Bolsonaro vai à guerra

By | 08/04/2025 7:07 am
Imagem ex-librisNos 26 minutos em que, no domingo passado, discursou na Avenida Paulista para pregar a anistia a si mesmo e aos presos do 8 de Janeiro, o ex-presidente Jair Bolsonaro mandou às favas todos os escrúpulos de consciência e escancarou em definitivo a guerra aberta ao Supremo Tribunal Federal (STF) e às instituições democráticas.

Em circunstâncias normais, na iminência de serem julgados, réus costumam adotar a prudência e o comedimento diante dos julgadores. Mas Bolsonaro não é afeito a normalidades, sobretudo em matéria democrática. Dele, portanto, não se esperaria outra coisa senão o discurso moldado para eletrizar a militância, deixar de lado argumentos jurídicos e concentrar-se no embate político a fim de sustentar seu martírio.

Foi assim que Bolsonaro falou menos sobre a anistia aos golpistas e muito mais sobre a própria inocência e sua eventual candidatura em 2026. Afirmou, por exemplo, que ter eleições sem o seu nome nas urnas significará “negar a democracia”. Voltou a pôr em suspeita as urnas eletrônicas e o sistema eleitoral, em ataque frontal à decisão soberana dos eleitores. Insinuou que o ministro Alexandre de Moraes, do STF, seria o autor de um “golpe” que elegeu Lula da Silva em 2022, e que a “mão pesada” do ministro teria perseguido a direita. Por fim, mas não menos espantoso, admitiu que sabia de algo que “ia acontecer”, ao reconhecer que saiu do Brasil em dezembro daquele ano por saber que, se estivesse no País, seria preso na noite de 8 de janeiro.

A maior novidade, contudo, é que agora Bolsonaro leva consigo os sete governadores presentes – quatro deles possíveis candidatos à Presidência. Se discursos de confronto ao STF são desde sempre parte inerente à cartilha bolsonarista, a inclusão de universo tão relevante de governadores presidenciáveis é coisa nova. Estavam no palanque de Bolsonaro os governadores Tarcísio de Freitas (São Paulo), Ronaldo Caiado (Goiás), Romeu Zema (Minas Gerais), Ratinho Junior (Paraná), Wilson Lima (Amazonas), Jorginho Mello (Santa Catarina) e Mauro Mendes (Mato Grosso).

Decerto sabedor de que todos eles estão de olho em seu espólio político com vista a 2026, Bolsonaro tentou torná-los cúmplices de sua artilharia irresponsável contra a democracia. Não só porque os atraiu para a armadilha de defender o indefensável, isto é, o perdão a um golpista que se mostrou incapaz de curvar-se ao princípio mais comezinho da democracia – a transferência pacífica de poder –, como também porque os fez chancelar o discurso delirante segundo o qual é um perseguido político de uma suposta ditadura do Judiciário. Tal ditadura só existe mesmo na cabeça de Bolsonaro e dos bolsonaristas mais fiéis. Uma provável condenação, se houver, se dará porque são fartas as provas do golpismo que, gestado no entorno do então presidente, quase levou o País, isso sim, a uma ruptura institucional.

E os cúmplices de Bolsonaro, seja por convicção, seja pelo mais puro cálculo político, não decepcionaram. A começar por Tarcísio de Freitas. Em mais uma prova de que tentará até o limite exibir-se como leal ao ex-presidente para herdar seus votos no futuro, o governador de São Paulo recorreu a estultices típicas dos bolsonaristas mais empedernidos, exibindo uma interpretação singular da lei e da política. Disse, por exemplo, que “pedir anistia não é uma heresia, é algo justo”, e que quer “prisão, sim”, mas para quem rouba celular, para corruptos e para quem “invade terra”, como se tentativa de golpe fosse coisa menor. Ora, o julgamento atual está amparado na Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito, que em 2021 substituiu a antiga Lei de Segurança Nacional. Logo, não é um recurso abstrato.

Compreende-se o esforço de Tarcísio e dos demais governadores para caracterizar um golpista assumido como perseguido político, porque este ainda é capaz de levar milhares de pessoas às ruas, um fato político nada desprezível. No entanto, será preciso muito malabarismo retórico para conciliar esse gesto, devidamente registrado por imagens e som, com o compromisso de respeitar a democracia e as instituições republicanas, algo diametralmente oposto ao que faz Bolsonaro há mais de 30 anos.

Category: Blog

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde 09 de março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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