Para Lula da Silva, a economia vai bem, mas o mercado promove um ataque especulativo contra o real. O que ele ignora é que suas declarações não contribuem em nada para ajudar os mais pobres
Reunido com economistas no fim de semana, Lula da Silva parece finalmente ter assimilado a informação. Ontem, durante o lançamento do Plano Safra da Agricultura Familiar, questionado sobre se achava que o Banco Central deveria intervir no câmbio para conter a desvalorização do real, o presidente respondeu que falaria apenas sobre arroz e feijão.
O comedimento de Lula da Silva trouxe algum alívio nas cotações do dólar, mas seria ingenuidade acreditar que ele tenha se convencido de que suas declarações contra a autonomia do BC e a responsabilidade fiscal foram um erro.
Afinal, não se pode esquecer que, no dia anterior, Lula da Silva havia sugerido que o governo faria “algo” para conter a desvalorização da moeda – frase que levou o d lar ao maior valor desde janeiro de 2022.
Sem que Lula esclarecesse o que quis dizer com isso, o mercado passou a aventar a possibilidade de que o presidente adotaria medidas de controle de capitais, como a alteração do IOF que incide sobre operações cambiais. Por mais absurda que a ideia pareça, ela ainda é mais factível que a possibilidade de o governo cortar despesas ou propor reformas estruturais, que é o que de fato teria efeito benéfico sobre o câmbio.
Mas a subida do dólar foi tão intensa que finalmente acendeu um alerta no governo sobre seus impactos na inflação. Não é segredo para ninguém que as cotações do dólar afetam os preços de maneira geral, sobretudo o de insumos importados.
Basta analisar a balança comercial para perceber o estrago que o câmbio pode causar nos itens que lideram as importações brasileiras, como combustíveis, adubos, fertilizantes químicos, produtos manufaturados, máquinas e equipamentos, semicondutores, autopeças e trigo, entre outros.
Talvez o presidente precise ser lembrado de que o País ainda precisa adquirir gasolina e diesel no exterior para abastecer o mercado interno. Se a situação ainda não piorou, é somente porque a patriótica Petrobras decidiu “abrasileirar” os preços em maio do ano passado e não autorizou nenhum reajuste na gasolina e no diesel neste ano, o que tem ajudado a segurar a inflação.
Segundo a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), a Petrobras teria de elevar a gasolina em R$ 0,67 por litro e o diesel, em R$ 0,73 por litro, para equiparar os preços aos praticados no exterior. Enquanto o dólar não recua, a companhia tem de arcar sozinha com essa diferença, que, no passado recente, gerou perdas bilionárias e por muito pouco não levou a companhia à ruína.
Os efeitos do aumento de preços no agronegócio e na indústria, por óbvio, chegam também ao comércio e aos serviços, ainda que com alguma defasagem. Não por acaso, parte do mercado já não descarta mais a necessidade de um novo aumento da taxa básica de juros ainda neste ano. Embora a Selic esteja em 10,5%, a curva de juros futuros projeta que ela terá de ser elevada.
Para Lula da Silva, a economia vai bem, mas o mercado realiza um ataque especulativo contra a moeda brasileira. O que ele ignora é que suas declarações não contribuem em nada para ajudar os mais pobres, que são os mais prejudicados pelo aumento da inflação.
O mercado, de certa forma, colabora para turvar a percepção do governo sobre a conjuntura macroeconômica – que, sob o ponto de vista do Executivo, não justifica tamanha desvalorização da moeda. O arcabouço fiscal, afinal, sempre teve como foco a ampliação de receitas, não é de hoje que o governo não tem maioria no Congresso para fazer sua agenda avançar, e Lula da Silva sempre demonstrou enorme resistência a medidas de redução de despesas.
Quem acreditou que o governo teria algum juízo e faria diferente o fez por pura fé. Lula da Silva, no entanto, ajudaria muito se ao menos ficasse quieto e deixasse de jogar mais lenha na fogueira. Sabe-se, no entanto, que seu silêncio é temporário.