A estrela fica

By | 18/04/2015 7:34 pm

(Demétrio Magnoli, colunista da Folha)

A prisão de João Vaccari simboliza a “prisão preventiva do próprio PT”, declarou Aécio Neves, do PSDB, secundado pelo deputado Rubens Bueno, líder do PPS, para quem o episódio “representa o PT na cadeia”. Mais prático, o senador Ronaldo Caiado, líder do DEM, sugeriu que os desdobramentos poderiam resultar na perda do registro partidário do PT. A ideia de eliminação do PT, evocada pioneiramente por Jorge Bornhausen, do antigo PFL, em 2005, encontra eco entre setores dos manifestantes do 15 de março e do 12 de abril. Nessas circunstâncias, o dever de ensinar aos exterministas como funciona uma democracia não pode ser terceirizado ao próprio PT.

As condenações de José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares, bem como a prisão preventiva de Vaccari, evidenciam que, no núcleo dirigente do PT, incrustou-se uma organização criminosa. A se julgar pelas receitas da empresa de consultoria de Dirceu e pelas movimentações bancárias da família Vaccari, a corrupção tradicional, essa “velha senhora” (Dilma Rousseff), está entre as atividades da quadrilha. O seu foco, porém, é a corrupção de novo tipo, “netinha peralta da velha senhora” (Roberto Romano), destinada a cristalizar um bloco de poder. Mas nada disso autoriza a impressão de um carimbo policial na estrela do PT.

O PT não se confunde com a organização criminosa nele incrustada. O partido, semeado no chão da luta contra a ditadura militar, não é uma sigla de conveniência como as criadas por Gilberto Kassab, o despachante do Planalto para negócios cartoriais. É sua militância e sua base de filiados, responsável por eleições internas que mobilizam centenas de milhares de cidadãos. É, sobretudo, sua base eleitoral, constituída por vários milhões de brasileiros. O PT é parte do que somos.

Sibá Machado, líder petista no Senado, classificou como “política” a prisão de Vaccari. Os políticos presos do PT ergueram os punhos para declarar-se prisioneiros políticos. André Vargas repetiu o gesto no Congresso, diante de Joaquim Barbosa, para dizer que o PT não reconhece a legitimidade do STF. O Partido cindiu o país em “nós” e “eles”, reproduzindo no plano da linguagem o que fazem, por meios policiais, regimes autoritários de esquerda. O Partido celebra tiranias, aplaude violações de direitos políticos em Cuba e na Venezuela, clama pela limitação da liberdade de imprensa no Brasil, fabrica listas negras de críticos, qualificando-os como “inimigos da pátria”. Mas a aversão petista ao equilíbrio de poderes e à pluralidade política não justifica o erro simétrico, que é crismar o PT como “inimigo da pátria”.

Na mensagem ao 5º Congresso Nacional do PT, a direção partidária interpreta o “sentimento antipetista” como reação conservadora “às ações políticas de inclusão social” dos governos Lula e Dilma. Vendando os olhos dos militantes, embalando-os numa ilusão complacente, os dirigentes postergam uma difícil, mas inevitável, revisão crítica. De fato, o “sentimento antipetista” expressa a vontade de evitar a identificação entre Estado e Partido. Já a manipulação exterminista desse sentimento não passa de uma cópia invertida do desejo petista de anular o direito à divergência.

No Palácio, o PT perdeu o patrimônio moral indispensável para defender a democracia. Hoje, triste ironia, são os críticos do PT que podem desempenhar o papel de advogados da sua existência como ator legítimo. Pedir o impeachment da presidente, por bons ou maus motivos, não atenta contra a ordem democrática. Sobram razões para gritar por um governo sem o PT, algo que serviria tanto ao Brasil quanto ao PT, que só na planície será capaz de entender as virtudes do pluralismo político. Por outro lado, cultivar a ideia da supressão do PT revela o impulso autoritário de amputar nossa história.

Vaccari é caso de polícia; o PT, não. A estrela fica.

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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