Bolsonaro insulta o Brasil

By | 31/07/2021 8:09 am

É muito provável que Jair Bolsonaro continue sua campanha para minar a democracia, ao lançar dúvidas sobre a lisura das eleições 

(Editorial do Estadão, 31/07/2021)

,O presidente Jair Bolsonaro insultou o Brasil inteiro ao mobilizar as atenções do País para o espetáculo imoral e degradante que protagonizou na noite de quinta-feira. Usando recursos públicos, com transmissão pela TV Brasil e pelas redes oficiais da Presidência, desde o Palácio da Alvorada, residência oficial, e ao lado do ministro da Justiça, Anderson Torres, Bolsonaro disseminou mentiras escandalosas para minar a confiabilidade do sistema de votação brasileiro. Foi um ataque direto e inequívoco à democracia.

Bolsonaro passou a semana prometendo apresentar “provas” – uma “bomba”, segundo definiu – de que as urnas eletrônicas foram fraudadas para prejudicá-lo na eleição passada. Faz três anos que Bolsonaro anuncia ter as tais “provas”, mas nunca as mostrou. Chegado o momento, o presidente passou mais tempo ofendendo o Tribunal Superior Eleitoral – em particular seu presidente, ministro Luís Roberto Barroso, acusado por Bolsonaro de impedir que haja eleições “limpas”, para favorecer o petista Lula da Silva – do que demonstrando a alegada vulnerabilidade do sistema.

Quando afinal resolveu exibir as tais “provas”, limitou-se a mostrar vídeos com falsas denúncias que circulam há anos na internet, um deles produzido por um astrólogo que diz fazer acupuntura em árvores, e a dar crédito a análises estatísticas claramente distorcidas.

Por fim, admitiu candidamente que “não temos prova” e que “não tem como comprovar que as eleições foram ou não foram fraudadas”. Bolsonaro disse haver “indícios”, mas nem isso foi apresentado pelo presidente.

As agências de checagem de informações e a Justiça Eleitoral trabalharam dobrado para verificar, em tempo real, todas as mentiras de Bolsonaro. Mas, na prática, é ocioso esperar que a exposição da patranha seja suficiente para constranger o presidente, pois a mentira é a essência de Bolsonaro e do bolsonarismo.

Afinal, a Justiça Eleitoral já demonstrou inúmeras vezes que o sistema de votação, um dos mais modernos do mundo, é confiável e totalmente auditável. Ou seja, se tivesse um mínimo de boa-fé, Bolsonaro já teria abandonado suas acusações a respeito das urnas eletrônicas.

É muito provável, portanto, que Bolsonaro continue sua campanha para minar a democracia, ao lançar dúvidas sistematicamente sobre a lisura das eleições e ao informar, de forma clara, que não pretende aceitar o resultado do pleito do ano que vem, caso perca.

Evidência disso é que, no mesmo pronunciamento em que pretendeu desmoralizar o sistema de votação, Bolsonaro convocou sua militância a ir às ruas protestar contra o atual sistema de votação. “Eu tenho certeza, se eu pedir ao povo no dia tal, comparecer na Paulista, em São Paulo (…), vai comparecer 1 milhão de pessoas lá”, jactou-se. E emendou: “Se a demonstração popular não sensibilizar as autoridades do Brasil, o que podemos esperar? Que o povo se revolte? Queremos isso?”.

Trata-se de ameaça explícita de insurreição. Ao agir dessa maneira, Bolsonaro torna-se tóxico para a democracia e, convém lembrar, para quem a ele se alia.

Não faz muito tempo, acreditava-se que os militares da ativa e da reserva que integram o governo fossem capazes de moderar o presidente, um insubordinado desde seus tempos de Exército. Se tentaram, fracassaram.

Agora, imagina-se que o Centrão, na figura do novo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, conseguirá refrear os ímpetos liberticidas de Bolsonaro, no mínimo para evitar um impeachment. Contudo, na mesma semana em que nomeou Ciro Nogueira, Bolsonaro chocou o País com seu pronunciamento golpista contra o sistema de votação, reiterou suas acusações levianas contra a Justiça Eleitoral, disse que o Supremo Tribunal Federal “cometeu crime” ao defender o princípio federativo no combate à pandemia de covid-19 e, de quebra, chamou os eleitores de Lula da Silva de “jumentos”.

Bolsonaro, portanto, é caso perdido. Mesmo que quisesse, não saberia ser moderado. O conflito permanente é seu combustível, e arruinar a democracia, sua meta. Nesse caso, só a lei é capaz de moderar Bolsonaro. Está na hora de aplicá-la.

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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