A reforma do Código Civil é desastrosa (confira comentário nosso)

By | 28/04/2025 8:19 am

A título de modernizar a legislação, o projeto ora em tramitação não é apenas falho, mas prejudicial ao País. Aumenta a insegurança jurídica, a litigiosidade, o arbítrio e o custo Brasil

 

Imagem ex-librisTramita no Senado o projeto de lei de reforma do Código Civil (CC) – o PL 4/2025 – que, sob o pretexto de modernizar a legislação civil e adaptá-la à realidade do século 21, é um completo retrocesso civil e democrático. De autoria de uma comissão de juristas e apresentada pelo senador Rodrigo Pacheco, a proposta é extensa. Prevê a alteração de 1.197 artigos do CC, o que representa mais mudanças do que aquelas realizadas entre o CC de 1916 e o de 2002. No entanto, mais extensos e profundos são também seus problemas de forma e de conteúdo.

Chama a atenção no PL 4/2025, em primeiro lugar, o excesso de linguagem indeterminada, transferindo na prática o poder de legislar – isto é, de determinar o conteúdo das normas jurídicas – aos juízes. A má redação dos artigos não é mera falha técnica, o que já seria inescusável em uma alteração da lei fundamental das relações privadas, mas produz um verdadeiro déficit democrático. Se a proposta em tramitação for aprovada, os critérios decisórios do marco jurídico civil, que em tese deveriam ser estabelecidos pelo Legislativo – pois esse é o modo de funcionamento de um regime democrático –, passarão a ser arbitrados por cada intérprete da lei, o que fere a própria ideia de Estado Democrático de Direito.

Como este jornal sempre defendeu, a República é um regime de leis. E o mesmo se deve dizer da democracia: o regime democrático é uma democracia de direito. Não existe democracia do arbítrio, ou no arbítrio. Por isso, o Direito não pode se dar ao luxo de ser inseguro, destituído de critérios previamente cognoscíveis que orientem a aplicação de suas regras. Os cidadãos devem saber o que esperar das normas legais. Sem regras aplicáveis segundo critérios anteriormente estabelecidos, não há democracia. Há o arbítrio da subjetividade – e isso é o que, infelizmente, faz o PL 4/2025, ao multiplicar os conceitos indeterminados.

O texto diz, por exemplo, que “a cláusula contratual que violar a função social do contrato é nula de pleno direito”. Ora, tal previsão significa instaurar, de forma solene e intencional, um novo ciclo de incertezas e de litígios, do que com toda a certeza o País não necessita agora.

Segundo levantamento do professor Paulo Doron de Araujo, o PL 4/2025 aumenta em 450% as referências à função social do contrato e da propriedade. Trata-se de um sintoma, entre tantos outros, de um perverso e disfuncional populismo jurídico. Promete-se proteger os setores vulneráveis da população e combater as “elites” e as empresas, sendo que o resultado é a difusão sistêmica de velhos e novos danos: aumento da insegurança jurídica, da litigiosidade, do arbítrio e do custo Brasil.

Outro grave problema do PL 4/2025 é a confusão entre o CC e o direito do consumidor. A ter em conta alguns dispositivos da proposta, parece que o País não dispõe de um Código de Defesa do Consumidor e de que seria preciso incluir normas próprias desse regime no CC, em uma nova ampliação de hipóteses de intervenção judicial dos contratos, gerando, consequentemente, mais insegurança.

O campo da responsabilidade civil é outra seara na qual o PL 4/2025 expressa seu furor populista e retrógrado. Em vez de reparar o dano ilícito – como sempre foi –, o dever de indenizar ganhará novas funções, como punir, prevenir, educar e socializar o risco. São mais de 100 novas regras sobre o tema, alterando os atuais 28 artigos.

Não há como salvar esse projeto de reforma do CC. Ele não é apenas falho, mas prejudicial ao País. Não vem construir a partir do que já se tem, mas destruir o que foi arduamente estabelecido e que ainda está em processo de estabilização. Diante das severas críticas recebidas, a comissão autora da proposta tem dito que a maior parte das mudanças baseia-se na jurisprudência. Talvez aqui esteja o principal problema. Não entenderam a função da lei numa democracia. Em vez de ser a lei a prover critério seguro à sociedade e ao Judiciário, querem escrevê-la a partir de uma miríade de decisões contraditórias. Não é de estranhar que o texto tenha ficado do jeito que está.

Comentário nosso– Não vamos, por enquanto, entrar na discussão, até por que não conhecemos o projeto. Mas vale a pena, para todos nós cidadãos, acompanhar esta discussão, pois o assunto é muito importante. (LGLM)

Category: Blog

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde 09 de março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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