Falha do Exército em verificar quem pode ter arma mostra que controle deve mudar
(Opinião da Folha, em 10/03/2024)
Condenados por tráfico de drogas e homicídio e procurados pela polícia com mandados de prisão em aberto —essas são algumas das pessoas agraciadas pelo Exército brasileiro com acesso a armamentos na condição de Caçadores, Atiradores e Colecionadores (CACs).
Os dados constam de relatório sob sigilo do Tribunal de Contas da União, obtido pelo jornal O Estado de S. Paulo e confirmado pela Folha. Escancaram-se aí a falta de cruzamento de informações e a inépcia militar em fazer cumprir a legislação, o que pode gerar sérios riscos à segurança pública.
Pelo Estatuto do Desarmamento, de 2003, o interessado em obter armas como CAC deve apresentar certidões negativas de antecedentes criminais e atestar não responder a inquérito policial ou processo criminal, além de comprovar ocupação lícita, residência e ligação a entidade de tiro ou caça.
Mais de 5.000 pessoas cumprindo pena tiveram acesso ao registro, 2.690 passaram pelo crivo da Força mesmo possuindo mandados de prisão em aberto e 21.442 armas de fogo estão com status regular mesmo pertencendo a pessoas que morreram no período.
Em 2022, por exemplo, aprovou-se o registro como CAC de um membro da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), o que resultou em autorização para a compra de um fuzil. O Exército afirmou que se baseou na autodeclaração de idoneidade e na certidão criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
O caráter autodeclaratório dos pedidos e a incapacidade de cruzar informações dos bancos de dados públicos expõem os gargalos do processo. Urge concluir a transferência da responsabilidade por CACs, clubes de tiros e lojas de armas do Exército para a Polícia Federal, marcada para janeiro de 2025.
Também cabe ao Congresso Nacional rever falhas estruturais na lei, a fim de fortalecer os mecanismos de controle e de inteligência. Já o governo federal deve escrutinar os erros apontados pelo TCU.