Como me tornei professor de Português no Colégio Estadual de Patos (1ª parte)

By | 30/07/2016 9:48 pm

(Publicado no Patos Online)

Há alguns anos, colegas meus Auditores Fiscais do Ministério do Trabalho com alguns Juízes do Trabalho do TRT, planejaram montar um curso de preparação para concursos em João Pessoa, e o Dr. Normando Salomão Leitão, juiz do Trabalho, sugeriu meu nome, para surpresa de colegas meus, como professor de Português. Diante da estranheza daqueles, Normando disse que aprendeu Português como aluno meu no Colégio Estadual de Patos. É uma história que começou há mais de cinquenta anos.

Em fins de 1960 (por coincidência num 24 de setembro, dia da Padroeira, Nossa Senhora da Guia) eu saí do Seminário de Cajazeiras e “voltei para casa”. Passei uns dias ajudando Padre Levi, meu vigário, na Matriz de Santo Antônio, mas, como não pensava mais em voltar para o seminário, resolvi procurar outro ”meio de vida”. Passei uns dias trabalhando no Foto Patos, de Sebastião Ramos, mas o serviço que me deram era montar molduras para espelhos e quadros de santos, trabalho meramente manual, que não me agradou. Meu pai era balconista do Armazém do Leão, armazém de estivas que à época funcionava em frente à Prefeitura, e eu comecei a “aparecer por lá”, ajudando a um e outro, até que fui “adotado” por Inácio do Leão, proprietário do estabelecimento. Já trabalhavam lá dois rapazes pouco mais velhos do que eu, Diraldo e Everaldo, filhos de um antigo funcionário que falecera. Meu pai fora contratado para substituí-lo e eu fui fazer o mesmo serviço que “os meninos” faziam. Ajudávamos no balcão, fazíamos pequenas entregas em bicicleta, íamos ao Banco fazer depósitos e pagamentos, acompanhávamos Zé do Leão, que dirigia uma camioneta (que tinha “um leãozinho na porta”) nas entregas. Zé do Leão era irmão do grande Chico Bocão, que à época ainda não era vereador. Como José não sabia ler, a gente ia com ele e um “chapeado” fazer as entregas. Quando chegávamos ao estabelecimento, nós íamos para cima da camioneta e, enquanto líamos as “notas de entregas”, íamos entregando as mercadorias mais “maneiras” para Inácio Só ou João Só, que levavam até o balcão da mercearia. José ajudava o “chapeado” a tirar os sacos de açúcar, arroz, feijão, milho ou café, latas de querosene ou volumes maiores, como engradados de Pitu, Serra Grande ou Paturi, as cachaças melhores da época.

Eu trabalhava das sete horas até o fechamento do armazém no final da tarde, com umas duas horas para ir almoçar. Estudava de noite, tendo cursado o primeiro ano cientifico em 1961 e 1962, pois adoecera no final de 1961 e perdera as provas finais. Em 1963, eu fazia o segundo ano científico. Os professores de Matemática e Física, geralmente, eram engenheiros do DNER, do DER ou do DNOCS. No segundo semestre daquele ano um destes professores passou a dar aula às cinco horas da tarde, pois viajava depois disso. Eu passei a sair um pouco antes das cinco horas da tarde para assistir a aula. Havia combinado isso com “seu” Pedro Virgínio, que era o gerente na época, mas entrou um gerente novo e disse que não permitia que eu saísse antes dos outros. Perdi a aula no primeiro dia, mas combinei com meu pai, que dava muito valor aos estudos, que eu não voltaria mais a trabalhar para não perder o ano. O gerente novo foi meu amigo até morrer.

No Colégio comentei com os colegas que deixara de trabalhar e contei o motivo. Alguns dias depois, um destes colegas, que era inspetor de alunos e depois de tornou professor de Educação Física e foi vice-diretor, José Luiz Neto, foi lá em casa num dia de manhã e disse que Padre Vieira queria falar comigo. No caminho ele me disse que Padre Vieira estava precisando de um professor de Português para os alunos do primário e que ele tinha indicado meu nome. Fui à diretoria, onde Padre Vieira me fez o convite. “Topei a parada” e me mandaram dar aulas no terceiro ano primário. A turma era de garotos na faixa dos dez anos, dos quais me lembro de Paulo de Tarso Menezes, de família protestante, o que lhe granjeou o apelido, pelo qual muitos até hoje o chamam, apesar de ter sido diretor eleito do colégio por vários anos: Paulo Bode. É meu amigo até hoje. Outros de que lembro eram George e Gilberto Pimentel, filhos de João Germano e dona Glorinha Pimentel. Por ironia do destino, Gilberto e eu somos avós de Júlia e Netinho. Gilberto morreu prematuramente e George, até onde sei, ainda é vivo.

