Censo Escolar mostra que o número de alunos no ensino médio técnico cresceu só metade do previsto, reafirmando o anacronismo de um país que ainda trata a modalidade como menos importante

Não é preciso mau humor ou impaciência, contudo, para constatar aquele que talvez seja o mais eloquente retrato do abismo que persiste entre o desejo de um país transformado pela educação, dotado de condições propícias para o seu desenvolvimento, e a realidade dos fatos. Como o Estadão destacou ao retratar o novo Censo Escolar, o número de alunos no ensino médio técnico atingiu apenas metade, ou 49,6%, do que a meta previa para o meio desta década. Em 2014, o PNE estipulava que a educação profissional e tecnológica de nível médio deveria triplicar até o ano passado, chegando a 4,8 milhões de matrículas. Mas não passamos de 2,4 milhões de matrículas. Com a marca, o País chegou a 13,1% dos estudantes de ensino médio cursando o ensino técnico. É muito pouco diante das evidências de que a educação profissional e tecnológica configura um dos principais investimentos de países ricos em seus sistemas de ensino.
A média, por exemplo, dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade conhecida como o “clube dos países desenvolvidos”, é de cerca de 40%. Há países, como Alemanha e Finlândia, que exibem números ainda maiores: 49% e 68%, respectivamente. A boa notícia é que, ao menos na intenção, o ministro da Educação, Camilo Santana, está mirando no padrão dos países ricos (“o nosso desejo é colocar o Brasil nos patamares dos países da OCDE, é ousadia minha?”, afirmou, ao comentar os dados do Censo). A má notícia é que parece haver timidez em excesso na busca de meios para tornar concreta a ambição. Convém reconhecer que há boas iniciativas em curso no âmbito do MEC, mas é hora de acelerá-las, sob pena de o Brasil não só se acostumar à timidez dos avanços incrementais, como também desperdiçar oportunidades num mundo que, mais do que nunca, requer mão de obra qualificada e especialização técnica.
O ensino técnico e profissionalizante, como este jornal não cansa de sublinhar, significa pavimentar o caminho de jovens e futuros profissionais – e, consequentemente, o País – para melhores oportunidades. É o mais ancorado à atual revolução tecnológica que virou o setor produtivo do avesso. Reduz desigualdades, eleva os salários de quem traz no currículo a formação técnica e empurra a economia para a frente ao melhorar a produção e a competitividade, como informam as boas experiências dos países ricos. Há tempos países como Alemanha e Suíça adotaram o que especialistas chamam de “sistema de aprendizagem”, no qual a educação se desenvolve de forma articulada com o trabalho.
O Brasil habituou-se, porém, a estigmatizá-lo como uma modalidade menor de ensino ou mera alternativa ao ensino universitário. Entre nós sempre imperaram o preconceito contra o ensino técnico e a cultura bacharelesca. O próprio MEC historicamente glorificou os diplomas universitários, não raro ajudando a difundir a ideia de que sucesso é ter esse certificado. Sem esquecer os efeitos danosos das correntes marxistas – que, durante muitos anos, dominaram o pensamento acadêmico brasileiro – segundo as quais a formação técnica não passa de um mecanismo burguês para manter a alienação das massas trabalhadoras. E assim se criou uma falsa dicotomia que associa formação acadêmica a ofícios intelectuais e a formação técnica a trabalhos braçais. Se já era duvidosa no século passado, no século da revolução industrial 4.0 se torna ainda mais anacrônica.
Comentário nosso – Para se ter uma ideia de como estamos atrasados nesta questão, bastam os números. No Brasil apenas “13,1% dos estudantes de ensino médio (estão) cursando o ensino técnico”. “É muito pouco diante das evidências de que a educação profissional e tecnológica configura um dos principais investimentos de países ricos em seus sistemas de ensino“. “A média, por exemplo, dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade conhecida como o “clube dos países desenvolvidos”, é de cerca de 40%. Há países, como Alemanha e Finlândia, que exibem números ainda maiores: 49% e 68%, respectivamente“. Infelizmente o Brasil é o país dos acadêmicos para os quais os deplomas de curso superior são tudo, embora milhões deles estejam desempregados ou ou trabalhando em atividades que não têm nada a ver com a sua formação acadêmica, enquanto há milhões de formados em cursos técnicos empregados com salários até superiores ao de formados em faculdade. (LGLM)