Reduzir jornada de trabalho faz sentido, mas texto da PEC contém erro de tabuada que explica em parte a baixa produtividade do Brasil
(Hélio Schwartsman, colunista da Folha. em 15/11/2024)]
O que me impressionou no caso da PEC do fim da escala 6×1 é que cerca de duas centenasparlamentares tenham chancelado uma proposta que contém um erro grotesco de tabuada.
O texto da PEC fala em semana de trabalho de 36 horas, com oito horas diárias ao longo de quatro dias por semana. Non sequitur. 8×4=32. Se a ideia é perfazer 36 horas em quatro dias, é necessário que a jornada tenha 9 horas.
Errar é humano, mas instituições precisam desenvolver mecanismos de correção do erro. Surpreende-me que nenhum dos signatários tenha solicitado a retificação do texto antes de a história crescer tanto.
Atribui-se (falsamente) a Bismarck o chiste segundo o qual o mundo seria muito diferente se a população soubesse como são feitas as leis e as salsichas.
No mérito, a tese de redução da jornada me parece correta. Da roda ao computador, a história do desenvolvimento tecnológico pode ser descrita como uma sucessão de esforços para diminuir o tempo que humanos despendem no trabalho.
Pergunto-me, porém, se faz sentido ter uma regra única para todos os setores. As especificidades do trabalho num hospital, por exemplo, são muito diferentes das de uma fábrica, que divergem das de uma plataforma da Petrobras. Isso sem falar dos cada vez mais numerosos trabalhadores “uberizados”. Penso que o mais sensato seria uma divisão por categoria.
O como fazer também importa. Aprovar um programa de reduções de jornada para ser implantado de forma escalonada ao longo de anos é uma coisa. Mandar fazer tudo de uma vez levaria a choques na economia (inflação e por conseguinte juros e dívida) que ameaçariam a saúde do próprio governo Lula.
Também me parece importante observar que leis não criam riqueza (ou não haveria países pobres). Ao fim e ao cabo, o que determina o nível dos salários reais é a produtividade do trabalho, que no Brasil é baixa e está estagnada há tempos. São várias as razões para isso. Uma importante é a baixa qualidade da educação, do que dá testemunho o erro crasso no texto da PEC.