Tributaristas dizem que dinheiro de Cunha deveria ter sido declarado (com comentário)

By | 08/11/2015 4:30 am

(G1)

Especialistas em direito tributário escutados pela TV Globo afirmaram neste sábado (7) considerar que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), precisaria ter declarado os valores acumulados em contas na Suíça, mesmo tendo sido os recursos obtidos no exterior e mantidos em contas no exterior.

Cunha reafirmou nesta sexta-feira (6), em entrevista ao G1 e à TV Globo, que não tem contas bancárias nem é proprietário, acionista ou cotista de empresas no exterior. Ele admite, porém, ser “usufrutuário” de ativos mantidos na Suíça. Os valores, segundo Cunha, não foram declarados à Receita Federal e nem ao Banco Central.

O parlamentar diz ter um contrato com um truste proprietário de recursos “de origem antiga” que ele acumulou no exterior nos anos 1980. Um truste é uma entidade legal que administra propriedades e bens em nome de um ou mais beneficiários mediante outorga.

O professor de direito tributário da Universidade de São Paulo (USP) Fernando Zilveti disse considerar que Cunha precisaria ter declarado o dinheiro à Receita Federal no Brasil, mesmo em se tratando de contrato com um truste.

“Neste caso, ele é dono do dinheiro, porque ele tem um truste revogável, em que ele é beneficiário econômico, ou seja, ele é aquele que usufrui dos benefícios econômicos. Ele é o beneficiário efetivo na visão da Receita Federal do Brasil. Ou seja, ele deveria declarar este valor na sua declaração de bens anualmente”, explicou.
O tributarista e professor da Fundação Getúlio Vargas Ary Oswaldo Mattos Filho afirma que a legislação brasileira segue um sistema que tem base mundial. Segundo ele, não importa se a pessoa ganhou dinheiro dentro ou fora do país. Ele explica que é preciso declarar às autoridades brasileiras mesmo que sobre esse dinheiro não seja necessário pagar imposto.

“O ato de seguir o caminho do dinheiro produz uma série de documentos, uma série de contratos. Então, agora, provavelmente, ele [Cunha] vai mostrar esses contratos na medida em que ele queira alegar legitimidade do dinheiro que chegou lá, muito embora não declarado aqui entre nós, o que ele deveria ter feito”, explica Mattos Filho.
O professor de direito financeiro da USP Heleno Torres considera que o caso de Cunha representa uma situação particular no Brasil devido ao fato de não haver legislação sobre trustes no país. No entanto, ele acredita que o beneficiário de dinheiro administrado por esse tipo de entidade precisa declarar o valor recebido na declaração de Imposto de Renda.
“A partir da Constituição do truste, o truste em si está no exterior, então, ele não tem o dever de informar ao Brasil. Quem teria o dever de informar seria o beneficiário, quando do momento do recebimento, em face da declaração de Imposto de Renda”, explicou.
Na entrevista, Cunha  afirmou que não havia, na época da abertura das contas, uma legislação clara como a que se tem hoje sobre lucros no exterior ou sobre a obtenção de ganhos no exterior. “Não houve uma evasão de divisa, uma transferência de recursos do Brasil para lá, para ser utilizado. O que houve foram ganhos no exterior que não foram declarados aqui”, disse.
Ele, no entanto, admitiu que deveria ter sido declarada, com possível pagamento de impostos, a conta que está em nome de sua mulher, Claudia Cruz.
O especialista Heleno Torres também destacou que, em tese, a titularidade dos bens pertence ao administrador, no caso o truste, e não ao beneficiário.

“Este sujeito [truste] administra em favor de beneficiários. Esses beneficiários são pessoas que terão o direito a receber, segundo as regras do contrato, os valores que estão ali definidos. Então, é perfeitamente possível nós falarmos, em tese, que, de fato, a titularidade desses bens é do administrador e não de quem fez a seção dos bens para o truste.”

Crime de ordem tributária
Em relação a um eventual crime de ordem tributária, especialistas USP divergem ao analisar o caso de Cunha. Para o professor Fernando Zilveti, o parlamentar pode ter cometido crimes como sonegação fiscal e evasão de divisas e ao não declarar o dinheiro no Brasil.
“Ele cometeu crime contra a ordem tributária. Ele deveria declarar-se como beneficiário econômico do truste revogável de valor dois milhões, dois milhões de francos suíços, o valor que fosse. Essa é uma sonegação fiscal separada da questão do Banco Central. O presidente da Câmara deveria ter declarado esses valores à Receita e ao Banco Central. A circular do Banco Central obriga que você declare bens ou direitos em valor superior a US$ 100 mil”, disse Zilveti.
Heleno Torres, no entanto, afirma que é preciso cuidado para não “prejulgar a situação”. Segundo ele, o fato de o dinheiro ser administrado por um truste, que não tem regras específicas na legislação brasileira, dificulta a análise do caso.
“É preciso antes de tudo, junto ao governo de Estado de localização do truste, provar e desconstituir o truste naquela jurisdição para daí, sim, termos a imputação de eventuais efeitos […].  Nós não podemos, de nenhum modo, prejulgar a situação porque isso depende das leis dos países nos quais eles estão constituídos”, disse.
O professor de direito da FGV Thiago Bottino disse que os trustes contratados por Cunha podem esconder negócios fictícios.

“Se esses trustes, se essas empresas offshore, na verdade ficarem caracterizados apenas como fachadas para a posse desses recursos sem ter uma relação direta com o nome da pessoa, ou seja, tentando afastar a titularidade desses valores, se essa fraude for caracterizada, ainda assim você não vai ter a possibilidade de usar o argumento de que ‘ah, não era no  meu nome, então eu não preciso declarar’. Justamente porque seria uma tentativa de burlar essa obrigação”, disse o jurista.
Investigado em conselho e na Lava Jato
O presidente da Câmara responde a processo no Conselho de Ética da Casa, no qual é acusado de quebra de decoro parlamentar por ter supostamente mentido ao declarar à CPI da Petrobras que não tem contas fora do país. Ele informou neste sábado que deverá entregar defesa preliminar ao colegiado dentro de até duas semanas.
Ele também é investigado na Operação Lava Jato por corrupção e lavagem de dinheiro, devido à suspeita de ter recebido pelo menos US$ 5 milhões por contratos de aluguel de navios-sonda pela Petrobras.
Políticos comentaram neste sábado (5) a explicação do presidente da Câmara sobre contas no exterior. Membros do Conselho de Ética disseram receber as explicações do parlamentar com cautela.

Comentário do programaNão é nada cômoda a situação de Eduardo Cunha.  Se o Conselho de Ética desconsiderar a quebra do decoro parlamentar vai ficar patente o protecionismo em relação ao Presidente da Câmara. (LGLM)

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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