Relator do Orçamento falou que só se perde essa conquista “sob lança nas costas”
(Carlos Andreazza, no Estadão, em 09/08/2024)
Natural que reagissem. Em várias frentes. Numa delas, o presidente da Comissão Mista de Orçamento, Júlio Arcoverde, informou que não votará a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025 neste agosto. Só depois das eleições. Arcoverde é do PP do Piauí. É Lira e Ciro Nogueira.
O governo tem de enviar a proposta de Lei Orçamentária até 31 de agosto. Tudo o mais constante o fará sem as balizas da LDO. Não se trata apenas de retaliação a Lula – que os donos do Parlamento consideram manobrar por meio de Dino.
Retalia-se a constituição do Orçamento da União, donde o planejamento estatal, de modo a ganhar tempo; para que se possa formular-negociar de que maneira será novamente burlada uma determinação do Supremo sobre o orçamento secreto.
O Congresso não abrirá mão do controle dos dinheiros. A vir nova superfície para abrigar o dínamo.
Na melhor hipótese para o Lirão, cria-se a já aventada emenda dos líderes de bancada – a ser o paraíso dos proprietários de partidos, o estado da arte para a engenharia de apropriação patrimonialista de fundos orçamentários contra a eficiência nos gastos públicos e a igualdade em disputas eleitorais. Na pior, deposita-se boa parte dos bilhões sob as emendas individuais e se estabelece o tal calendário para amarrar os pagamentos ao relógio paroquial da vereança federal.
O sindicalista Arcoverde é transparente: “Não se pode perder nenhum direito adquirido de nenhum parlamentar em relação às emendas”. Direito adquirido, minha gente! O deputado tratando o assalto a uma penca de princípios constitucionais como se garantia definitivamente incorporada ao patrimônio político dos parlamentares; como se o ministro Dino lhes tivesse confiscado a poupança-previdência.
E não é?
Mais: “Transparência dá até para discutir sempre”. A concessão que nos faz, disposto a admitir alguma transparência, decerto crente na existência de meia transparência. Quem sabe aceite dar objeto às emendas Pix? Pai Lira já deu a letra.
A letra do senador Ângelo Coronel, relator-geral do próximo Orçamento e guerreiro do povo legislador: “Conquistas terminam virando cláusulas pétreas.”
O ousado trata como cláusula pétrea aquilo que um advento inconstitucional assegura. “Só se perde [a conquista] sob lança nas costas ou sob tortura.”
Às armas, cidadãos! Uma jornada mesmo épica. Marchons! Marchons!
Comentário nosso – Você eleitor amigo já pensou por que os deputados e senadores fazem tanta questão do chamado orçamento secreto? E, por acaso, sabe o que se chama orçamento secreto? Orçamento secreto são as verbas parlamentares que receberam o apelido de emenda pix. Ou seja, dinheiro que é transferido direito do orçamento da União, ou seja do Tesouro, sem que ninguém saiba quem foi o parlamentar que a destinou, nem o prefeito que o recebeu, nem em que foi que este prefeito o aplicou. Imaginem uma situação que podia acontecer bem perto de nós. Hugo Motta destinava uma verba para seu pai, prefeito de Patos, para ele aplicar do jeito que bem quisesse, e sem que ninguém soubesse de nada. Ou o mesmo Hugo Motta destinasse uma verba para um prefeito que vem votando nele há quase vinte anos. Não quero dizer que ele venha fazendo isso. Estou dando só o exemplo. Até porque se ele estivesse fazendo isso, ninguém ia saber. É por isso que senadores e deputados estão defendendo com unhas e dentes estas maracutaias. E quem garante que uma parte deste dinheiro não termina no bolso deles? E o pior de tudo, eles dizem que estas maracutaias são direito adquirido. Daqui a pouco vão dizer que todas as suas maracutaias são direito adquirido e eles vão “pintar e abordar”. Daqui a pouco, Bolsonaro vai alegar que tudo o que fez de errado foi direito adquirido. Mulher bota chifre em marido e alega que é direito adquirido. Pediatra passa anos estuprando as menininhas e alegando que é adquirido. Velhaco enganando todo mundo e dizendo que é direito adquirido. Traficante tentando se livrar da cadeia, alegando direito adquirido. E assim infinitamente para a frente. (LGLM)