Vamos premiar governadores incompetentes que quebraram seus Estados?

By | 10/03/2025 2:05 pm
Imagem ex-librisJá se sabia que o governo federal subestimava o custo do projeto de renegociação das dívidas estaduais, mas nem o crítico mais pessimista seria capaz de imaginar que o Executivo estaria disposto a abrir mão de quase R$ 1,3 trilhão em receitas financeiras até 2048 para ajudar os Estados mais encalacrados do País. O valor foi calculado pelo próprio Tesouro Nacional, mas só veio a público após um pedido feito por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) pelo jornal Folha de S.Paulo.

A depender do atendimento a algumas das condições previstas no projeto, que podem reduzir o juro real do empréstimo a zero, a União renunciará a cerca de R$ 1,285 trilhão em receitas financeiras ao longo de mais de 20 anos; com juro real a 2% ao ano, a perda seria de R$ 793,65 bilhões até 2047. Os dois cenários consideram a adesão de todos os Estados ao Programa de Pleno Pagamento da Dívida dos Estados (Propag).

Esses cálculos, no entanto, ainda podem ser considerados otimistas, pois supõem que a União terá um ganho de R$ 162,5 bilhões em ativos cedidos pelos Estados para abater parte de suas dívidas, como ações de estatais estaduais. A história recente da federalização de empresas públicas de Estados prova o oposto. Na prática, elas costumam se converter em sumidouro de recursos e espaço para acomodar aliados políticos muito bem remunerados.

Diante de números assombrosos, agora se entende por que, durante a tramitação do projeto no Legislativo, o governo preferiu divulgar somente a renúncia com a qual teria de arcar ao longo dos primeiros cinco anos de vigência do programa. De posse de dados sobre o impacto integral da proposta, talvez os parlamentares tivessem se posicionado de maneira diferente, sobretudo os que representam Estados que estão com as contas em dia.

Afinal, 90% das dívidas estão concentradas em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, os Estados mais ricos do País. São eles, portanto, os grandes beneficiários do programa, e só mesmo o fato de serem atualmente administrados por partidos de oposição justifica as críticas de seus governadores.

Embora costume ser tratada como algo menor pelo mercado financeiro, a repactuação das dívidas estaduais é fonte de grande preocupação para especialistas em contas públicas. As recorrentes renegociações, ainda que não afetem o limite de despesas nem as metas fiscais da União, causam impactos relevantes na trajetória da dívida pública no médio e longo prazos.

Se o endividamento cresce, o custo de rolagem da dívida também tende a subir. Logo, um governo como o de Lula da Silva, obcecado com a redução da Selic, jamais poderia se dar ao luxo de menosprezar o assunto e ignorar a opinião dos técnicos.

Mesmo sem ter acesso aos números do Tesouro, o Ministério do Planejamento recomendou veto integral ao projeto, por ver no texto um reforço à “cultura de dependência dos Estados em relação à ajuda federal para equilibrar suas contas”.

“Esse tipo de renegociação das dívidas estaduais cria um viés de risco moral que se consolida no ciclo vicioso: os Estados continuam gastando irresponsavelmente; os Estados esperam novas negociações; a União acaba absorvendo os prejuízos, aumentando sua própria dívida pública”, disse o parecer do Planejamento.

E não se deve eximir o Ministério da Fazenda dessa irresponsabilidade. Embora a autoria do projeto aprovado seja do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), foi a própria pasta que abriu essa caixa de Pandora ao apresentar o controverso “Juros por Educação”, que propunha a redução do indexador das dívidas dos Estados que aceitassem investir no ensino técnico.

O projeto é um exemplo do que não se deve fazer na área de políticas públicas. Afinal, num momento em que os Estados nadavam em receitas e ampliavam despesas, o governo optou por incentivá-los a gastar ainda mais, premiar caloteiros contumazes e punir administradores que se preocupam com a saúde das contas públicas de seus Estados. Por tudo isso, uma coisa é certa: não será a última rodada de renegociação de dívidas estaduais.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde 09 de março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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