(Jozivan Antero, no Polêmica Patos, em 30/01/2025)
O ex-agente da polícia federal, psicólogo e advogado Deusimar Guedes escreveu em sua coluna sobre o seguinte tema: Por que um gesto manual, o corte ou cor do cabelo pode ser uma sentença de morte?
Deusimar também fez participação enviando áudio sobre o fato ao jornalista Misael Nóbrega, no Jornal Notícias da Manhã, na Rádio Espinharas FM.
Publicamos na íntegra o texto da coluna no site Mais PB:
“Segundo o último levantamento do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Brasil possui atualmente 88 facções criminosas operando no país, especialmente no sistema prisional. E, pelo menos duas destas, têm ramificações fora do país.
Nos últimos meses foram registrados no Brasil uma série de assassinatos brutais motivados por gestos simples que, em algumas regiões, são interpretados como sendo códigos destas facções, haja vista que estas organizações criminosas se apropriam indevidamente destes símbolos e gestos transformando-os em códigos de identificação dos membros da referida organização, e isto tem colocado jovens, adultos e até crianças em situações de extremo perigo.
Originariamente a própria suástica significava paz e liberdade em várias culturas. Contudo, da mesma forma foi apropriada pelos nazistas que a transformaram num símbolo de ódio e opressão. Isto demonstra que o significado de um símbolo ou gesto manual pode ser radicalmente alterado dependendo do contexto e das intenções de quem o utiliza.
Os símbolos utilizados por facções criminosas no Brasil, como o “V”, que originariamente significa vitória e ou paz e amor, está sendo indevidamente associado à facção (Comando Vermelho), já o gesto de três dedos, muito comum na comunicação entre jovens passou a associar-se ao PCC – Primeiro Comando da Capital e, desta forma, têm se tornado marcas de poder e identidade dentro e fora dos territórios controlados por essas organizações.
Antes inofensivos gestos manuais, como o “V”, a exposição de três dedos, um risco na sobrancelha, o modelo do corte ou cor do cabelo, em áreas dominadas por facções criminosas, em certas localidades do Brasil, carregam significados profundos de identificação e podem ser vistos como provocações, colocando a vidas dos executores de tais atitudes em risco.
O braço mais lucrativo do crime organizado no Brasil, e em quase todo o mundo, é o tráfico de drogas. Este é um crime territorial. Portanto, nas áreas dominadas por facções alguns sinais e gestos funcionam como forma de identificação entre os criminosos e também como mecanismos de controle social e territorial e, assim sendo, aquelas pessoas, que mesmo por engano, invadirem tais territórios ou fizerem gestos indevidamente apropriados pelas referidas facções, correm o risco de serem submetidas à pena capital, inclusive com atos de extrema crueldade.
As organizações criminosas utilizam desta intolerância extrema com o fim específico de não deixar dúvidas sobre quem manda naquela área, preservando com isto a hegemonia territorial e prevenindo desafios à autoridade destes criminosos.
Aqui mesmo no estado da Paraíba, o conflito entre as facções “Estados Unidos” e “Al-Qaeda” exemplifica como a simbologia é utilizada como arma de controle. A facção “Al-Qaeda” abrasileirada para “Okaida” surgiu como oposição à hegemonia dos “Estados Unidos”. Nesse contexto, roupas com estampa da bandeira americana, estrelas e listras passaram a ser vistas como provocação em áreas controladas pela “Al-Qaeda” e, desta forma, vários jovens inocentes em diferentes estados do Brasil têm perdido a vida por adotarem estilos ou gestos apropriados pelas facções criminosas.
O problema em comento tem se tornado tão grave que já chegou a afetar até mesmo os símbolos da linguagem dos surdos.
Portanto é fundamental que o poder público empreenda ações rígidas e efetivas reassumindo o controle territorial e de autoridade sobre essas áreas dominadas pelas facções. A desorganização do poder público é diretamente proporcional à organização do crime. Também é de suma importância que a comunidade se una para resistir a tal influência negativa e criminosa. O fortalecimento dos laços comunitários é sempre uma estratégia eficaz. Uma comunidade unida, esclarecida e disposta a resistir, contando sempre com o apoio indispensável das instituições públicas, é o caminho a ser trilhado, pois uma comunidade unida se torna mais forte, independente e menos vulnerável à dominação e à coação de criminosos.
Enquanto nada disso acontece, é necessário que a população seja alertada por campanhas educativas informativas sobre o significado destes símbolos para as organizações criminosas. Tais campanhas devem acontecer especialmente nas escolas e em locais de concentrações de turistas, com a utilização de material didático apropriado que realmente consiga informar e prevenir as pessoas sem glamourizar as facções criminosas.
A história nos ensina que a luta contra a coação deve ser constante e coletiva”.
Ouça Deusimar Guedes: