A aula do ministro da Saúde

By | 23/04/2021 3:38 pm

Marcelo Queiroga afirmou que o País estaria melhor se a população seguisse protocolos sanitários. Ele poderia dizer isso ao chefe

23 de abril de 2021 | 03h00

O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse na terça-feira que o Brasil estaria numa situação bem melhor se a população estivesse seguindo os protocolos sanitários para conter a pandemia de covid-19. Queiroga deu essas declarações a integrantes da Confederação Nacional de Municípios, mas bem que poderia fazer essa mesma preleção para seu próprio chefe, o presidente Jair Bolsonaro.

“Se a população estivesse usando máscaras, mantendo o distanciamento, evitando aglomerações, se houvesse um programa de testagem mais adequado, isolamento de casos positivos e dos seus contactantes, se fizéssemos a disciplina dos transportes urbanos e para o funcionamento dos setores estratégicos, os senhores podem ter certeza de que não estaríamos vivendo o momento que estamos vivendo hoje”, explicou, didaticamente, o ministro Queiroga.

A declaração do ministro da Saúde prima pela obviedade. Desde o início da pandemia, lá se vai mais de um ano, já se sabe que a única forma de evitar a contaminação é manter a população em isolamento. Já se sabe também que o uso de máscaras é determinante para impedir a proliferação do vírus entre aqueles que, por um motivo ou outro, precisam sair de casa. Também é do conhecimento de todos, há muito tempo, que é preciso fazer testagem ampla e sistemática para identificar focos de contaminação e isolar os casos detectados.

Queiroga, convém recordar, é o quarto ministro da Saúde do governo Bolsonaro. Mais do que isso: é o quarto ministro dentro do período da pandemia, justamente quando era mais necessário um planejamento sólido do Ministério da Saúde para o enfrentamento da doença. Nada disso é possível quando, a cada troca de ministro, se trocam também os principais assessores e mudam as diretrizes.

Para piorar, sabe-se muito bem que Bolsonaro fez suas tantas mudanças no Ministério da Saúde não na tentativa de melhorar o trabalho da pasta, mas sim de subjugá-la a seus propósitos eleitoreiros e a suas extravagâncias pessoais. Descontente com ministros que defendiam medidas duras e impopulares para combater o vírus, o presidente preferiu dar ouvidos aos negacionistas que insistiam em minimizar a pandemia e não sossegou enquanto não encontrou um sabujo que lhe dedicasse integral vassalagem.

Esse dócil ministro, o intendente Eduardo Pazuello, fez exatamente o que o presidente dele esperava, colaborando de maneira decisiva para atrasar a vacinação e para ignorar a tarefa central do Ministério da Saúde, que é a de coordenar os esforços nacionais contra a pandemia.

Diante do recrudescimento da pandemia, Bolsonaro cedeu à pressão das forças políticas que o sustentam e, muito a contragosto, demitiu Pazuello. Para seu lugar, o presidente escolheu o médico Marcelo Queiroga – que, se pouco está fazendo para reparar o descalabro que seu antecessor deixou, ao menos dá declarações sensatas, como as que fez à Confederação Nacional de Municípios.

Na ocasião, o ministro, talvez de modo involuntário, praticamente forneceu à CPI da Covid um roteiro pronto e acabado para as investigações. Quando citou a falta de incentivo para o uso de máscaras e para evitar aglomerações, o ministro expôs o comportamento inconsequente do presidente Bolsonaro, que raramente aparece de máscara e frequentemente incita aglomerações. Quando mencionou a importância de um “programa de testagem mais adequado”, trouxe à memória o caso do desperdício de 3,7 milhões de testes que o Ministério deixou vencer e também o fato de que o governo abandonou as metas de testagem, já que não conseguiu cumprir nenhuma. Por fim, quando citou a necessidade de isolamento, o ministro evidenciou a notória irresponsabilidade do presidente, que faz campanha sistemática contra o distanciamento social.

O ministro Queiroga aproveitou o ensejo para informar que, mais de 380 mil mortos depois, o Ministério da Saúde finalmente fará uma “orientação geral” sobre o uso de máscaras e outras medidas preventivas. Pode até ser uma iniciativa honesta, mas, depois de um ano de negacionismo, de sabotagem e de desorientação criminosa por parte do governo e do presidente Bolsonaro, soa como piada de mau gosto.

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Category: Blog

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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