Felizmente, a sabotagem de Bolsonaro não foi suficiente para impedir a aprovação da reforma por 53 votos a 24, nos dois turnos de votação. Foram mais que os 49 necessários, mas uma margem pequena para um modelo adotado por 174 países no mundo e que dará fim ao manicômio tributário em que vivemos hoje.
Bolsonaro não conseguiu convencer seu próprio partido a fechar questão contra o texto – dos 12 senadores do PL, 10 votaram contra o texto, 1 a favor e 1 se ausentou. Mas sua liderança tóxica se fez sentir no posicionamento de senadores de outras siglas da oposição, como o PP e o Republicanos, virou o voto de parlamentares que haviam se manifestado a favor do texto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e fez o governo ceder em novas concessões e suar frio no plenário, como mostrou o Estadão.
Que fique claro, não haveria problema no voto contrário à reforma, desde que os senadores tivessem explicado as razões de sua discordância. Durante o debate, economistas e tributaristas manifestaram críticas públicas ao texto. Setores econômicos descontentes com os eventuais impactos da proposta sobre seus negócios trabalharam com afinco para que suas sugestões de mudança fossem acatadas pelo relator, senador Eduardo Braga (MDB-AM).
Havia, também, muito debate sobre a alíquota final que resultará da união de cinco tributos em um Imposto sobre Valor Agregado (IVA), embora a premissa da reforma seja a neutralidade, ou seja, manter a carga tributária atual. Essa preocupação, inclusive, não é de todo despropositada, pois cada privilégio conquistado deverá majorar a alíquota padrão. Governos petistas, ademais, sempre demonstraram muito apetite para aumentar impostos e nenhuma vontade de cortar despesas.
Líder da oposição na Casa, o senador Rogério Marinho (PL-RN) até mencionou alguns desses aspectos. Mas, como bem disse o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), que apoiou a proposta, “se nós, que somos liberais, não votarmos a favor, vamos defender o quê?”.
Eis a reflexão que toda a oposição deveria ter feito. O ex-presidente Jair Bolsonaro nunca foi um liberal. Para ficar em um único exemplo, na votação da reforma da Previdência, no primeiro ano de seu governo, não trabalhou por sua aprovação, optando por se afastar de qualquer temática que pudesse gerar algum desgaste à sua figura – e, pior, incentivou, nos bastidores, que as forças de segurança se articulassem para desidratar o texto.
Se havia problemas no texto da reforma tributária, e há aos borbotões, os senadores poderiam ter sugerido mudanças. Registre-se que muitos senadores o fizeram e tiveram numerosas emendas acatadas, mas nem assim votaram a favor do texto – muito provavelmente influenciados por mensagens de Bolsonaro e pelo custo eleitoral de ignorá-lo.
Este tipo de oposição perniciosa, com toda a certeza, não serve ao País. O sucesso parcial dessa empreitada bolsonarista, no entanto, não teria funcionado se não fosse a claudicante articulação política do governo no Senado. De forma arrogante, o Executivo deixou o debate correr solto por meses e só se mobilizou para impedir a derrota quando o texto estava prestes a ser votado.
O placar apertado não foi o primeiro recado enviado pelo Senado e não será o último. Enquanto o governo não reconhecer a existência desse problema e enfrentá-lo, o ex-presidente aproveitará essas brechas para tentar reaglutinar forças, ainda que isso signifique posicionar-se contra uma reforma tão necessária quanto a tributária. O País merece uma oposição mais qualificada.
Comentário nosso
Não há nenhuma novidade em termos uma oposição irracional. Afinal nossos parlamentares só pensam em seus próprios interesses. Votar contra os interesses da população para eles é normal, desde que seus próprios interesses sejam preservados. Ou seja, eles sempre serão contrários a tudo que os contrarie financeira ou eleitoralmente. Bolsonaro é o espelho da irracionalidade de nossos parlamentares. Nada de novo nisso. E é capaz de tudo, como tem sido até hoje. (LGLM)