A sagração do orçamento secreto

By | 04/02/2025 6:20 am
Imagem ex-librisO deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) e o senador Davi Alcolumbre (União-AP) já entraram no Congresso, no sábado passado, sendo cumprimentados como os novos presidentes da Câmara e do Senado, respectivamente. Competindo contra adversários fictícios, na prática, há meses a vitória de ambos na eleição para o comando das duas Casas Legislativas pelos próximos dois anos eram favas contadas, sendo incertos apenas os placares de votação. Motta foi eleito com 444 votos (86% do plenário da Câmara), enquanto Alcolumbre recebeu 73 votos (90% do plenário do Senado).

Em que pese a expressividade desses números, a eleição não representou os triunfos pessoais de Motta e Alcolumbre. O que se viu foi a sagração do orçamento secreto. Tanto o deputado como o senador só foram eleitos praticamente por aclamação – unindo do PT de Lula da Silva ao PL de Jair Bolsonaro – porque por trás de seus nomes há grupos políticos muito bem articulados, independentemente de suas eventuais divergências ideológicas, interessados na perpetuação de um modelo de exercício do poder fora de qualquer tipo de controle.

Frise-se: o grande vitorioso na eleição para as Mesas da Câmara e do Senado foi o orçamento secreto. O tom corporativista dos discursos de Motta e Alcolumbre, em certos momentos afrontosos aos demais Poderes, sobretudo ao Supremo Tribunal Federal (STF), não deixou margem para dúvidas de que o Congresso, lamentavelmente, já não é mais a ermida da representação política da sociedade e da Federação, rebaixado que foi à condição de sindicato de uma expressiva parcela de parlamentares sôfregos por cada vez mais recursos públicos.

Restou evidente na aclamação de Hugo Motta e Davi Alcolumbre – que, malgrado ser Davi, é uma espécie de “Golias” do orçamento secreto no Senado – que a preocupação maior dos deputados e senadores não é outra senão a apropriação de um volume cada vez maior de recursos por meio de emendas ao Orçamento da União indicadas, distribuídas e executadas de forma opaca, em respeito a sabe-se lá quais critérios. Nesse sentido, não deveria causar espanto a ninguém a união fraternal entre lulistas e bolsonaristas em torno das candidaturas de Motta e Alcolumbre, pois o que passou a interessar aos parlamentares é a composição das comissões da Câmara e do Senado, fóruns por onde ora circula a dinheirama na versão “revista e ampliada” do orçamento secreto.

Mudanças em relação às gestões de Arthur Lira (PP-AL), na Câmara, e de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no Senado, se houver, estarão circunscritas ao estilo de negociação dos novos presidentes das duas Casas Legislativas com o STF e o governo. Ao que tudo indica, Motta e Alcolumbre vieram com a missão de compor com o Supremo não apenas a liberação do pagamento de emendas represadas por ordem do ministro Flávio Dino, como a própria manutenção do esquema, talvez em novo formato. Algum acerto haverá, pois não há o mais tênue sinal de que o Congresso abdicará do poder que acumulou sobre o Orçamento na última década – apenas para 2025, está-se falando de R$ 50 bilhões destinados às emendas. Ao mesmo tempo, a Corte decerto está em busca de uma saída honrosa para esse falso impasse, por inconstitucional desde a origem, de maneira a não sair desmoralizada diante de um flagrante ataque aos princípios mais comezinhos da Lei Maior.

Não menos importante, é digna de registro a indigência do governo de Lula da Silva no desenrolar dessa eleição. O presidente da República foi levado a reboque dos acontecimentos, tendo de se sujeitar aos nomes impostos pelos partidos para o comando da Câmara e do Senado porque não tinha alternativa, restando-lhe contar com o eventual apoio político do STF para tentar reaver algum tanto do poder que perdeu para o Congresso.

Ao fim e ao cabo, venceram Motta, Alcolumbre e os grupos políticos que ambos representam, mas não em prol de uma agenda virtuosa para o País – algo que, a bem da verdade, também está em falta no Palácio do Planalto –, e sim de um poder insubmisso à Constituição.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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