Nova pesquisa mostra que mundo evangélico é diverso e complexo, ao contrário do que sugerem muitos dos fundamentalistas que se apresentam como seus representantes na política
De acordo com a pesquisa, 71% dos entrevistados vão a templos de pequeno porte, o que ajuda a explicar o crescimento da fé evangélica em regiões periféricas. Em bairros que nunca conheceram nem igrejas ricamente decoradas nem megatemplos que mais parecem casas de shows, o culto realizado em pequenos espaços, às vezes uma sobreloja ou até mesmo a garagem improvisada de um vizinho, é onde uma camada da população sem acesso a quase nada finalmente encontrou espaço para ser ouvida e reconhecida.
A adaptação à realidade regional não se dá apenas na ocupação dos espaços físicos. Apenas 19% dos entrevistados mostraram simpatia pelo chamado homeschooling, isto é, a educação das crianças em casa, e não na escola – bandeira da direita evangélica norte-americana, importada aqui pelo bolsonarismo, que tem como objetivo proteger os filhos de uma suposta doutrinação esquerdista e pervertida nas escolas. A questão, que a pesquisa evidencia, é que a escola, no Brasil, não é apenas o lugar de aprendizado, é também o lugar onde as crianças de famílias pobres se alimentam – realidade que foi escancarada na recente pandemia de covid-19. Na hierarquia das famílias evangélicas, ao que parece, alimentar os filhos é mais importante do que protegê-los de ameaças que só existem no discurso de pastores extremistas e dos políticos que exploram a fé alheia para angariar votos.
Outra pauta importante entre conservadores, a das armas, também não tem aderência entre os evangélicos. Só 28% apoiam que cidadãos tenham acesso a armas para se defender. Ao mesmo tempo que rejeitam o aborto, apenas três entre cada dez evangélicos concordam que mulheres que recorram ao método sejam processadas e presas, punição prevista num infame projeto de lei apresentado pela bancada que se diz evangélica no Congresso. E se 57% dos entrevistados são contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, uma esmagadora maioria (86%) acredita que os templos devem estar abertos a homossexuais e transexuais.
Para o grupo entrevistado, líderes religiosos também não devem interferir em escolhas políticas. Expressivos 70% são contrários a que pastores indiquem em quem devem votar, enquanto 76% acreditam que a citação de políticos não deve ocorrer durante os cultos. E 33% rejeitam que religiosos ocupem cargos públicos.
A percepção de que o Brasil vem se tornando um país mais conservador, sobretudo graças ao crescimento dos evangélicos, é muitas vezes acompanhada da visão, sem qualquer embasamento, de que os evangélicos são um grupo monolítico, que docilmente se deixa conduzir por líderes reacionários que pugnam pela redução de direitos de minorias.
O teste de realidade, porém, já fez com que expoentes do conservadorismo político recuassem. Depois da reação negativa da sociedade em relação ao projeto da bancada evangélica que trataria como assassinas as mulheres estupradas que abortam, com penas superiores às impostas aos estupradores, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, expoente do evangelismo bolsonarista, apressou-se a se dizer contrária.
Aos que têm a pretensão de cabalar votos entre eleitores que se declaram evangélicos, portanto, a primeira lição que a pesquisa mostra é que esses cidadãos são, como o resto da sociedade, indivíduos com aspirações comuns a todos – querem trabalhar, viver com dignidade e ter paz. Tendo a Bíblia como referência e o templo como sua comunidade, querem apenas respeito por suas crenças e por seus receios.
Comentario nosso:
A pesquisa do Datafolha prova que, pelo menos em São Paulo, os evangélicos não são os bichos de cabresto que os políticos evangélicos pregam que seus fiéis seriam. E acreditamos que talvez em números um pouco menores são os evangélicos de todo o país. Os evngélicos não são táo burros quanto seus pretensos representantes querem que eles sejam. Podem até ser enganados na hora de abrir a bolsa para encher os cofres das igrejas, mas não estão dispostos a abrir mão do direito de pensar no que é melhor para eles. Podem até tentar comprar a salvação, mas não se entregam de corpo inteiro. (LGLM)