A trajetória do ‘caçador de marajás’ até a prisão é uma espécie de inventário das mazelas políticas brasileiras, mas também serve para mostrar a força institucional do País

Primeiro, às mazelas. Collor foi condenado em maio de 2023 a oito anos e dez meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no âmbito da Operação Lava Jato. Na ocasião, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou que, entre 2010 e 2014, Collor usou sua influência sobre a presidência e a diretoria da BR Distribuidora, então subsidiária da Petrobras, para direcionar contratos de construção de bases de distribuição de combustíveis para a UTC Engenharia em troca de propina. O caso, portanto, ilustra com perfeição como as numerosas estatais do País são vulneráveis aos mercadores da política, que cavoucam cargos, oportunidades e contratos para se locupletarem.
Collor era apenas um dos tantos usufrutuários do monstruoso escândalo do petrolão, que foi a dilapidação da Petrobras pelos governos petistas de Lula da Silva e Dilma Rousseff. Com isso, acabou se associando à corrupção do PT, o partido que ele mesmo combateu com denodo ao se tornar presidente, em 1989, derrotando Lula da Silva no segundo turno.
Não é a única ironia da trajetória de Collor, que foi afastado da Presidência em meio a um escândalo de corrupção depois de ter chegado ao poder prometendo moralizar a vida pública e caçar os “marajás” do Estado. Como este jornal sublinhou à época, Collor traiu os brasileiros que acreditaram em suas promessas de prosperidade e honestidade no trato da coisa pública, e “renunciou não em aras da Pátria, mas pensando no seu futuro político pessoal”, desejando que, “em breve ou a médio prazo, seus malfeitos sejam esquecidos e ele possa voltar ao cenário político”.
O vaticínio do Estadão foi certeiro: o alívio viria dois anos depois, quando o STF o inocentou da acusação de corrupção passiva, e logo o ex-presidente voltaria à ribalta política. Não se encerraram ali, entretanto, os problemas de Collor com a Justiça. Durante as três décadas seguintes, ele continuamente enfrentou processos criminais – e saiu-se livre de todos eles, elegendo-se senador em 2006. Foi nessa condição, e fazendo parte da base de “aliados” de Lula e Dilma, que Collor manteve seus tentáculos políticos destinados à obtenção de dividendos, vamos chamar assim, singulares. Segundo a denúncia que o levou à condenação, o ex-presidente recebeu R$ 20 milhões em propina, dinheiro que supostamente “apareceu” do nada em sua conta, enquanto ele dizia não fazer “a menor ideia” de sua origem, de acordo com entrevistas que concedeu durante o processo.
Mas nem tudo nessa história são mazelas. Collor, afinal, está preso, depois de um processo em que teve amplo direito de defesa. Isso significa que as barreiras republicanas erguidas pela Constituição de 1988 estão em vigor e, bem ou mal, funcionam. No caso de Collor, aliás, isso já havia ficado claro logo no primeiro teste da Constituição recém-promulgada, com seu processo de impeachment. O Congresso, estimulado pelas manifestações de cidadãos indignados nas ruas, abreviou o mandato de quem estava transformando a Presidência em balcão de negócios escusos. Tudo dentro da lei.
Ademais, as reinações lulopetistas (e colloridas) levaram o Congresso a aprovar, em 2016, uma lei para pôr cobro à exploração política (e pecuniária) das empresas estatais. Trata-se de um avanço gigantesco, que se mantém mesmo diante de manobras espertas dos petistas para enfraquecê-la.
Collor estará preso até decisão definitiva do plenário do STF. Seja qual for seu destino, no entanto, o Brasil sairá melhor.