Segundo publicou o Estadão, uma das ideias que o ministro deve apresentar a Lula é a mudança no reajuste dos benefícios previdenciários vinculados ao salário mínimo e dos pisos de Saúde e Educação. Ambos sobem à revelia do arcabouço fiscal, e a proposta é submetê-los ao alcance da âncora, que limita o aumento das despesas a 70% do avanço das receitas.
Hoje, os benefícios pagos pela Previdência Social, como aposentadorias, pensões e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos vulneráveis e pessoas com deficiência, têm como piso o salário mínimo, que sobe conforme a inflação do ano anterior, e o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes. Já os gastos com Educação correspondem a 18% da Receita Líquida de Impostos (RLI); e os com Saúde equivalem a 15% da Receita Corrente Líquida (RCL).
Essa discussão não vem de hoje, mas voltou à baila na semana passada, quando o mercado reagiu mal a um encontro fechado entre Haddad e representantes de instituições financeiras. Nessa reunião, o ministro teria dito que um crescimento adicional das despesas obrigatórias levaria o governo a ter de contingenciar gastos discricionários – como estabelece o arcabouço fiscal.
Até aí, nada novo. Para os investidores, no entanto, prevaleceu a impressão de que o arcabouço fiscal teria de ser alterado, uma vez que Haddad não se comprometeu de maneira explícita com o cumprimento do limite de despesas e admitiu que o contingenciamento era uma decisão política que dependia do aval de Lula.
Haddad atribuiu esse entendimento a interpretações indevidas de sua fala, mas, até que essa informação fosse negada, houve muito ruído no mercado. A Bolsa caiu, os juros futuros dispararam, o dólar subiu e atingiu a maior cotação em 17 meses. No ano, a moeda norte-americana acumula alta de mais de 10%, muito em razão das dúvidas sobre a trajetória das taxas de juros nos Estados Unidos, mas também por problemas internos da economia brasileira, notadamente as incertezas fiscais.
Haddad, segundo apurou o Estadão, espera que essa conjuntura desfavorável sirva de algo e o ajude a convencer o presidente sobre a urgência de um ajuste fiscal. O problema é que na outra ponta estão o ministro da Casa Civil, Rui Costa, e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), opositores ferrenhos de qualquer medida de contenção de despesas – sejam temporárias, como contingenciamentos, sejam estruturais, como desindexações e reformas.
Para que essa discussão seja profícua, é preciso partir de algumas premissas comuns, que devem ser reconhecidas por todos que desejam participar do debate. Uma delas é a própria existência do déficit previdenciário, negado por ninguém menos que o ministro responsável pela área, Carlos Lupi.
Outra é que não é factível repassar aos benefícios previdenciários os ganhos de produtividade da economia. A eles deve ser garantida a reposição da inflação – como, aliás, a ministra Simone Tebet defendeu em entrevista a este jornal e acabou desautorizada por Haddad.
Quanto à Saúde e à Educação, o ideal seria que as áreas recebessem valor suficiente para cobrir suas despesas, sejam elas quais forem, e não um porcentual das receitas. Atacar as vinculações, aliás, é algo que já deveria ter sido feito no ano passado, dado que elas voltaram a valer no exato momento em que o arcabouço substituiu o finado teto de gastos.
Conter o aumento dessas despesas é o mínimo que se espera de um governo responsável, e é papel de Haddad persuadir o presidente a enfrentar esse dilema. Não enfrentar essa realidade não só sepultará o arcabouço fiscal do ministro, como também condenará o País a um baixo crescimento econômico, um legado que Lula certamente não deseja ter como seu.
Comentário nosso
Com a economia fora do controle e a ânsia de ajudar o seu partido nas eleições desse ano, Lula está numa verdadeira “sinuca de bico”. As medidas para controlar a economia são na quase totalidade amargas e antipáticas. O grande trabalho de Haddad, uma das poucas “cabeças” lúcidas deste Governo, é convencer Lula é tomar medidas que podem tirar votos do seu partido. Lula tem que se convencer de que o Brasil é maior do que o PT e sua obrigação maior é com o Brasil. (LGLM)