Analfabetismo assombra o Nordeste (confira comentário nosso)

By | 22/05/2024 6:56 am
Imagem ex-librisUm dos retratos mais exemplares e perversos do atraso brasileiro, o analfabetismo é daqueles temas que inspiram análises adversativas, em que uma boa notícia é invariavelmente sucedida por um porém. É esse o caso dos dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na semana passada, com base no Censo 2022: naquele ano, 93% dos 163 milhões de brasileiros com 15 anos ou mais estavam alfabetizados – uma taxa de analfabetismo, portanto, de 7%. Algo positivo se comparado ao índice de 2010 (10%) e notável quando se sabe que, em 1940, quando iniciada a série histórica, chegava a inacreditáveis 56%.

Há um porém nos números apresentados. Vem do Nordeste mais da metade dos 11,4 milhões de analfabetos do Brasil, uma região cuja taxa é simplesmente o dobro da média nacional. Ou seja, mais de 14% da população do Nordeste não sabe ler e escrever uma carta simples. Se é verdade que a curva dos números é descendente (19,1% em 2010; 14,2% em 2022), também é verdade que há uma insistente desigualdade no Brasil, assim como uma inconcebível lentidão na redução do analfabetismo entre nordestinos e pessoas mais velhas.

Chega a ser espantoso que, no Brasil, haja 50 municípios com índices de analfabetismo iguais ou superiores a 30%, dos quais 48 – isso mesmo: 48! – estejam no Nordeste. E o mais surpreendente: trata-se da mesma região que se notabilizou por ilhas de excelência na escola pública, atestada por sucessivos testes de avaliação de âmbito nacional e internacional.

São notórios os bons exemplos e resultados educacionais de municípios do Piauí e de Alagoas, e de Estados como Ceará e Pernambuco – além de Sobral, cidade cearense do ministro da Educação, Camilo Santana. Diferentemente do que sugere o senso comum, a educação básica pública brasileira não é exatamente uma terra arrasada. Há experiências bem-sucedidas em alguns sistemas educacionais, entre Estados e municípios País afora, marcados por ensino de qualidade, boa gestão, capacidade de formação de professores e diretores de escolas e, sobretudo, continuidade das boas políticas – condição essencial para resultados positivos de longo prazo.

De novo, porém, estamos diante de uma análise adversativa: todos os Estados nordestinos tiveram melhora significativa, muitos deles em nível mais acelerado do que outras unidades da Federação – é natural ter avanço em ritmo menor quando a curva já se encontra em patamar melhor. Nenhum desses Estados, contudo, superou a marca de 87% na taxa de alfabetizados. Tal disparidade certamente não começou ontem, e sim é fruto de um histórico de atraso e de intermitência de garantia de recursos para a educação, sobretudo a educação básica e gratuita. (Recursos só foram assegurados à educação a partir da Constituição de 1988 e, mais adiante, com a Lei de Diretrizes e Bases, de 1996.) É também um sinal de que programas voltados para a alfabetização de jovens e adultos não tiveram bons resultados em diferentes governos. Em português ainda mais claro: programas do gênero foram varridos para debaixo do tapete ao longo da história brasileira.

O fato é que sucessivos governos fecharam a torneira do analfabetismo focando na universalização do ensino dos mais jovens. Era um imperativo, mas insuficiente. A alfabetização de adultos pouco avançou no País – tanto que o índice nacional é menor entre a população de 15 a 19 anos (1,5%) e maior entre pessoas acima de 65 anos (20,3%). As faixas etárias mais altas, em síntese, não tiveram acesso à expansão educacional que aconteceu no Brasil a partir do início da década de 1990. As consequências são conhecidas, isto é, pessoas que se inserem no mercado de trabalho em profissões que exigem baixa qualidade. Com isso, a elas não é garantida a expectativa do chamado “bônus educacional” na renda ao eventualmente voltarem para a escola. No caso nordestino, não seria exagero dizer que, na prática, a redução do analfabetismo é favorecida na medida em que as pessoas analfabetas com mais idade vão morrendo.

É um dado sombrio de um país que prometeu erradicar o analfabetismo até este ano.

Comentário nosso

A situação do analfabetismo no Nordeste é dolorosa. Vem de muito longe, mas se permanece é por um círculo vicioso. Eleitor que sabe ler é, pela lógica um eleitor mais esclarecido, embora isto nem sempre aconteça. Então aos políticos da pior espécie é interessante ter eleitores  analfabetos para eles próprios se perpetuarem no poder. Mas ao mesmo tempo, em municípios e Estados de eleitores mais esclarecidos no próprio Nordeste, onde melhores governantes têm sido eleitos, foram criadas “ilhas de excelência” em termos de combate ao analfabetismo. É um caso de círculo virtuoso. Eleitor mais esclaarecido, elege políticos melhores, que roubam menos e produzem melhores programas de educação e principalmente de combate ao analfabetismo. O problema, portanto, não é falta de dinheiro é falta de vergonha na cara de quem deixa de investir em educação para “meter o dinheiro no bolso”. (LGLM)

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Category: Destaques

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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