Proposta foi apresentada em 2021 e foi colocada em debate durante momento sensível da relação STF e Legislativo; veja vídeo da sessão da CCJ
A Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira, 4, em votação que durou 40 segundos, uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que limita as decisões monocráticas (tomadas por um único ministro) do Supremo Tribunal Federal (STF) e o prazo para os pedidos de vista. O texto segue, agora, para o plenário da Casa.
A PEC nº 8/2021 foi proposta por um grupo de senadores encabeçado por Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e está sob relatoria de Esperidião Amin (PP-SC). O texto foi para uma vista coletiva no final de agosto e voltou para a pauta da CCJ nesta quarta.
Nenhum senador se inscreveu para argumentar contra ou a favor da proposta, e a votação no colegiado ocorreu de forma simbólica, ou seja, sem registro individual de votos. Em menos de um minuto, o presidente da comissão, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), declarou a aprovação do texto.
O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), é quem decide quando a proposta vai ser incluída em pauta para votação no plenário. Não há um prazo regimental para isso.
PEC quer que ministros não possam suspender leis por decisão monocrática
O texto da proposta diz que decisões monocráticas do STF não podem suspender “a eficácia de lei ou ato normativo” de abrangência nacional nem atos do presidente da República e dos presidentes do Senado, da Câmara e do Congresso.
Na prática, quando uma ação declaratória de inconstitucionalidade for para o Supremo, o ministro relator não pode suspender sozinho a eficácia da lei questionada, como hoje é previsto na lei.
Foi o que ocorreu, por exemplo, no caso do piso da enfermagem: Luís Roberto Barroso atendeu a um pedido da da Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde) e suspendeu liminarmente a lei do piso salarial da categoria. Se a PEC for aprovada, uma decisão como essa poderia ser tomada só com o voto de pelo menos seis ministros, maioria da Corte.
Em relação aos pedidos de vista, a PEC sugere que eles sejam sempre coletivos e tenham um prazo máximo de seis meses. Assim, quando um ministro interromper um julgamento para analisar o caso, os demais também poderão fazê-lo. Um segundo prazo poderá ser concedido coletivamente, limitado a três meses.
Hoje, os pedidos de vista são individuais, ou seja, cada ministro pode solicitar um tempo extra para análise. As decisões liminares dos ministros, depois da mudança de dezembro, precisam ser confirmadas pelos demais ministros da Corte em plenário virtual.
Decisões do STF incomodam Congresso
A decisão da CCJ da manhã desta quarta reforça o descontentamento do Senado com o Supremo. Pacheco nega a animosidade, mas defendeu que temas que “dividem a sociedade”, como drogas e aborto, sejam “decantados” pelo Legislativo, e não decididos pelo STF.
O marco temporal da demarcação das terras indígenas é um dos episódios que representa a rusga entre os dois Poderes. Aprovado por ampla maioria na Câmara em maio, o projeto foi para o Senado, sob a promessa de Pacheco de que o texto passaria por comissões e seria analisado sem regime de urgência.
No entanto, antes do trâmite acabar, o STF colocou o caso em pauta e julgou inconstitucional o marco temporal para demarcação das terras indígenas. O projeto de lei foi colocado na pauta do Senado e foi aprovado. Como mostrou a Coluna do Estadão, quando o texto for para a Presidência da República, Lula deve vetá-lo, mas já existem articulações no Congresso para derrubar um eventual veto.
Na segunda-feira, 2, Pacheco disse que depois que Lula indicar o substituto da ministra Rosa Weber a discussão sobre criar um mandato para ministros do Supremo deve ser pautada no Senado. A ideia foi criticada pelo ministro do STF Gilmar Mendes, que disse que o “esforço retórico” dos senadores é “comovente”. Senadores rebateram o magistrado, afirmando que o mandato de ministro faria eles se sentirem “seres humanos normais”.
Estão pendentes de julgamento no STF dois casos que também causam incômodo ao Legislativo: a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal e do aborto até 12 semanas de gestação. As duas votações começaram e foram interrompidas por pedidos de vista.
Comentário nosso
Parlamentares querem afrontar o STF com projetos desta natureza. A não ser que tenha havido alguma modificação de que não tenhamos conhecimento, o Código de Processo Civil já prevê um remédio que pode ser utilizada pelos incomodados com uma decisão monocrática. Trata-se do agravo interno.”O Agravo Interno é uma espécie recursal que visa impugnar as decisões monocráticas proferidas pelo relator em Tribunal. Estabelecido no art. 1021 do Código de Processo Civil, o objetivo principal desse recurso é levar a decisão ao conhecimento do órgão colegiado competente para que este se manifeste a favor ou contra.” A existência da decisão monocrática visa agilizar o processo, já que uma decisão pelo relator da matéria pode acontecer muito mais rapidamente do que uma decisão de plenário. A função de julgar, a não ser nos casos de julgamentos políticos, é do Poder Judiciário. Qualquer tentativa de usurpar este poder por parte do Legislativo é uma afronta à Constituição, para cuja defesa o Judiciário é a última barreira. Decisão do Congresso não é definitiva desde que afronte a Constituição. Já a coisa julgada é, por definição, definitiva. (LGLM)