Esse vaivém é antigo. O brasileiro assiste a essa novela há pelo menos cinco anos. Foi em 2019, sob o argumento de que o seguro é ineficiente, que o então presidente Jair Bolsonaro fez de sua extinção uma bandeira. Na época, ele enviou uma medida provisória ao Congresso para acabar com o seguro, e, desde o ano seguinte, a taxa não é recolhida. Com isso, Bolsonaro estaria livrando os motoristas do peso de mais uma cobrança feita pelo Estado, em seu típico discurso populista. O dinheiro que já havia sido arrecadado passou para a gestão da Caixa Econômica Federal. E os recursos continuaram a custear indenizações, esgotando-se em novembro de 2023.
Em abril de 2024, o Congresso achou adequado atender a um pedido do governo Lula da Silva e aprovou a recriação do DPVAT, agora com nova roupagem. Com valor de R$ 50 a R$ 60 por veículo, bancaria indenizações por morte, invalidez permanente, total ou parcial e reembolsaria despesas médicas. O projeto foi aprovado na Câmara com o voto de 304 deputados, e no Senado, com o aval de 41 parlamentares.
Desde então, porém, governadores mais alinhados ao bolsonarismo passaram a travar uma batalha retórica contra o novo DPVAT. Pela lei, o pagamento do seguro é obrigatório e condicionante para o licenciamento do veículo, um serviço prestado pelos Departamentos Estaduais de Trânsito (Detrans). Caberia a esses órgãos firmarem acordos com a Caixa para a transferência da taxa.
No início, São Paulo, Paraná e Goiás colocaram-se contra o recolhimento do novo DPVAT. Mas agora nada menos que 21 governos estaduais passaram a criticar o seguro, o que aumentou o imbróglio. Nesse cenário, 444 deputados e 72 senadores votaram pelo fim da taxa para a qual haviam dado apoio pouco tempo antes. É de perguntar o que mudou nesse curto espaço de tempo para que os parlamentares dessem tamanha guinada no posicionamento sobre a conveniência dessa cobrança. E, pior, com o aval do governo Lula.
Por trás do fim do novo DPVAT está, em primeiro lugar, a fragilidade política da gestão Lula. Líderes do governo aceitaram sua extinção diante do risco de derrota ou desmonte do pacote de ajuste fiscal. Além disso, houve articulação da oposição para encurralar a base e sair como vencedora, sob a alegação de que defendia os interesses dos cidadãos. Não à toa, deputados bolsonaristas foram às redes sociais comemorar.
O que se viu, no entanto, foi uma disputa na qual os interesses dos cidadãos jamais estiveram no centro dos debates. Até porque pouca discussão houve para justificar o fim de algo que acabara de ser recriado. Resta saber o que os congressistas dirão àqueles que vierem a ser vítimas de acidentes de trânsito e não poderão contar com nenhum amparo financeiro.
Nessa briga, venceram a demagogia e a irresponsabilidade. A ver o que fará Lula da Silva, se terá juízo, ao sancionar ou vetar a matéria.
Comentário nosso – Comprei meu primeiro automóvel há cinquenta anos e, graças a Deus, nunca atropelei ninguém. Nem a minha esposa. E durante estes cinquenta anos sempre paguei o seguro. Mas, quando meu pai foi atropelado há vinte e seis anos, por um motoqueiro irresponsável, que depois virou agente de trânsito em Patos, recebi o seguro a que a família tinha direito pela morte do meu pai. Não era um grande valor nem restituiria o meu pai, mas era justo. Bolsonaro acabou com o DPVAT, governo Lula ou recriou e o Congresso agora o extinguiu de novo. E agora fica a pergunta. E quando alguém atropelar seu pai e sua mãe, mesmo que não os mate, quem cobrirá as despesas que você terá para cuidar deles, se o DPVAT ou coisa que o valha não mais existir? Vamos ver se Lula terá o mesmo descaramento de confirmar o fim do seguro que tiveram os mesmos parlamentares que o aprovaram há pouco mais de dois anos. (LGLM)