Chega a ser um truísmo dizer que o ambiente digital é um instrumento poderoso para aprofundar a educação. O ensino será tanto melhor quanto conseguir incorporar novas e ricas soluções de aprendizagem, como a realidade virtual, a inteligência artificial, simulações 3D e interatividades, acréscimos relevantes à prerrogativa inquestionável do professor em sala de aula. O crescimento da educação a distância é parte dessa convicção, e não à toa algumas das melhores universidades do mundo, como Harvard, Oxford, Cambridge e MIT, adotam atividades online com excelência. Dito isto, convém distinguir o que é a adoção de tendências do mundo digital e o que é uma modalidade no ensino que cresceu de forma questionável no Brasil.
Há algo de perturbador na expansão de graduações não presenciais no País, que beirou os 700% em dez anos. Seu ritmo de crescimento se tornou especialmente veloz a partir de 2018, resultado de um decreto ainda do governo de Michel Temer. De início havia boa intenção, uma vez que a modalidade é vista como uma opção para alunos mais vulnerabilizados. Mas o que deveria ser exceção e complementar converteu-se em regra e, ao longo desses últimos anos, diversas avaliações nacionais demonstraram as disparidades de qualidade entre cursos EAD e presenciais. Nesse caso, o diabo mora num detalhe: a incompatibilidade entre a natureza da docência e uma formação 100% a distância.
A profissão docente é essencialmente prática e, como tal, um curso de formação de professores deve se articular em três tipos de conhecimento: sobre os alunos e como se desenvolvem em diferentes contextos, sobre o que deve ser ensinado e sobre como ensinar. Cursos centrados em aulas expositivas, como o são inevitavelmente nas modalidades a distância, na melhor das hipóteses podem comunicar o conteúdo a ser ensinado, mas não desenvolvem o elemento central: o ato de ensinar. Não por outra razão, a formação de professores precisa se dar em articulação com as escolas, tendo as vivências práticas como parte essencial.
É essa a premissa que acertadamente o ministro Camilo Santana e sua equipe reafirmam agora. A medida lhes impõe um desafio: garantir apoio às instituições de ensino superior na reformulação de seus cursos, fortalecer programas como o de bolsas à iniciação à docência e de residência pedagógica e por fim, mas não menos importante, aperfeiçoar mecanismos de regulação e avaliação. Tarefas imprescindíveis para dar sentido a uma melhor formação docente e assegurar uma mais racional conjugação entre ensino presencial e a distância.
Comentário nosso
Os cursos à distância têm sido um grande avanço por permitir a muita gente que reside em cidades onde não há cursos superiores ou que não tem tempo disponível para frequentar uma faculdade. Mas alguns deles não podem prescindir da parte presencial que permite aprender na prática o que no curso à distância aprendeu na teoria. Eu fui professor numa época em que nós não tínhamos faculdades que nos formassem e aprendir muito com a prática, mas me ressenti sempre da teoria, principalmente na parte didática. Hoje acontecia o contrário. Muita gente recebia toda a teoria, mas não havia uma exigência do conteúdo prático, o que o MEC está regulamentando agora para os cursos à distância para a formação de professores. Providência oportuna esta do Ministério de Educação. E que não deve se restringir apenas aos cursos para professores. Quase nenhum curso tem condições de preparar um profissional se não houver a parte presencial que lhe proporcionará a prática. (LGLM)