Vacinação obrigatória: saiba quem vai exigir e o que diz a Justiça

By | 10/08/2021 4:40 pm

Prefeitura de SP passou a exigir a imunização de servidores, movimento que tem crescido no País após mobilizações semelhantes no exterior. Especialistas dizem que decisões estão juridicamente respaldadas

Em meio a planos de reabertura, prefeituras de capitais brasileiras, como São Paulo e Rio de Janeiro, têm se mobilizado para reforçar a importância da vacinação contra a covid-19. As medidas adotadas vão desde a necessidade de apresentar comprovante de esquema vacinal completo para acessar bares e restaurantes à obrigatoriedade de servidores públicos tomarem a vacina contra a covid-19.

A determinação do prefeito Ricardo Nunes (MDB) considera decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), de que autoridades poderão adotar medidas de vacinação compulsória, e afeta servidores elegíveis nos grupos de vacinação estabelecidos que desempenham funções na administração direta, autarquias e fundações.

 

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Vacina contra a covid-19 é aplicada em posto da região central de São Paulo Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), comentou a medida nesta segunda-feira, 9, e disse que, por ora, o Estado não planeja fazer algo semelhante. “Nossa opção, neste momento, é avançar na vacinação para todos”, destacou.

“Isso não significa que nós tenhamos qualquer censura em relação a essa decisão da Prefeitura de São Paulo”, apontou, reforçando que cada uma das 645 prefeituras do Estado tem o direito de fazer opções de acordo com suas “necessidades e avaliações locais.”

O secretário estadual de Saúde, Jean Gorinchteyn, reforçou ainda que o governo estadual tem observado que alguns setores, como bares e restaurantes, e prefeituras do Estado, como a Prefeitura de São Paulo, estão fazendo com que as pessoas obrigatoriamente se imunizem para que retornem ao serviço presencial, o que é visto como positivo. “A vacinação é a única forma que nós temos para retomar de forma segura e responsável todas as atividades. Portanto, nós apoiamos essas atitudes”, disse o secretário.

Quais são as prefeituras e governos que estão exigindo a vacinação?

No sábado, 7, a Prefeitura de São Paulo determinou que todos os servidores devem receber a vacina. Além dela, outras cidades decretaram a vacinação obrigatória e também secretarias de estados e municípios. Em Autazes (Amazonas), Castanheira (Mato Grosso) e Niterói (Rio), a vacinação é uma exigência.

Nas secretarias de Saúde dos municípios de Palmas e Recife, os servidores estão sendo obrigados a se vacinar. No Espírito Santo, os servidores da Secretaria de Saúde do Estado também. No Amazonas, a Secretaria de Assistência Social emitiu regulamento exigindo a vacinação para novos contratados e funcionários não vacinados devem cumprir a medida em até dez dias.

Apresentado pelo prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), no final de julho, o plano de retomada da capital carioca prevê que, a partir do dia 2 de setembro, haverá permissão de público em estádios, com 50% da capacidade, e em boates, casas de show e festas em locais fechados, também com 50% da capacidade. Mas só terá acesso a esses locais, segundo o plano, pessoas que tiverem esquema vacinal completo — ou seja, que tenham recebido duas doses ou dose única de vacina anticovid.

A prefeitura do Rio não especifica quais serão as formas de fiscalização do esquema vacinal. Segundo o governo do Estado, as cidades cariocas têm autonomia para adotar decisões como essa.

Que outros órgãos ou grupos estão indo na mesma direção?

O Sindicato de Restaurantes, Bares e Similares de São Paulo (SindResBar-SP), que representa os interesses dos estabelecimentos de alimentação e similares do Estado, publicou uma nota no último dia 5 em que, a partir de guia técnico do Ministério Público do Trabalho (MPT), orienta que quando houver recusa injustificada da vacina anticovid, o “trabalhador deverá ser afastado do ambiente de trabalho, sob pena de colocar em risco a imunização coletiva, e o empregador poderá aplicar sanções disciplinares, inclusive a despedida por justa causa.”

Em resolução conjunta publicada em julho, o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC) determinou que a vacinação contra a covid-19 será obrigatória para todos os magistrados, servidores, funcionários terceirizados, estagiários e voluntários do Poder Judiciário de Santa Catarina a partir da data em que a aplicação estiver disponível para a faixa etária correspondente. Para controle e registro, segundo o documento, cópias dos comprovantes de vacinação deverão ser entregues à chefia imediata.

“A recusa de se submeter à vacinação contra a covid-19 deverá ser apresentada à chefia imediata de forma fundamentada, devidamente instruída com os documentos que demonstram a impossibilidade clínica da imunização, e será autuada como processo sigiloso no Sistema Eletrônico de Informações”, acrescenta a resolução assinada pelo presidente do TJSC, desembargador Ricardo Roesler, e pela corregedora-geral da Justiça, desembargadora Soraya Nunes Lins.

