Chantagem para votar pacote fiscal é exemplo mais evidente do desejo de que recursos continuem escoando para bases eleitorais por baixo dos panos
É dentro deste contexto que o Executivo foi chantageado a arrumar um jeitinho para liberar emendas passando por brechas deixadas pela decisão do ministro Flávio Dino, referendada pelo plenário do STF, que determinou que a gastança com recursos públicos tenham que seguir as regras constitucionais relativas à transparência, à rastreabilidade e ao controle público. Basicamente, o que os parlamentares exigiram é liberar dinheiro para seus aliados sem a exigência prévia de um plano de trabalho para a destinação das emendas Pix, sem a exigência de identificação nominal do parlamentar solicitante ou autor da proposta e sem a regra que limita o teto de valor das emendas. E o governo Lula aceitou.
A ameaça exposta na reunião de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco com Lula antes da internação do presidente foi não votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias, a Lei Orçamentária Anual e, sobretudo, o pacote fiscal do governo, ou ao menos desidratá-lo. Pacote este já considerado modesto pelo mercado financeiro. Ou seja: para permitir que o País corte gastos, o Congresso quer, em troca, que seja liberado para gastar mais e sem transparência. Até pode cortar aumento do mínimo, restringir BPC ou qualquer coisa que o valha, contanto que não se toque nas emendas. Na prática, os parlamentares se apossam ainda mais de um Orçamento no qual apenas sua fatia é sempre preservada.
Isso deveria ser suficiente para uma punição nas urnas aos atuais ocupantes de vagas no Parlamento. E para uma mobilização popular. Mas a polarização insana e ideológica que transformou o debate político brasileiro impede que haja qualquer articulação relevante na sociedade civil contra esse tipo de chantagem. Enquanto a direita bolsonarista que domina quase metade do eleitorado está focada em arrumar um jeito de salvar o ex-presidente da cadeia ou fazer avançar pautas batidas como voto impresso e o armamento da população, a esquerda lava roupa suja por seu resultado eleitoral e tenta encontrar culpados pelo fato de que o governo não consegue melhorar seus índices de popularidade.