Patrimônio imaterial do Brasil, literatura de cordel ajuda cidadão a compreender leis

By | 30/09/2018 5:09 am

 

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional incluiu a literatura de cordel na lista de patrimônio imaterial do Brasil. É uma forma de valorização e proteção dos saberes, ofícios e formas de expressão coletiva

(Agência  Câmara Notícias)

 

Mais novo patrimônio imaterial do Brasil, a literatura de cordel tem sido instrumento de conscientização e cidadania na difusão de propostas aprovadas na Câmara dos Deputados. Versos populares – em sextilhas, martelo agalopado, meia quadra ou em outras métricas – já ajudaram, por exemplo, a popularizar a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06).

 

O cordelista cearense Tião Simpatia usou essa arte para divulgar os principais pontos da lei de combate à violência contra a mulher:

“Segundo o artigo quinto, esses tipos de violência / Dão-se em diversos âmbitos. / Porém, é na residência / Que a violência doméstica tem sua maior incidência. / E quem pode ser enquadrado como agente agressor? / Marido ou companheiro, namorado ou ex-amor. / No caso de uma doméstica, pode ser o empregador.”

 

A tramitação da proposta de emenda à Constituição (PEC 478/10) que reconheceu uma série de direitos trabalhistas para as domésticas também mereceu versos em forma de cordel:

“Ser doméstica, ninguém sabe, / Mas não é fácil esse papel, não. / Doméstica tem que sonhar”.

 

Tradição
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) incluiu, no último dia 13 de setembro, a literatura de cordel na lista de patrimônio imaterial do Brasil. É uma forma de valorização e proteção dos saberes, ofícios e formas de expressão coletiva.

Integrante da Comissão de Cultura da Câmara, o deputado Tadeu Alencar (PSB-PE), elogiou a iniciativa. “A cultura dos trovadores da Europa medieval se transfere para o Nordeste ressequido de uma maneira muita aclimatada a uma gente simples, que não teve oportunidade da cultura clássica e acadêmica. É uma grande homenagem à cultura popular, à alma brasileira”, declarou.

 

A tradição europeia de contos populares rimados – impressos em papel simples e pendurados em cordas para venda – se enraizou no Nordeste brasileiro ainda no século 19. O paraibano Leandro Gomes de Barros e o sergipano João Martins de Athayde estão entre os pioneiros.

 

Desde 1988, a Academia Brasileira de Literatura de Cordel, sediada no Rio de Janeiro, acompanha o amadurecimento dessa arte. O presidente da ABLC, o cearense Gonçalo Ferreira da Silva, afirma que a temática – antes restrita ao cotidiano nordestino e a personagens como Padre Cícero e o cangaceiro Lampião – tem sido atualizada, sem deixar a tradição de lado.

 

“Desde a chegada ao Brasil, com os colonizadores portugueses, a literatura de cordel começou um percurso lento, desorganizado e engatinhando. Ganhou um sabor brasileiro, nosso. A literatura de cordel abrange toda a área do conhecimento humano e os últimos acontecimentos de natureza política e social”, diz o presidente da ABLC.

 

Temas atuais
Em 2011, a Rádio Câmara entrevistou o cordelista João Firmino Cabral em pleno Mercado Popular de Aracaju (SE). Então com 71 anos de idade, ele falava, em forma de versos, das preocupações em torno das mudanças climáticas e da ação danosa do homem sobre a natureza, principalmente na Amazônia:

“Toda a Floresta Amazônica está muito devastada / Por madeireiros perversos e também muita queimada. / Os animais sumindo, as aves diminuindo / A vida está complicada. / Se os animais falassem, diriam aos predadores / Não matem nossos parentes, escutem nossos clamores. / Não sejam tão homicidas pois nós também temos vidas e também sentimos dores”.

 

Orgulhoso do ofício de cordelista, João Firmino Cabral ocupou a cadeira 36 da Academia Brasileira de Literatura de Cordel até sua morte, em fevereiro de 2013. Os livrinhos dele e de milhares de cordelistas continuam sendo vendidos em feiras, bancas de jornais e mercados populares.

 

A internet e as redes sociais – como o YouTube – também ajudam a manter essa arte centenária antenada com a atualidade. Em período eleitoral, por exemplo, o cordelista Hugo Tavares Dutra costuma entoar os versos de seu livrinho “Votar é um nó”, com referências à Lei da Ficha Limpa (LC 135/10):

“Ficha limpa, ficha suja: diz aí quem vai julgar / Quem é quem nesse processo desse nó que é votar. / Eleito e eleitor: quem é que vai decifrar / Quem é pedra ou vidraça nesse será que será”.

 

As profissões de cordelista e repentista estão regulamentadas desde 2010. A Lei 12.198/10 surgiu de uma proposta (PL 613/07) do deputado André de Paula (PSD-PE).

Comentário

Category: Nacionais

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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