Exigir a vacinação é um procedimento que tem legalidade?

A advogada Adriana Jardim Supione, que faz parte da Comissão Direito do Trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo, explica que a vacinação compulsória não é, necessariamente, uma obrigatoriedade. Legalmente, nenhum indivíduo pode ser forçado a receber o imunizante, mas pode ter direitos reduzidos em casos específicos que podem interferir na coletividade e na vida social. As exceções incluem pessoas que tenham algum tipo de alergia a insumos usados em vacina ou alguma doença que possa ser prejudicada com o uso do imunizantes.

Na avaliação da especialista, a liberdade individual deve ser comprometida levando em conta a proteção de toda a sociedade. Foi o que entendeu também o Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, que aceitou a demissão por justa causa de uma funcionária que negou a vacinação.

“Há um posicionamento muito mais político do que jurídico em relação a não se vacinar e o direito tem que acompanhar as liberdades individuais e as necessidades da sociedade.  Em alguns momentos a liberdade individual vai prevalecer, mas quando há interesse coletivo  e totalmente respaldado, não só em termos nacionais mas internacionais, o direito social deve prevalecer”, argumenta.

O professor Vitor Rhein Schirato, da Universidade de São Paulo (USP), comparou a situação com o crime de dirigir embriagado. O especialista avalia que a questão é individual, mas pode afetar todos ao redor. “Existe uma questão no direito que é você proteger uma pessoa contra ela mesma, é o Estado intervindo na sua liberdade individual, porque tem a proteção da vida e da vida de terceiro, então eu posso exigir que as pessoas se vacinem”, explicou.

O professor também cita a Lei 6.259, sancionada em 1975, período da ditadura militar, que garante a obrigatoriedade de vacinas. “Temos uma distorção do que é liberdade individual. Eu tenho que pesar o que tem efeito coletivo e o que tem efeito individual. Exijo a vacina porque não é uma questão puramente individual e sim coletiva”, explica.

A obrigação pode aumentar a adesão à vacinação?

Médico do Centro de Pesquisa Clínica e Epidemiológica do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (USP), Márcio Sommer Bittencourt ressalta que medidas como as adotadas por São Paulo e Rio devem ser interpretadas de formas diferentes. “A obrigatoriedade de vacinas por motivos profissionais pode, sim, aumentar o uso da vacina, e pode ter impacto muito positivo, mas tem que ser usada de forma muito cautelosa”, diz ao Estadão, ressaltando a importância da definição de critérios claros para que a medida não seja “problemática”.

Bittencourt explica que o controle de entrada, por sua vez, depende de como está a vacinação no local em que a medida será adotada. “Enquanto não se tem vacina suficiente, como é o caso do Brasil, é muito complicado dizer que só vai entrar quem tem vacina”, diz. Segundo ele, a medida pode acabar restringindo a mobilidade de um grupo baseado em um critério que não depende dele. A partir do momento em que a vacina é disponibilizada para todos, o médico entende que a medida parece ser “eticamente justificada”.

“Dependendo do tipo de restrição, existe uma possibilidade de conseguir aumentar a taxa de vacinação. Mas no Brasil isso não deve ser muito importante, porque a taxa de não vacinados por falta de interesse é baixa”, complementa Bittencourt. “Isso é importante em países como Estados Unidos, como França, onde a resistência à vacina é mais alta. No Brasil, a eficácia desse tipo de medida é muito menor. As pessoas não estão se vacinando porque não tem vacina. Quando tiver, a expectativa é que 85%, 90% da população se vacine.”

Em que países há exigência de vacinação?

O presidente da França, Emmanuel Macron, também adotou a vacinação compulsória. Desde o início de agosto os cidadãos franceses precisam apresentar comprovante de vacina para acessar restaurantes e bares, assim como salas de cinema e teatros, caso a ocupação exceda o limite de 50 pessoas.

Em Nova York, a exigência vai além dos funcionários públicos e de setores privados. A norma é que pessoas que não tomaram as doses da vacina sejam proibidas de acessar os bares e restaurantes. Nos EUA, estados e governo federal exigem a vacinação dos servidores públicos.

Na Alemanha, a situação começou a ser discutida após Helge Braun, chefe da Chancelaria Federal, declarar que, caso as infecções aumentem, o país será obrigado a impor a vacinação como critério para o acesso aos bares e restaurantes. A presidente Angela Merkel afirmou que a decisão não deve ocorrer neste momento, mas que pode ser cogitada de acordo com os dados dos próximos meses.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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