No Senado, o maior dos receios diz respeito à governança do Conselho Federativo do IBS, imposto que substituirá o ICMS estadual e o ISS municipal. Alguns governadores ainda temem perder autonomia sobre aquela que é a maior fonte de recursos dos Estados, e manifestaram suas preocupações aos senadores. Nesse sentido, as conclusões do relatório do TCU podem acalmar todos.
O Conselho, segundo o tribunal, vai fortalecer a Federação, acabar com a guerra fiscal, mitigar as disfuncionalidades da tributação sobre consumo e contribuir para a redução das desigualdades regionais. Não há qualquer elemento a indicar ofensa ao pacto federativo. Ao contrário: cada Estado e cada município poderá fixar sua própria alíquota, mas terá de aplicá-la para todos os bens e serviços, exceto os expressamente beneficiados com o imposto reduzido.
De acordo com o TCU, o Conselho Federativo vai dar mais eficácia à atuação dos fiscais regionais, garantir o princípio da não cumulatividade, unificar normas, interpretações e procedimentos e assegurar a distribuição da arrecadação entre os entes. O órgão atuará como gestor do algoritmo de um sistema informatizado e processará a arrecadação, compensações e distribuição de receitas de forma automática e não invadirá competências dos fiscos estaduais e municipais.
O TCU também sugeriu aos senadores alguns aperfeiçoamentos ao Conselho Federativo, como o estabelecimento de um órgão de controle externo para fiscalizar suas atividades. Para o tribunal, o ideal seria que isso fosse realizado por um órgão colegiado dos tribunais de contas.
O conjunto de contribuições do TCU traz luz a um debate que, muitas vezes, é baseado menos na realidade e mais em mitos – mitos plantados por quem tem interesse em manter tudo como está, sobretudo as disfuncionalidades do sistema atual.
O manicômio tributário que vigora no País não foi construído de uma só vez. Ao longo dos anos, setores trabalharam para garantir regimes especiais, alíquotas reduzidas e isenções, conquistadas ora no Planalto, ora no Congresso. Benesses criadas para serem temporárias se perpetuaram ao longo do tempo. Distorções nunca corrigidas foram um incentivo para que outros segmentos também buscassem tratamento especial.
Quem sofre com essas práticas é a sociedade, que financia todas as benesses sem auferir maior crescimento econômico e menores desigualdades como contrapartida. Nesse sentido, é muito relevante que o TCU tenha firmado posição quanto à lista de setores e atividades que poderão vir a ser beneficiados com uma alíquota reduzida na reforma tributária.
A sugestão da Corte de Contas é que esses segmentos passem por uma avaliação anual, entre 2026 e 2033, para avaliar o custo e o benefício das bondades a que terão direito. Com base nessa análise, dez anos após a aprovação da reforma, em 2034, o Congresso deverá analisar a pertinência de mantê-las ou revogá-las.
O TCU, por exemplo, calculou em R$ 70 bilhões as perdas que União, Estados e municípios terão com a desoneração integral da cesta básica. Estimou ainda que apenas R$ 4,5 bilhões desses gastos beneficiariam os 10% mais pobres da população, enquanto os 10% mais ricos se apropriariam de R$ 13,4 bilhões. É o tipo de política dispendiosa, mas que gera resultados pífios no que diz respeito à redução da desigualdade.
O posicionamento da Corte de Contas é corajoso, sobretudo em uma discussão contaminada por achismos. É também um convite ao Senado para que cumpra suas funções e comece a revisar não apenas as medidas que geram renúncias de receitas injustificáveis, mas também aquelas que drenam gastos que poderiam ser mais bem direcionados. Como disse o TCU, não se trata de um “jogo de soma zero”. É, na verdade, o que explica o baixo desempenho de nossa economia.