Qual é sua turma?

By | 06/05/2017 11:40 pm

 

(Ruth de Aquino, colunista da revista Época)

Seria mais fácil se sua turma continuasse a mesma de tempos atrás. Mas o Brasil muda tanto que os guerreiros do povo petista passaram a se chamar Gilmar Mendes e Renan Calheiros. O ministro falante Mendes, do STF,  lidera a turma que quer soltar os réus da Lava Jato presos preventivamente, resistir à “pressão dos procuradores” e coibir os poderes dos juízes de Curitiba. O senador Renan, ruidoso e espaçoso, lidera no Congresso os rebelados contra as reformas trabalhista e previdenciária. Cita-se até o nome de Renan para presidir o PT. Deve ser maldade.

A Lava Jato já está em sua 40ª fase. Começou em março de 2014 e continua a expor as vísceras de uma imensa organização criminosa de corrupção e propina no sistema político. Vende-se tudo, em especial a consciência. O cidadão comum aprende que, mesmo no Supremo Tribunal Federal, as decisões finais sobre o destino dos criminosos dependem da turma. Uns magistrados são mais iguais que outros. Mais vaidosos? “A verdade é que ninguém quer ser ‘backing vocal’ nesse caso”, disse o ministro da Transparência, Torquato Jardim.

A Segunda Turma tem uma trinca de juízes – Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski – a favor de deixar livres os acusados, com ou sem tornozeleira, até a condenação em segunda instância. Eles acham que as prisões preventivas têm se alongado demais, mesmo sem contrariar o Direito. Os outros dois juízes da Segunda Turma, o decano Celso de Mello e o relator Edson Fachin, preferem não conceder habeas corpus a políticos que, fora da prisão, podem prejudicar as investigações em Curitiba e no resto do país.

De todas as libertações mais recentes, a que mais sacudiu o Brasil foi a do “enfant terrible” José Dirceu, ex-ministro de Lula que já viveu na clandestinidade, condenado e anistiado no mensalão, condenado a 32 anos de prisão na Lava Jato e nunca propenso a se tornar delator. Dirceu está com tornozeleira, mas não em prisão domiciliar. Estava preso havia um ano e nove meses, à espera do julgamento de um recurso.

Guerreiro do povo brasileiro, assim se referem a Dirceu os petistas que colocam o partido acima de todas as acusações. No jornal O Estado de S. Paulo, uma carta de Dirceu compara seus delatores a “cachorros da ditadura”. Seu primeiro pedido de refeição, já solto, em casa, foi simbólico: uma pizza.

Esse é o maior temor do brasileiro honesto. Que tudo acabe em pizza. Que a Lava Jato não consiga moralizar a política, disciplinar o Congresso, mudar a cultura do toma lá dá cá, impedir que representantes do povo roubem da educação, da saúde, da segurança e das prioridades de um país carente. Segundo pesquisa do Datafolha, 44% dos brasileiros apostam que a corrupção continuará igual, 7% que vai crescer e 45% acreditam em redução do crime. Mais da metade é pessimista.

O procurador do Ministério Público Federal Carlos Fernando dos Santos Lima defende a manutenção das prisões preventivas como instrumento para dissuadir assaltantes ativos em plena Lava Jato: “Enquanto não houver respeito a uma investigação em andamento, é necessário que o Poder Judiciário demonstre firmeza com as prisões, porque somente assim nós poderemos deter essa organização criminosa”. Propinas eram pagas ainda em junho do ano passado, com a Lava Jato completando sua 30ª fase. É muita cara de pau e crença na impunidade.

Por lentidão da Justiça, por corporativismo dos Três Poderes – à revelia da presidente do STF, Cármen Lúcia – ou até por conluio de alguns juízes e réus, a Lava Jato corre o risco de ser torpedeada. Um a um, os réus podem ser libertados até a prescrição dos crimes. Sem confiscar bens para recuperar os bilhões roubados, sem multar as empreiteiras, sem manter presos os ladrões, o que esperar para o futuro do Brasil? Um populista de esquerda ou de direita manipulando a massa com palavras de ordem e negociando com um Congresso venal?

As libertações animaram o ex-ministro Antonio Palocci a pedir habeas corpus. Se Dirceu saiu, por que não ele, que nem julgado foi? Além de tudo, Palocci, preso há sete meses, se prontificou a delatar nomes, endereços, valores, dando a Moro “mais um ano de trabalho”. Talvez Palocci tenha se precipitado ao dispensar o advogado especialista em delação premiada. Confiou. Sua turma era a Segunda do STF, com Gilmar Mendes à frente. Mas sua liberdade foi temporariamente barrada por Fachin. O relator enviou o caso ao plenário do STF. Os 11 ministros do Supremo – e não apenas cinco – decidirão se Palocci encomendará pizza em casa.

O Supremo tem um papel decisivo no resgate moral do Brasil. Gilmar Mendes disse que seu voto para libertar Dirceu foi “histórico”. A História cobrará do STF ao menos coerência.

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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