As regras do seguro-desemprego devem mudar (confira comentário nosso)

By | 02/11/2024 8:08 am

Atacar as causas, além dos efeitos; razão maior dessa distorção é a desastrosa taxa de rotatividade dos trabalhadores

(Luís Carlos Moro,  Advogado, é presidente da Associação Luso-Brasileira de Juristas do Trabalho e secretário-geral da Associação Americana de Juristas; sócio de Moro e Scalamandré Advocacia). Na Folha, em 01/11/2024)

O governo avalia mudar os critérios de concessão do seguro-desemprego. Há a percepção de que a gestão desse direito precisa de melhorias para se viabilizar como política permanente. O seguro contra o desemprego “involuntário” é um analgésico para as dores dessa contingência social. O custo da analgesia, no entanto, tende a ser mais caro que a prevenção e o tratamento da doença.

A sociedade tem arcado com os ônus da liberdade quase absoluta de dispensar empregados; do falso empreendedorismo de subalternos; do círculo vicioso da fila do seguro-desemprego, em que o beneficiário de hoje será o mesmo do futuro, tão logo cumprido o ciclo de carência temporal para a assistência ao carente material.

Prints da tela do aplicativo da carteira de trabalho digital
Aplicativo da carteira de trabalho digital – Divulgação

desemprego minguou. Segundo o IBGE, a força de trabalho empregada no Brasil ascende a 108 milhões e 826 mil pessoas, e a desocupação é de 6,4%, a menor da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Contraditoriamente, nunca se despendeu tanto dinheiro público com o desemprego. Os valores dispararam e culminaram, em agosto de 2024, em R$ 52,4 bilhões nos últimos 12 meses. Para 2025, o que se orça é R$ 56,8 bilhões. Hoje, mais de 500 mil pessoas recebem o benefício.

A valorização real do salário mínimo contribui para esse aumento, mas está longe de ser sua causa central. Há desemprego simulado e cumulação do benefício com atividade remunerada informal. Muita gente com salários mais elevados partiu para o falso empreendedorismo ou informalidade, somando os rendimentos do trabalho em ilicitude com o seguro-desemprego. Programas de recolocação têm muito a melhorar.

A causa maior dessa distorção está na desastrosa taxa de rotatividade dos trabalhadores brasileiros. De 51,3 milhões de empregados regulares, o Ministério do Trabalho informa que em 2023 foram desligados 21,5 milhões apenas no setor privado. Isso equivale ao máximo histórico da força de trabalho na Espanha! A estatística revela que se abusa da liberdade de dispensar. Uma Espanha por ano! Em menos de dois anos, toda a força de trabalho formal brasileira. Não é viável manter tal progressão.

O problema sequer é o valor despendido ou quantas pessoas alcançam o seguro-desemprego, efeitos da questão. É preciso considerar as causas de tanta desocupação em mercado aquecido e se as regras atuais não incentivam a ruptura dos contratos de trabalho em desprezo ao princípio da continuidade dos vínculos de emprego.

Creio que o Brasil deva mudar as regras do seguro, que precisa acertar o seu público-alvo, reduzir seus gastos e melhorar a qualidade do destino desses valores. Mas isso não basta. O arcabouço fiscal não pode implicar o calabouço social. É necessário alterar também as normas que regem o emprego.

Devemos substituir o desemprego incentivado por um sistema de emprego minimamente assegurado. Pensemos em incentivos à permanência dos trabalhadores nos seus postos de trabalho, em melhorar serviços de recolocação, reduzir vícios e vezos do mercado, que lança ao desemprego periodicamente as mesmas pessoas, que voltam a fruir do benefício.

A alta rotatividade de mão de obra nega o que a Constituição assegura: proteção contra dispensa arbitrária, cuja mora legislativa perdura há 36 anos. A sociedade aguarda a lei complementar negligenciada em todas as legislaturas desde então.

Comentário nosso – Há muitos abusos e fraudes cometidos com o seguro-desemprego. Empregados que fazem acordo com o patrão, para este despedi-lo sem pagar os 40% do FGTS e o aviso  prévio (o patrão paga, mas recebe o dinheiro de volta). O patrão dispensa o trabalhador e este continua trabalhando sem a carteira assinada. Esta fraude é muito comum, apesar de gerar uma das multas mais pesadas do sistemam (mais de quinze mil reais), por fraude ao seguro desemprego. Lavrei duas destas em Patos, por coincidência em dois postos de gasolina. O empresário pode quitar a multa pela metade,  se desistir de recorrer da penalidade. E há uma agravante para o empregado. Ele pode passar um determinado tempo sem direito a receber novos seguros-desemprego. Nos dois casos não havia justificativa legal para escapar da multa. Os empregados estavam recebendo  o seguro-desemprego e foram encontrados, pela fiscalização do trabalho, trabalhando na empresa da qual haviam sido dispensados. Muitos empregados são viciados nesse tipo de fraude. Trabalham o tempo suficiente para ter direito ao seguro desemprego, faz acordo com o patrão para ser demitido e continuar trabalhando, ou para voltar para o trabalho assim que acabam de receber o seguro. Na fiscalização encontrei muitos casos de repetidas voltas ao trabalho, depois de cumprido o prazo de afastamento, casos em que não gerava multa, a não ser que provássemos que o empregado continuara trabalhando, enquanto recebia o seguro. Também é considerada fraude ao seguro desemprego, quando o empregado é encontrado trabalhando sem carteira assinada e o empresário não cumpre a determinação da fiscalização para registrar o empregado. Neste caso cabe aquela multazinha de quinze mil reais. É um caso muito comum, quando o empregado não aceita de forma alguma a assinatura da carteira, para não perder determinados benefícios: BPC próprio ou de dependentes, aposentadorias por invalidez, bolsa-familia entre outros. (LGLM)

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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