Exceto pela reforma tributária, que ainda vai demorar a virar realidade pelo tempo necessário à sua regulamentação e implementação, ou pela preocupação fiscal hoje restrita à equipe econômica do ministro Fernando Haddad, pouco ou nenhum foco está direcionado a reverter a baixa eficiência econômica da indústria. Nada sugere que gargalos competitivos possam vir a ser desfeitos com a nova política industrial nem com outros programas que o governo Lula tenha apresentado até aqui.
A desidratação da indústria é evidente; e uma reindustrialização, necessária. O setor tem enfrentado dificuldades de crescimento, com uma participação cada vez menor no PIB, além de um longo período de perda de competitividade. Fora essa constatação dupla, tanto o diagnóstico quanto as soluções apresentadas pelo governo são duvidosos.
Diferentes fatores resultaram em mudanças significativas da indústria em todo o mundo, o que levou a uma tendência de novas abordagens de política industrial. Conforme um estudo que é referência no assunto, The new economics of industrial policy (A nova economia da política industrial), de Réka Juhász, Nathan Lane e Dani Rodrik, respectivamente professores das Universidades de Columbia, Oxford e Harvard, houve uma retomada de políticas industriais pelos países, sobretudo a partir de 2017 e mais ainda no contexto da pandemia de covid-19. Um efeito direto das agendas de descarbonização, das mudanças da globalização e de alterações nas cadeias produtivas, e na esteira de eventos disruptivos como a pandemia e o conflito Rússia-Ucrânia.
Os artífices do plano brasileiro, no entanto, ignoram que os males de nossa indústria vêm de muito antes. A desindustrialização é mais antiga e precoce do que a dos países ricos mencionados como exemplo de políticas industriais recentes: tem ocorrido no Brasil desde meados dos anos 1990, num processo que foi se agravando já nos governos petistas anteriores. Entre 1995 e 2022, a produtividade da indústria de transformação caiu quase 1% ao ano no País, segundo a Fundação Getulio Vargas. O sistema tributário complexo, oneroso e cumulativo, a infraestrutura deficiente, o financiamento escasso e caro, a baixa qualidade da educação e a insegurança jurídica são alguns dos fatores habitualmente citados para explicar a desindustrialização. Essa é a microeconomia.
Há uma máxima entre economistas ortodoxos que informa: crescimento econômico decorre mesmo é da microeconomia; à macroeconomia convém “apenas” não atrapalhar. Fatores estruturais microeconômicos que desidrataram nossa indústria estão associados, entre outras coisas, ao ambiente de negócios ruim e à dificuldade do Brasil de lidar com ajustes quando são necessários. É notória a incapacidade de avaliar políticas e desfazer o que deu errado. No Brasil, tudo se transforma imediatamente em direito adquirido, assegurado pela generosa mão estatal.
Diferentemente dos exemplos dos norte-americano, europeus e asiáticos, o Brasil tem escassez de capital humano e físico. Em geral, setores a desenvolver dependem de fatores de produção escassos, encarecendo enormemente a política. Além disso, ao Estado brasileiro falta a chamada “autonomia embutida” – conceito do sociólogo americano Peter Evans que diz respeito à capacidade do Estado de estar próximo ao setor privado e entender seus diagnósticos para destravar obstáculos sem ser capturado por interesses particulares. São atributos e condições essenciais para uma política industrial que seja efetivamente nova e boa. Sem isso, é um elogio à ineficiência econômica