O 8 de janeiro foi tentativa de golpe, as punições são exemplares e estão só começando (com comentário nosso)

By | 15/09/2023 7:39 am

As provas são abundantes, geradas pelos próprios réus e o julgamento não é individual, pois é um “crime de multidão”

(Coluna de Eliane Cantanhêde, no Estadão, em 14/09/2023)

Foto do autor: Eliane CantanhêdeA condenação dos primeiros réus pela tentativa de golpe em 8 de janeiro de 2023 apavora os 1.345 acusados como executores, gera pessimismo nos 232 casos considerados mais graves e praticamente sela o destino dos próximos três do, digamos, primeiro pelotão. Isso, porém, é só uma parte do julgamento, que vai chegar a financiadores, divulgadores, núcleo político – e o, ou os “mandantes” –, com um recado histórico, pela democracia e as instituições: golpe nunca mais!

Afora o efeito colateral de tirar do foco dos erros e recuos do presidente Lula, que parece bolinha de ping-pong, para lá e para cá, o julgamento no Supremo tem um caráter pedagógico, com punições “exemplares”, como definiu a PGR. A curiosidade é que, em vez de defenderem seus clientes, os advogados relevam o golpe e criticam a Justiça.

Mais uma vez, o relator Alexandre de Moraes está na linha de frente e o revisor Kássio Nunes Marques continua “terraplanista e negacionista”. O primeiro réu, Aécio Pereira, foi condenado por cinco crimes, mas o bolsonarista Kássio não viu golpe, abolição violenta do Estado Democrático de Direito nem associação criminosa, só deterioração de patrimônio e dano qualificado – logo, um distúrbio, um incidente ou, como ironizou Moraes, “um domingo no parque”. A pena foi de 17 anos, o revisor queria só dois anos e seis meses, em regime aberto, sem cadeia.

Moraes, porém, demoliu as teses pró-golpistas. As provas são abundantes, geradas pelos próprios réus. O julgamento não é individual, pois é um “crime de multidão”. O golpe previa Exército nas ruas e não deu certo porque, “apesar do envolvimento de militares”, as Forças Armadas não aderiram. E o principal: o 8/1 não foi isolado, mas parte, ou desfecho, de um golpe longamente planejado.

No mesmo dia das condenações no STF, o Exército passou novo vexame na CPMI do golpe, com o general Gustavo Henrique Dutra, fardado, caindo nas mais fuleiras contradições. Então comandante militar do Planalto, ele não sabia do “perfil golpista”, da participação de militares da reserva e de preparativos terroristas nos acampamentos em torno do QG — que viu como “manifestações pacíficas”. E por que tanques ali depois das invasões? “Para impedir a volta” dos golpistas, segundo o general. Bem, 1.200 deles voltaram…

Já na CPI do golpe no DF, o hacker Walter Delgatti disse que foi “cooptado” por Bolsonaro, que sabia e solicitou a invasão do sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para plantar mentiras, “criar o caos” e se manter no poder. O circo, ou o parque de domingo, está pegando fogo. E Lula já arruma as malas de novo.

Comentário nosso

Vimos e ouvimos comentários no sentido de que Alexandre de Moraes teria agido mais como promotor do que como Juiz. Isso indica deconhecimento do processo judicial. A acusação é feita pelo Ministério Público. Ao ministro relator cabe examinar o processo, examinar as provas produzidas durante o inquérito e durante a fase de oitiva de testenunhas, tanto no inquérito como no processo judicial. E dizer se concorda com o que foi levantado nestas fases e com a condenação sugerida pelo Ministério Público. É o que fez. Qualquer juiz faria a mesma coisa, se estivesse dando uma decisão monocrática. A manifestação de Alexandre de Moraes foi uma manifestação de juiz com a qual concordaram a maioria dos seus pares. Com relação ao fato de o julgamento está sendo feito pelo Supremo Tribunal Federal  e não nas instâncias primeiras, apenas uma observação. Já pensaram se estes julgamentos fossem feitos  nas primeiras intâncias, com juizes sujeitos às pressões e gritarias locais, quanto tempo durariam os julgamentos, quantas sentenças diferentes e disparatadas seriam prolatadas, quantos recursos seriam apresentados às diversas instâncias. Talvez morresse toda uma geração e não se chegaria ao final. E a lição preeventiva em defesa da Democracia ficaria diluída, sem ter a repercussão imediata que precisa ter. O julgamento no STF se justifica pela importância de defender o bem maior da democracia, que são os Três Poderes, atacados vilmente em 8 de janeiro. E porque o criminoso maior foi presidente da Republica, incentivador de toda aquela bagunça. Outro detalhe. No STF ainda apareceram duas divergências produzidas justamente por dois ministros nomeados por Bolsonaro. Numa difusão destes julgamentos pelo país, quantas divergências e quanta gritaria de partidários apaixonados por Bolsonaro não ocorreriam. E um detalhe que muita gente talvez não tenha percebido ainda. Por que Nunes Marques e André Mendonça concordaram com a condenação de três dos criminosos julgados, só não concordaram com a acusação de tentativa de golpe militar e de ataque ao Estado Democrático de Direito. Por que? Simplesmente por que esta tentativa de golpe e de ataque ao Estado Democrático de Direito tem por trás da sua concepção e do seu incentivo, justamente, o responsável pela nomeação dos dois para o Supremo Tribunal Federal, o ex-presidente Bolsonaro. Condenados todos os que são acusados desta tentativa de golpe militar e de ataque ao Estado Democrático de Direito, o caminho natural é a Justiça chegar a Bolsonaro. E o destino dele será o mesmo das centenas de criminosos que o STF vai condenar, no julgamento dos atos de 8 de janeiro. Quanto aos colegas advogados insatisfeitos com a atuação de Alexandre Moraes e do STF de modo geral, quem os conhecer que os analise. Que “camisa” vestiram nos últimos cinco anos? A de “patriotas” ou a de brasileiros comuns? Tenho certeza de que a maioria deles é bolsonarista “de nascença”. (LGLM)

 

Comentário

Category: Destaques

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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