É possível entender o grau de fraqueza do presidente observando-se o tipo de liderança que ele exerce com base em critérios semelhantes aos que são usados para avaliar CEOs
A capitulação vexaminosa do governo Lula a uma lacração de internet – desistindo de adotar uma medida burocrática correta do ponto de vista técnico por puro medo da repercussão de um vídeo crítico feito por um histriônico deputado do baixo clero — foi avaliada de forma quase unânime pela classe política e por analistas como uma demonstração, ou mesmo uma prova, da fraqueza e inépcia política do presidente. Do ponto de vista da eficiência administrativa da Receita Federal e até dos cidadãos que declaram e pagam seus impostos corretamente, era mais do justificável determinar que bancos digitais e fintechs forneçam informações sobre operações de Pix e outros tipos de transações para evitar sonegação fiscal.
A falta de credibilidade da gestão Lula quando o assunto é arrecadação tributária, porém, tornou as versões da oposição sobre mudanças que poderiam afetar o Pix bastante verossímeis. É o mesmo motivo, aliás, que fez proliferar os memes que atribuíram em julho passado ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a pecha de taxador-mor da República, acompanhado do apelido “Taxadd”. Alguns governistas ficaram tão irritados que chegaram a sugerir a proibição da piada.
Os erros em série que levaram o governo a jogar a toalha com facilidade no episódio do Pix, sem qualquer embate político, e as razões de fundo dessa mais recente crise – a fama de ávido arrecadador de impostos do governo petista – não são as únicas evidências de que, em seu terceiro mandato, Lula é um presidente fraco. Há outros sinais que permitem identificar sua debilidade.
Na ciência política, a identificação de um governo fraco costuma ser feita com base na avaliação do funcionamento das instituições e do equilíbrio entre elas, do grau de corrupção, da qualidade dos serviços públicos, da existência de distúrbios sociais e da legitimidade das decisões que partem do Executivo, entre outros elementos. Tudo isso pode ser muito útil para analisar a debilidade do governo Lula. Um fato lembrado com frequência para mostrar o esvaziamento do poder presidencial em Lula 3 é o protagonismo crescente do Legislativo na destinação dos recursos do orçamento.
Para além das questões relacionadas ao arranjo institucional, é possível tentar entender o grau de fraqueza do presidente Lula observando-se o tipo de liderança que ele exerce em seu terceiro mandato com base em critérios semelhantes aos que são usados para identificar CEOs de empresas bem ou malsucedidos. Por essa abordagem, o placar também não é nada bom.
A primeira falha de liderança de Lula é a falta de um projeto para o País. Não apresentou nada parecido durante a campanha presidencial e tampouco nos últimos dois anos de governo. Ele diz que quer reduzir a pobreza, gerar empregos e proteger a democracia. Mas isso não é um projeto de país, isso é o feijão com arroz que qualquer governo deveria servir aos cidadãos. O segundo motivo pelo qual Lula falha como líder é o fato de ele acreditar que as supostas glórias do passado o tornam indispensável para os desafios do presente e do futuro. O bom líder apresenta resultados, em vez de ficar tentando justificar sua liderança por aquilo que fez ou desfez anos atrás.
O terceiro aspecto da fragilidade da presidência de Lula é sua arrogância. Líderes eficientes têm consciência de que não sabem de tudo, admitem erros e estão em constante aprendizado. Eles crescem junto com suas empreitadas. Já pessoas em funções de liderança fadadas ao fracasso costumam acreditar que o poder gira em função delas próprias. Elas agem e tomam decisões como se a medida do sucesso estivesse atrelada ao seu destino individual, não ao que irá acontecer com a organização ou com o país que elas comandam. A não ser que estejamos falando de um ditador em um regime personalista, esse é um dos ingredientes principais de uma liderança fraca. Lula tem como objetivo de governo obter um quarto mandato ou eleger um sucessor. Crescimento econômico e redução da pobreza são para ele um meio para atingir esse objetivo, não um fim em si mesmo. Tanto é assim que ele toma decisões de olho nos índices de aprovação popular e colocou seu marqueteiro eleitoral para comandar a comunicação do governo.
O quarto sinal de um líder fraco aparece quando sua perspectiva de poder se dissolve na mesma proporção em que ele reluta em abrir caminho para um substituto. As dúvidas sobre a saúde de Lula, especialmente após o acidente que lhe rendeu algumas passagens recentes pelo hospital, alimentam as suspeitas, em Brasília, de que sua carreira presidencial se aproxima do fim. E ele nunca estimulou de fato o protagonismo de outras lideranças políticas dentro do seu partido.
O quinto indício de um presidente fraco é a falta de coragem para defender com convicção suas posições e suas políticas, desde que estejam alinhadas com um projeto de país elaborado com racionalidade e transparência de propósitos. Essa coragem faltou a Lula no episódio do Pix e tem faltando também em retrocessos da chamada pauta de costumes que vêm avançando no Congresso sem resistência do governo. Refugiando-se na própria inércia e falta de visão política mesmo quando as taxas de popularidade se tornam desconfortáveis, Lula em seu terceiro mandato é um presidente vacilante, desbotado, fraco.