Ministro toma posição ativa ao pedir celeridade do governo para conter incêndios, mas juristas e economistas questionam eficácia; procurado oficialmente, o gabinete não quis se manifestar
Juristas ouvidos pela reportagem dizem que a Corte tem se mostrado como “salvaguarda” na defesa de pautas ambientais e como “indutor” no enfrentamento do fogo, que afeta principalmente a Amazônia e o Pantanal brasileiro, mas há quem aponte “heterodoxia” nas ações do magistrado. Procurado oficialmente, o gabinete do ministro não se manifestou.
Na noite desta segunda-feira, 16, o ministro da Advocacia-Geral da União, Jorge Messias, informou que Lula procurou o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, e fez a ele um apelo para que a Corte tomasse “todas as medidas necessárias” para priorizar o julgamento de ações que tratem de questões ambientais, tanto cíveis como criminais.
Também na segunda-feira, durante a abertura da reunião do Observatório do Meio Ambiente e das Mudanças Climáticas, no Conselho Nacional de Justiça, o presidente do STF falou das providências que haviam sido tomadas pelo Supremo nas ações conexas à proteção ambiental e às queimadas e, dirigindo-se a todos os juízes do País, pediu tratamento de prioridade máxima aos processos envolvendo incêndios criminosos, realçando a gravidade desse fatos.
Protagonismo de Dino
Nas últimas semanas, Dino deu 15 dias para que a União mobilizasse o maior contingente de agentes das Forças Armadas, da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária da Força Nacional e da fiscalização ambiental para conter os incêndios, cobrou informações da Advocacia-Geral da União sobre como o governo conduz o trabalho, mobilizou a convocação de bombeiros de Estados não atingidos com queimadas e autorizou o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a usar crédito extraordinário fora da meta fiscal para combater incêndios.
Nesse último caso, Dino deu autorização para o governo editar uma medida provisória (MP) apenas definindo o valor do crédito a ser destinado. Essa decisão impede que esses gastos voltem a ser limitados caso a MP caduque ou o Congresso não a aprove.
Tradicionalmente, o reconhecimento de estado de calamidade é feito pelo Congresso Nacional, por meio de projeto de decreto legislativo (PDL), como ocorreu no caso das enchentes do Rio Grande do Sul, em maio.
A própria ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, sugeriu, em audiência no Senado realizada no começo deste mês, uma proposta similar. Ela falou que o Brasil deve criar uma legislação que permita a possibilidade de realizar gastos para a contenção da emergência climática que fique fora do teto de gastos.
Mas, nenhuma proposta neste sentido foi negociada pelo governo Lula com o Congresso, embora, como mostrou o Estadão, uma série de documentos incluindo ofícios, notas técnicas, atas de reuniões e processos judiciais mostram que a gestão petista tinha ciência do que estava por vir desde o início do ano.
As decisões de Dino ocorreram após acórdão em julgamento de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). Ele foi o redator após apresentar o voto vencedor. São, no total, três ADPFs apresentadas, respectivamente, pela Rede, pelo PT e por um bloco de partidos composto pelo PSB, PSOL, PT e Rede em 2020 e em 2021. Em suma, os partidos pediam ao STF que o governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL) agisse com urgência para conter as queimadas do Pantanal e na Floresta Amazônica.
O professor de Direito Constitucional Thomaz Pereira afirma que Dino age de forma “heterodoxa”, e reivindica um protagonismo para ele mesmo, quando a Corte poderia tomar essas decisões de forma colegiada, em conjunto com outros ministros.
“É possível achar que é heterodoxa que isso tenha sido feito pelo ministro Flávio Dino, como relator de ação que já foi julgada, que tem pedidos genéricos pela preservação da Amazônia e a partir disso ele próprio tomar decisões”, afirma. “Dino coloca o Supremo por iniciativa dele, não da Corte, numa posição de protagonismo em gerenciar uma crise que já está sendo gerenciada. Não é que não exista atores atuando neste caso.”
Economistas, por sua vez, apontam que as ações reduzem burocracias, mas também criam contabilizações paralelas à meta que fragilizam a busca pela redução do déficit primário, a diferença entre o que o governo arrecada e gasta, sem contar as despesas com a dívida.
Para o economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, a decisão de Dino foi “correta”. “Nos casos de queimadas, que representam uma situação de calamidade e urgência, pode-se usar o crédito extraordinário e ele será apartado das regras fiscais (teto e meta do primário)”, diz o economista.
Ele também pondera que a previsão de espaço fiscal para contingências e imprevistos precisaria ser debatida “a sério” no Brasil. Salto dá como exemplo a proposta orçamentária do próximo ano, que contém uma reserva de contingência de quase R$ 40 bilhões. No entanto, todo esse montante deverá ir para as emendas parlamentares. “Não seria o caso de reformular esse conceito e prever uma reserva que, efetivamente, funcionasse como um recurso orçamentário para uso emergencial?”, questiona o economista.
Nauê Bernardo também pondera que há outros prejuízos em jogo. ”Quando você olha para o fenômeno de incêndio, você tem agressão ao meio ambiente em todas as esferas. Tudo isso gera, se você olhar em uma perspectiva financeira, prejuízos ao País”, diz. “Acho muito importante levar em conta que essa fumaça causa muitos prejuízos à saúde das pessoas. Ou seja, ainda tem potencial para pressionar o sistema de saúde.”
‘Pandemia de incêndios florestais’
Em uma audiência no começo deste mês, Dino disse que o Brasil vive “uma autêntica pandemia de incêndios florestais”. De acordo com o ministro, os Três Poderes devem se mobilizar para enfrentar a crise assim como se mobilizaram na pandemia de coronavírus e nas enchentes no Rio Grande do Sul.
Durante a pandemia, o STF tomou diversas decisões relacionadas, por exemplo, a atuação policial em favelas, proteção das comunidades indígenas, processo legislativo, direitos trabalhistas e pagamentos do Bolsa Família.
Os incêndios que alastram o País ganharam um outro contorno crítico com o incêndio que se alastrou pelo Parque Nacional de Brasília neste último domingo, 15. Até a noite da segunda-feira, 16, o incêndio tomou 2 mil hectares da área interna do parque.
A fumaça envolveu a capital federal de modo que algumas repartições públicas dispensaram atividades presenciais na segunda-feira. Foi o caso da Universidade de Brasília.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobrevoou a área no domingo e se reuniu com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, para discutir a situação.
Comentário nosso – “Põe tua barba de molho quando vires a barba do vizinho”. O “jumento” do Lula não tinha aprendido. Agora que o fumaceiro dos incêndios chegou a Brasilia ele resolveu agir. E mais uma vez o STF vai salvar o Brasil. Milhões teriam morrido na pandemia se não fosse a ação do STF, quando Bolsonaro cruzava os braços. Agora, precisou Flávio Dino pegar naquela vara que faz o boi andar, para Lula descobrir que o Brasil estava pegando fogo. Esperamos que ainda haja tempo de salvar o país das queimadas e incêndios propositais. (LGLM)