Luiz Gonzaga Lima de Morais, jornalista e advogado, publicado no Notícias da Manhã, da Espinharas FM, em 26/03/2024)
Um vereador do pequeno município de Assunção, no Cariri paraibano, ganhou as manchetes esta semana nas redes sociais ao afirmar que “concurso público é um câncer” e que “os servidores concursados… …demonstram uma postura menos comprometida com o trabalho em comparação com os funcionários contratados”. O ilustre edil “viu o galo cantar, mas não sabe onde”. Não é o concurso público em si que se constitui o “câncer” do serviço público. Na realidade o concurso público é uma tentativa de impedir que os administradores usem a simples politicagem para encher as suas prefeituras de “puxa-sacos”. Se nossas prefeituras estivessem mais cheias ainda de contratados, teríamos de um lado os que trabalhavam por que não tinham um padrinho mais forte e os apadrinhados que continuariam a não fazer nada. É essa a realidade dos contratados que o vereador finge não ver.
O problema do concurso público é a estabilidade que acarreta. O fato de o servidor efetivo não poder ser dispensado por simples picuinha política, deveria servir de garantia para que ele exercesse bem as funções para as quais foi admitido. Mas. ao invés de servir de garantia, a estabilidade está servindo em muitos casos para acomodar os servidores efetivos. Na certeza de que não serão dispensados muitos simplesmente não querem fazer nada, ou só querem fazer o que lhes interessa. Fui servidor público por vinte e cinco anos e conheci isso de muito perto.
O concurso público deve continuar a ser exigido para todos os servidores, mas determinadas categorias de servidores não deveriam ter estabilidade. Ou seja, deveriam ser iguais aos trabalhadores de empresas privadas. Seriam admitidos por concurso público, mas poderiam ser demitidos se não cumprissem as funções para os quais foram admitidos. Seria como no Banco do Brasil, Banco do Nordeste, Caixa, Econômica, Petrobrás e outras empresas públicas ou de economia mista. Fazem concurso, mas se não servirem bem, podem ser dispensados.
Só deveriam ter estabilidade os concursados para aquelas funções nas quais a estabilidade é uma garantia para o fiel desempenho de suas funções, como juízes, promotores, auditores fiscais, diplomatas e outras funções qualificadas. Nas funções administrativas e outras para as quais a estabilidade não fosse imprescindível, seriam enquadrados como celetistas, podendo ser dispensados quando não estivessem exercendo fielmente as suas funções. Seria o caso de médicos, dentistas, enfermeiros, professores, vigilantes e assim por diante. Numa prefeitura, por exemplo, só teriam estabilidade os agentes de trânsito, os auditores, os fiscais, os policiais e outros cargos que precisassem ser blindados para poderem exercê-los de forma independente.
O Governo Federal já deu o exemplo com a EBSERH, empresa pública que administra os hospitais universitários. Os servidores são admitidos por concurso, mas são celetistas, podendo ser dispensados, se não cumprirem as suas funções com exatidão. O Governo da Paraíba já criou a Fundação de Saúde que fornece servidores para vários hospitais do Estado. Os servidores são admitidos por concurso, mas são celetistas. A mesma coisa vários Estados estão fazendo na área de Saúde e na área de Educação, onde os auxiliares de serviço são contratados através de empresa e só os professores se submetem a concurso.
Ou seja, o vereador de Assunção só tem razão numa parte. Há um câncer no serviço público no caso dos concursados, mas não é o concurso, é a estabilidade que se tornou fonte de abusos.
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