Em que momento a política passou a concentrar tanta gente ruim?

By | 26/08/2024 2:05 pm

Para onde foram os bons, os hábeis, os mais jovens, com sanidade e com equilíbrio mínimo?

(Opinião por Leandro Karnal, historiador, escritor, membro da Academia Paulista de Letras, colunista do Estadão desde 2016 e autor de ‘A Coragem da Esperança’, entre outros, no Estadão em 25/08/2024)
Foto do author Leandro KarnalEm que momento a política passou a concentrar tanta gente ruim? Minha querida leitora e meu estimado leitor: não parece que, de umas décadas para cá, com exceções, só o pior do humano começou a fazer carreira partidária? Veja: eu sei que há uma tia ou um cunhado de maus bofes em todas as famílias. Imagino que seja impossível pertencer a uma associação piedosa sem conviver com alguém do mal. É quase uma cota em festas, escritórios, famílias e condomínios: uma pessoa, ao menos, muito ruim. No entanto, na grande política profissional, com exceções, parece o contrário.
Chegamos à hora da eleição, mas as opções são, quase sempre, entre Lúcifer e Satanás
Chegamos à hora da eleição, mas as opções são, quase sempre, entre Lúcifer e Satanás Foto: ‘Sabá das Bruxas’, Francisco Goya

Começo lá fora. Os EUA possuem mais de 330 milhões de habitantes em um enorme território. Nas universidades estadunidenses, iniciaram-se várias revoluções administrativas e tecnológicas extraordinárias. É um país de ideias, de ação, de empreendedores e administradores de primeira linha. De repente, para a presidência, concorrem duas hipóteses com problemas estruturais. Entre milhões, são as melhores? O que houve? Para onde foram os bons, os hábeis, os mais jovens, os com empatia, os com sanidade e com equilíbrio mínimo?

Volto ao meu Brasil com céu de anil. Terra vasta e generosa, com homens e mulheres de enorme talento. Da pessoa que administra um lar mais humilde e faz peripécias de orçamento até quem cuida de uma grande empresa: há talentos peculiares por aqui. Os desastres das cheias no Rio Grande do Sul revelaram heróis e, claro, canalhas. Crises sempre têm sua cota de velhacos. Posso afirmar: também houve muita gente corajosa, com generosidade sem fim! Nossa habilidade no convívio social é louvada no mundo todo. A alegria brasileira é alvo de debates acadêmicos. Com tantas tragédias e desníveis sociais, somos um povo que ainda sorri, ajuda, trabalha e… canta! Chegamos à hora da eleição, mas as opções são, quase sempre, entre Lúcifer e Satanás! De novo! Por vezes, ainda existe a aliança de Belzebu com Mefistófeles para vencer o “Coisa Ruim” do outro espectro político. Briga de demônios, com projetos velhos, desequilíbrios pessoais, contestações estruturais de ética e falta de quase tudo que os qualificaria para o cargo. Não aguento mais votar contra alguém, escolher um candidato que eu acho ruim, porque o outro é pior. Neste século, não vi debate de ideias e de projetos. Vejo acusações biográficas sobre quem seria o esgoto mais podre e qual aliado é o mais defeituoso.

Estamos em campanha municipal. Percorro o Brasil e reconheço que já topei com bons projetos locais, especialmente em educação. Posso dizer com conhecimento do território brasílico: são exceções e quase sempre em lugares menores.

Sou historiador profissional. Não crio a fantasia de que, no passado, os políticos eram honestos e produtivos e, de repente, ficaram ruins. Estudei corrupção na Colônia, no Império e na República. Sempre houve ladravazes, palavra que meu pai (político e advogado) adorava usar. Ladravaz (todos podem incorporar a palavra ao seu vocabulário) é um grande ladrão, um aumentativo de gatuno (outro termo bom é ladroaço). Havia e há larápios.

Tenho anseio por ética política. No momento, penso na competência mesmo, na capacidade administrativa, que inclui e excede o básico campo da honestidade. Aplicando a determinação constitucional do Artigo 37, contida no acróstico LIMPE (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência), pense comigo: qual é o governante recente que cumpre tais itens constitucionais de forma razoável? Ser honesto tornou-se tema forte pela escassez, porém esse é atributo jurídico para fazer alguém não terminar mandato na cadeia. Eu enfatizo a eficiência, fruto da experiência e da inteligência. Parece que a política tem atraído pouca gente adepta do E do LIMPE. Para onde foram as pessoas que acreditam na distinção entre bens públicos e privados? Onde se escondem os hábeis administradores? O que houve para que fôssemos invadidos por um exército uniforme de gente tosca, com baixa visão estratégica e moralidade duvidosa?

Alguém me disse uma vez: não se iluda, você está cadastrado em uma zona eleitoral, mas isso nunca será uma palavra neutra. Há espaço para esperança de algo realmente bom? Com a palavra – nós, as pessoas que elegem. Teremos escolhas de verdade?

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Category: Nacionais

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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