individuais, a violência contra integrantes do STF constitui tentativa de interferir na independência do Judiciário. De toda forma, é sempre oportuno, especialmente nos tempos atuais, recordar a necessidade de que os juízes apliquem a lei, sem extrapolar suas funções e competências, sem promover ideias e convicções pessoais.
Num momento em que o STF é contestado – às vezes, com razão – por atuar politicamente, são ainda mais necessárias a fundamentação das decisões e a sua publicidade. Esses dois princípios constituem a garantia visível de que a ordem judicial não é fruto das idiossincrasias de um juiz ou de pressões coletivas, e sim decorrência da aplicação da lei, aprovada pelo Congresso.
As hostilidades a magistrados são de fato preocupantes e crescentes – e o modus operandi da militância petista tem a sua parcela de responsabilidade nisso. Mas, para preveni-las, o caminho é a aplicação das leis vigentes, que protegem a integridade física e moral das autoridades e de todos os cidadãos. Reduzir a publicidade do processo judicial no Supremo, como sugeriu Lula, só geraria mais perplexidade e mais indignação.
O caminho para a imprescindível pacificação social – com a qual o PT até agora não tem colaborado muito – é a aplicação da Constituição. Atalhos inconstitucionais, além de não enfrentarem as causas dos problemas atuais, criam outros ainda mais graves.
Comentário nosso
Será que Lula alguma vez se deu ao trabalho de ler a Constituição? E entendê-la? Mas isto não justifica as suas declarações. Ele tem inúmeros assessores, além da bem instruída esposa Janja, para aconselhá-lo quando precisar se pronunciar sobre algum assunto. Nada contra pessoas de pouco estudo no poder, desde que tenham bom senso, conhecimento da realidade que vão encarar e que se cerquem de assessores de confiança que o orientem e aconselhem. (LGLM)