O Brasil real, com seus problemas reais

By | 14/10/2023 5:13 am

A grande maioria da população brasileira é pobre, enfrentando diariamente problemas muito diferentes daqueles vividos por quem está no poder. A política é cuidar de quem mais precisa

 

Imagem ex-librisDias atrás, o Estadão trouxe um dado que não é a rigor uma novidade, mas é sempre inquietante – e deve fazer pensar. De acordo com o Critério Brasil, da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep), três quartos da população – mais exatamente, 76,2% – são de classe C e D: 28,7% classe D, 26,4% classe C2 e 21,1% classe C1. Ou seja, a grande maioria da população do País é pobre.

Entre outros pontos, esse dado mostra que o Estado tem um papel importante a cumprir. Dito de outra forma, a política não tem o direito de ser disfuncional. Não pode ficar tratando de questões imaginárias, de falsas polêmicas, de meros embates ideológicos. Há problemas reais sérios que precisam ser enfrentados.

O Brasil não é propriamente um país pobre. Tem muitas riquezas, produz muitas coisas, apresenta muitas potencialidades. Mas, mesmo não sendo pobre, tem – eis a realidade – uma população majoritariamente pobre, com várias e sérias vulnerabilidades, a começar pela própria questão alimentar e educativa das novas gerações.

Essa realidade socioeconômica do País deve levar a um profundo realismo na vida pública. Especialmente porque as pessoas que exercem o poder, seja em que esfera for, raramente pertencem às faixas mais pobres da população. É fácil, portanto, que os problemas reais que afetam a imensa maioria dos brasileiros sejam ignorados ou relegados.

Caso nítido dessa desconexão entre quem detém o poder e a realidade social é o contínuo reconhecimento pelo Judiciário de novos direitos e novas equiparações – novas regalias – às elites do funcionalismo público, em especial às carreiras jurídicas públicas. Exemplo chocante ocorreu entre 2014 e 2018, quando, num período de grave crise social e econômica no País, uma decisão liminar concedeu auxílio-moradia a todos os juízes e membros do Ministério Público.

A política deve cuidar de todos, atender todos. Mas deve, sobretudo, cuidar, atender e zelar pelos que mais necessitam. Infelizmente, não é o que ocorre muitas vezes, revelando, entre outros problemas, uma grave deficiência de representatividade. Há um regime democrático – todo o poder emana do povo –, a maioria da população é pobre, mas o poder parece servir a outros interesses, a um outro público.

Não são questões teóricas. Agora, por exemplo, o Congresso discute a reforma tributária. Todos os dias há notícias de grupos de interesse tentando alguma regalia, algum regime diferenciado, algum tratamento privilegiado. É patente a existência de um esforço para desvirtuar a reforma, fazendo com que as regras tributárias sejam indutoras de desigualdade – o que representa um desvirtuamento do próprio Estado.

A funcionalidade da política é um assunto muito sério. Não cabe ignorar os problemas reais da imensa maioria da população. Tome-se o exemplo da questão do saneamento básico: depois de uma batalha política de anos, o Congresso aprovou o marco do saneamento básico (Lei 14.026/2020), como medida para reverter uma situação absolutamente lamentável e desumana, e, no entanto, há ainda hoje gente com poder tentando impedir a implementação do novo regime, com o objetivo de defender os interesses de empresas estatais ineficientes, que não atendem minimamente às necessidades básicas da população, como água encanada e esgoto tratado.

Não basta um partido ou grupo político dizer que defende os pobres ou declarar-se progressista se, depois, sua atuação prática é em defesa de interesses corporativos ou de determinados grupos mobilizados politicamente. Fenômeno frequente no País, essa incoerência é certamente uma das causas para que o exercício do poder no regime democrático seja tão indiferente às necessidades reais da população.

A política é cuidar de quem mais precisa. Isso é democracia, compromisso com o interesse público. E esse deve ser o grande critério de avaliação da atuação do Estado, de suas políticas públicas e das reformas legislativas. Essas medidas estão efetivamente melhorando a vida das pessoas mais pobres, que são no Brasil a grande maioria?

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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