(Mateus Coutinho, na Época desta semana)
“Vai lá no jantar hoje?”. O convite feito às pressas na noite de quarta-feira, dia 5, partia do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM). O destinatário era o deputado mineiro Júlio Delgado, um dos expoentes do PSB na oposição ao governo Temer. Delgado afirmou que não poderia naquele horário, às 20h30, ao que Maia insistiu: “passa lá mais tarde, vai às 22h30, vai às 23h”. Delgado brincou: “Poxa, é muito tarde, não sou o Joesley para você me receber neste horário”.
Passava pouco das 19h e, como vem fazendo nos últimos dias, Maia passou brevemente pelo plenário da Casa que comanda. Não deu nem tempo de sentar na cadeira de presidente. Ele logo deixou o local para, antes de ciceronear deputados de vários partidos na residência oficial, fazer um agrado no gabinete da liderança do PSB. Ali, o compromisso era um parabéns-a-você para Tereza Cristina, do Mato Grosso do Sul, parlamentar em primeiro mandato. Mas ela é líder da bancada do PSB, a sexta maior da Câmara, com 37 deputados.
O périplo no discreto evento, que tinha apenas 15 deputados, foi mais um corpo a corpo de Maia. Ele parece estar em campanha: vem se movimentando intensamente nos bastidores do colégio eleitoral que escolherá o substituto de Temer, caso a Câmara aprove o prosseguimento da ação penal contra o presidente e o Supremo Tribunal Federal não a rechace.
A residência do presidente da Câmara já foi palco de jantares que receberam dezenas de deputados de todos os matizes ideológicos na segunda e na terça-feira passadas.
Oficialmente, os assuntos que foram tratados eram sempre pautas da Câmara, como a reforma política e a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias, necessária para que haja o recesso de julho. Na boca dos parlamentares, porém, eram recorrentes conversas sobre a possibilidade cada vez mais concreta de Maia assumir a Presidência da República.
De perfil discreto, Maia sempre foi fiel ao governo Temer. Com o acirramento da crise política, ele e seu partido vem reiterando que Maia está seguindo seu papel institucional à risca, sem interferir contra ou a favor do governo no andamento dos trabalhos do parlamento. Os sinais de seu interesse em migrar para o Palácio do Planalto, contudo, têm se intensificado e chamado a atenção até da oposição, que não esconde que vem recebendo mais atenção de Maia.
A articulação nessas duas frentes tem refletido na própria agenda e na postura do presidente da Câmara. Na manhã de quarta-feira mesmo, por exemplo, ele evitou sentar na cabeceira da mesa onde foi realizada a reunião de líderes da Casa. À tarde, foi ao Palácio do Planalto se encontrar com Temer, agenda que também cumpriu na segunda. Diferentemente do que aconteceu com Temer e a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) às vésperas do impeachment, o presidente e Maia têm mantido o diálogo e a relação cordial de aliados nos encontros, que se mantêm constantes.
A postura de Maia, de que está cumprindo seu papel institucional na condução da Câmara, é uma estratégia para deixar o governo e sua base sangrarem sozinhos, sem que cole em si a pecha de traidor. A nomeação na terça-feira de Sérgio Zveiter, do PMDB do Rio, para relatar a denúncia contra Temer na Comissão de Constituição e Justiça também fez parte dessa estratégia. Partiu do próprio Maia o pedido para que o presidente da comissão, o peemedebista Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), não escolhesse nenhum nome do DEM para relatar o caso, já que isso poderia dar a impressão de uma articulação explícita de Maia contra Temer
Com isso, foi mais fácil para o DEM atribuir a escolha do “independente” Zveiter a uma disputa interna do próprio PMDB. Antigo conhecido de Maia no Rio e amigo do ministro dos Esportes, Leonardo Picciani, expoente da bancada carioca da sigla, Zveiter era o terceiro nome na preferência da bancada do PMDB na Câmara, liderada pelo paulista Baleia Rossi, fiel escudeiro de Temer. Sua escolha acabou causando mal-estar na parte da bancada ligada ao grupo mais fiel ao governo. No mesmo dia, Zveiter marcou presença no jantar na casa de Maia.
Neste meio tempo, a prisão do ex-ministro e um dos interlocutores mais próximos de Temer, Geddel Vieira Lima, e a expectativa de que o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB), preso em Curitiba, feche um acordo de delação, reforçando ainda mais as acusações contra Temer, derreteram a base do governo durante a semana.
Os próprios aliados do peemedebista admitem a derrota na CCJ por um placar de cerca de 40 votos favoráveis à denúncia. Em sua tentativa de reação, o presidente Temer convocou uma reunião com seus 22 ministros na tarde de quarta e, em um ato falho político, segundo um veterano do Congresso, chegou a admitir hipoteticamente que será derrotado na Câmara, mas que o Supremo Tribunal Federal o inocentará.
Na quinta-feira, foi a vez de o presidente interino do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), afirmar que Maia “tem condições” de conduzir a transição do país até 2018, em uma rara indicação de posicionamento da sigla, que tem se dividido entre os deputados mais jovens contrários a Temer e os caciques mais velhos preocupados em articular uma aliança com o governo pela estabilidade.
O peso de Temer começa a sobrecarregar até os mais resilientes governistas, como o DEM. Nesse cenário, Maia pisa leve e garimpa apoios em legendas como o PCdo B e PDT, de olho no Palácio do Planalto.
Comentário do programa – Figura quase desconhecida até a queda de Eduardo Cunha, quando terminou assumindo a presidência da Câmara Federal, Rodrigo Maia é visto hoje como opção para assumir a Presidência da República num eventual afastamento de Michel Temer. Se a Câmara aprovar um processo contra Michel Temer, pelo Supremo Tribunal Federal, o presidente é afastado e Rodrigo Maia assume a presidência da República até que termine o julgamento de Temer. Se Temer for condenado, Rodrigo Maia continua a na Presidência da República até que o Congresso eleja um presidente para completar o mandato da dupla Dilma/Temer. E Rodrigo Maia é visto como uma opção de candidato para terminar o mandato da dupla infeliz. É esse o sentido da Articulação de Maia que está incomodando Michel Temer e seus apaniguados. Por enquanto Rodrigo não fede nem cheira e é aí que mora o perigo para um Michel Temer à beira do túmulo político. (LGLM)