Demorei pouco tempo, como professor do terceiro ano. Logo me promoveram a professor do “exame de admissão”. Uma das turmas que me deram, entretanto, era “barra pesada”. Quase todos mais velhos do que eu, me davam um trabalho danado: entre outras figuras das quais me lembro, Branco de Gerson, Ivaldo Silva, Zacarias de Evaristo, Larrimê Silva, e Benedito Nunes. Todos se tornaram cidadãos decentes. As outras turmas me davam menos trabalho. Depois de algum tempo, sabendo do trabalho que me dava aquela turma mais velha, Padre Vieira me chamou e disse: “Sei que os meninos desta turma lhe dão muito trabalho. É da idade. Um dos moleques piores que tive por aqui foi Olavo Nóbrega e hoje é um homem de vergonha”. E olhe que Olavo era seu adversário político, mas Padre Vieira lhe fez justiça. Entregou a turma “da pesada” a Roosevelt Vita e me deu uma turma feminina. Mas tinha umas meninas que não ficavam atrás da turma de que me substituíram: Adeilda Dias (irmã de Adilton), Guia Teódulo, entre outras. Mas estas pelo menos obedeciam com mais facilidade. Em 1964, continuei a ensinar Português aos que se preparavam para o “exame de admissão”. Era um quinto ano primário que preparava para o exame de admissão ao curso ginasial. Até aí, eu ensinava no Diocesano que funcionava no mesmo prédio do Colégio Estadual. O Diocesano pela manhã, atendia ao curso primário, do primeiro ao quinto ano (o exame de admissão). À tarde funcionava o Estadual, oferecendo o primeiro grau (1ª a 4ª série) e á noite, também pelo Estadual, funcionavam as três séries do curso científico, onde concluí o segundo grau em 1964. Em 1964 ou 1965, Padre Vieira criou uma turma de quinto ano primário (exame de admissão) noturno para aqueles que trabalhavam durante o dia. Neste curso, tive alunos bem mais velhos do que eu (funcionários da Rede Ferroviária). Também foram meus alunos alguns jogadores do Nacional, como Perequeté, Bastinho, Canário e Teixeirinha. Estes, apesar de adultos, não me davam trabalho. Eram muito interessados. O “grande Bastinho” depois virou professor de Educação Física, preparador físico, treinador e dirigente esportivo e foi um dos baluartes do Nacional, onde formou uma grande zaga com Petrônio, Ribamar e Perequeté.

Em 1965, Padre Vieira resolveu me promover para ensinar no Estadual. Fui contratado pelo Estado para ensinar Português, na primeira série ginasial. Ali ensinei até abril de 1967, quando deixei de ensinar para ir assumir um emprego no Banco do Brasil, na agência de Piancó. Das turmas em que ensinei, saíram muitos doutores que estão espalhados por este Brasil afora. Nem vou tentar enumerá-los para não cometer injustiças. Tem até quem enveredou pela política, como Dr. Júlio Lopes, ex-prefeito de Olho Dágua; Dr. Rui Pontes, ex-prefeito de Santa Terezinha; Dr. Renê Caroca, atual prefeito de São José de Espinharas. Enquanto ensinava no Estadual, continuei a dar aulas no Diocesano, até nos primeiros meses de 1967, quando este funcionou no novo prédio no Belo Horizonte. Nestes primeiros meses do Diocesano novo, eu ajudava na disciplina, dava aulas e era secretário da diretoria comandada por Padre Raimundo Luciano Correia Lima de Menezes e que tinha como tesoureiro José Nestor de Alcântara Gondim.  Deixei o Diocesano também quando fui trabalhar em Piancó. (LGLM)

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

9 thoughts on “Como me tornei professor de Português no Colégio Estadual de Patos (1ª parte)

  1. Terezinha Paulo

    Foi muito bom ter conhecido à sua história. Ficava perguntando se temos quase à mesma idade como pode ser meu professor ?
    Para me é um orgulho ter sido sua aluna .Que Deus te abençoe grandemente. Um forte abraço.

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  2. Luiz Gonzaga Lima de Morais

    Muito obrigado. Comecei a ensinar no Diocesano com dezessete anos e no Estadual com dezenove.

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  3. Ataimar Nóbrega Lucena

    História bonita e vitoriosa. Parabéns Luiz Gonzaga Lima de Morais!

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  4. José Maria Rodrigues De Lima Rodrigues

    Fui seu aluno, acredito que por dois ou três anos. Um abraço!

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  5. Bruno Morais

    Estou ansioso pela segunda parte da história, apesar de ter em mente os contornos, nunca ouvi com tantos detalhes.

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  6. Vanda Torres Barreto.

    Foi bom ler tua história e relembrar um passado que acompanhei de perto.Lembrei-me do período que estiveste doente e da tua temporada como professor. Quando fiz exame de admissão naquela época tinha prova oral de Português e fiz essa prova contigo. Você mencionou o nome do professor Roosevelt Vitta, ele foi meu professr de Ciências e estudei com o irmão dele Marconi Vitta.Nunca mais tive noticias desse pessoal.
    Meu primo foi bom ter entrado em contato contigo.Um abraco,Vanda.

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    1. Luiz Gonzaga Lima de Morais Post author

      Roosevelt é advogado renomado em João Pessoa, é suplente de senador do PMDB.Não sei se Marconi ainda é vivo, pois um dos irmãos de Roosevelt faleceu e tenho impressão que foi Marconi. Foi um prazer também Vanda.

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