Eleição não é vale-tudo

By | 02/11/2023 6:48 am
Imagem ex-librisNa terça-feira, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) proferiu uma importante lição ao País. Aplicando a Constituição de 1988 e a legislação eleitoral, a Corte condenou Jair Bolsonaro e Walter Braga Netto por abuso de poder político e econômico na campanha presidencial de 2022, em razão do uso eleitoreiro das comemorações oficiais do Bicentenário da Independência no Rio de Janeiro e em Brasília. Na ocasião, Bolsonaro, na condição de presidente, e Braga Netto, na de vice, eram candidatos à reeleição.

Como resultado do julgamento, o TSE declarou a inelegibilidade dos dois candidatos por oito anos, contados a partir das eleições de 2022. Também foi reconhecida a prática de conduta vedada a agente público, com a aplicação de multa no valor de R$ 425 mil a Bolsonaro e de R$ 212 mil a Braga Netto.

Jair Bolsonaro já estava inelegível pelo mesmo período em razão da condenação proferida pelo TSE no processo relativo a uma reunião com embaixadores estrangeiros, em julho de 2022, na qual o então presidente da República atacou e difamou o sistema eleitoral brasileiro. Como as penas não se somam, a nova condenação não altera o prazo de inelegibilidade.

De toda forma, o julgamento sobre o uso eleitoreiro do 7 de Setembro transmite uma mensagem importante para todo o sistema político-partidário. As eleições não são um vale-tudo. Quem está em cargo público concorrendo à reeleição não pode se valer do posto para promover sua campanha eleitoral.

A decisão do TSE condenando Bolsonaro e Braga Netto não se baseia em criatividade interpretativa. É estrita aplicação da Constituição de 1988. Depois de definir que a soberania popular é “exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos”, o legislador constituinte dispôs, no art. 14, § 9.º, que a legislação eleitoral deve estabelecer as hipóteses de inelegibilidade de modo a proteger, entre outros fins, a “legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.

Não houve, portanto, nenhum ativismo judicial. O TSE simplesmente aplicou a Lei Complementar (LC) 64/1990, que regulamenta o art. 14 da Constituição. No processo, eram abundantes as provas indicando a ocorrência de desvio eleitoreiro de finalidade das festividades de 7 de Setembro, com o uso das prerrogativas do cargo e de bens, serviços e recursos públicos para promover a reeleição. Por exemplo, no ato em Brasília, Jair Bolsonaro pediu voto em seu discurso. E um dos coordenadores da campanha, Fábio Wajngarten, na época sem cargo no governo, foi quem orientou a chegada do então presidente, explicitando a ilegal utilização do ato oficial para fins eleitorais.

Com a decisão, o TSE afirma que a lei vale para todos, também para o presidente da República. Além de reiterar o princípio da igualdade de todos perante a lei, a condenação de Bolsonaro e de Braga Netto é uma orientação importante para as futuras disputas eleitorais. Não se pode fazer o que bem entender para se reeleger. O cargo público não está a serviço da campanha eleitoral de quem detém, naquele momento, a máquina pública. É um recado moralizador para todos, que vale para o bolsonarismo e para o lulopetismo – useiro e vezeiro da prática.

A decisão do TSE tem ainda um outro aspecto relevante. No processo relativo à reunião dos embaixadores, o então candidato do PL à Vice-Presidência da República tinha sido absolvido, por ausência de provas quanto ao seu envolvimento nos ataques às urnas eletrônicas. Agora, Braga Netto foi declarado inelegível e recebeu pena de multa, uma vez que participou dos atos de 7 de Setembro no Rio de Janeiro e em Brasília.

O TSE fez bem em incluir o candidato a vice-presidente na condenação. Afinal, Braga Netto é responsável por suas ações. Não deveria ter assentido a tão descarado abuso de poder político. Além disso, punindo os dois, evita-se a impunidade. Não há motivo para tolerância. Campanha abusiva deve gerar inelegibilidade de todos os integrantes da chapa.

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Category: Nacionais

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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