A conta já chegou

By | 04/06/2017 7:58 am

 

(Fernando Dantas, consultor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas)

O presidente Michel Temer e seu ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, comemoraram como vitória em final de campeonato o resultado positivo do PIB do primeiro trimestre, que representaria o fim da maior recessão em um século.

 

Na verdade, porém, há dúvidas até se o número do PIB do primeiro trimestre justifica uma comemoração de gol no início de jogo. Excetuando-se o excepcional desempenho da agropecuária, um setor que equivale a apenas 5,5% do PIB, não houve quase nada de muito bom no desempenho da economia brasileira de janeiro a março. Além disso, diversos analistas têm projeções negativas para o segundo trimestre. As previsões para o ano não são nada animadoras, e surgem dúvidas sobre se 2018 será muito melhor.

 

É bom lembrar que o primeiro trimestre, cujo PIB foi divulgado ontem, terminou bem antes do choque na economia provocado pelo escândalo político da gravação da conversa de Temer com Joesley Batista, da JBS. Com a revelação, o cenário político mudou inteiramente da noite para o dia, e agora as chances de aprovação da reforma da Previdência são consideradas pequenas.

 

Isso significa que o plano que o Brasil tinha para resolver no médio e longo prazo o problema das contas públicas que não fecham e da dívida que dispara foram abandonados até segunda ordem. O efeito é igual ao que atinge qualquer devedor cujo crédito se torna mais duvidoso: os juros sobem. Foi isso que ocorreu com a chamada “curva dos juros”, que combina as taxas para diferentes prazos e antecipa a trajetória da Selic, o juro básico de curtíssimo prazo fixado pelo Banco Central (BC).

 

Com o sumiço da reforma da Previdência do mapa, a curva de juros subiu.

Por um lado, esse fato indica que o mercado antecipa agora que a Selic, que o BC vem baixando para reanimar a economia e porque a inflação caiu, vai cair mais devagar e menos. Por outro lado, a elevação da curva significa que já neste momento empresas e cidadãos brasileiros estão pagando mais juros para tomar emprestado, especialmente em prazos médios e longos. Agora mesmo, portanto, a perspectiva de não realização da reforma da Previdência está contribuindo para frear a economia, desempregar as pessoas e aumentar a pobreza.

 

Anteontem foi a vez de o Banco Central ratificar o que o mercado já projetava.

De fato, as incertezas muito ampliadas sobre as reformas vão fazer com que o juro caia mais devagar e, provavelmente, caia menos. Essa confirmação se deu no âmbito da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) nessa quarta-feira de cortar em um ponto porcentual (pp) a Selic, para 10,25%.

 

O corte foi dentro do esperado. Se não houvesse o escândalo da gravação, talvez pudesse ter sido de 1,25 pp, mas a diferença é pequena. O sinal amarelo veio no comunicado da decisão, em que o BC avisou que provavelmente vai reduzir o ritmo do corte para 0,75 pp na próxima reunião do Copom em julho, e em que ressaltou como a possibilidade de que não haja reformas aumenta o nível de juro ao qual se vai chegar ao fim do atual ciclo de baixa da Selic.

 

O BC evidentemente não fez isso porque seja cruel e queira beneficiar banqueiros, como dita a fantasia de alguns. Assim como ocorre com pessoas e empresas que são maus devedores, também os governos pagam mais juros quando piora a qualidade do seu crédito. Como o setor público brasileiro é o grande tomador de empréstimo da economia, ele puxa para cima os juros pagos por todo mundo. Se for contra essa maré, o BC só vai colher inflação.

 

Sem reforma da Previdência, o Estado brasileiro está estruturalmente quebrado, embora ainda tenha condição por mais algum tempo de rolar sua dívida sem provocar inflação e ir tocando com a barriga. O custo, porém, é manter o Brasil entre os campeões mundiais do juro alto, atrapalhando a retomada no presente e deprimindo o ritmo de crescimento no futuro.

(+) Comentário do programa – Muito mais efetivo e de resultados mais rápidos seria cobrar das empresas que vivem inadimplentes com a Previdência Social e punir as fraudes que se cometem contra o sistema. (LGLM)

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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