Ao reagir ao relatório final da CPI da Covid imitando uma gargalhada tétrica do pai, o senador Flávio Bolsonaro mostra o quanto as verdades narradas em mais de mil páginas preocupam o núcleo do poder, inclusive porque o presidente Jair Bolsonaro já se debate num turbilhão de problemas que traga o Brasil e os brasileiros para o fundo do poço.
Se já não tem uma única resposta razoável para o relatório da CPI e os nove crimes que lhe são atribuídos durante a pandemia, tudo fica muito pior com inflação, miséria, famílias disputando ossos, a classe média irada com supermercado, gasolina e luz, as empresas apavoradas com tudo isso, mais juros e dólar e o mercado em polvorosa.
Veja matéria no final sobre o que é o TETO FISCAL
Só faltava Bolsonaro enterrar o teto de gastos, como fez com o Plano Real. Não falta mais. Paulo Guedes derreteu. Sua equipe bateu em retirada. Logo, a CPI não é o único flanco, é apenas mais um. E que flanco!
Começa agora um empurra-empurra. A PGR adianta que as ações penais contra Bolsonaro já vêm sendo descartadas por iniciativa da própria procuradoria e que por aí não há muito o que fazer, só sobra o crime de responsabilidade, que tem natureza política e depende da Câmara. Mas a Câmara também finge que não é com ela.
É claro que a cúpula da CPI já esperava essas duas fortalezas em defesa de Bolsonaro e não está de braços cruzados. Recorre ao artigo 5.º da Constituição para acionar um plano B, caso a PGR não acate o relatório e não faça nada: uma ação subsidiária privada, em contraposição à ação penal pública. Alerta, a PGR rebate: isso só vale se perder o prazo de 15 dias, não se, neste tempo, disser sim ou não para o todo ou partes do relatório. Ou seja: dar andamento ou arquivar.
Há também um plano B para a Câmara. Notem que o termo “impeachment” não aparece uma única vez nas mais de mil páginas do relatório, mas a CPI já se articula com juristas, principalmente com o ex-ministro da Justiça Miguel Reale Jr., para uma comissão de professores e estudiosos lançar o pedido de impeachment de Bolsonaro, com base no relatório.
Há, portanto, todo um esforço da CPI para que as mais de 600 mil mortes e tudo o que aconteceu de macabro no País durante a pandemia não passem em branco, fiquem por isso mesmo, mas a vida é dura, não é mesmo? E não vai ser fácil furar os bloqueios da PGR, de um lado, e do presidente da Câmara, Arthur Lira, do outro.
Mas nem tudo está perdido. O que a política joga para debaixo do tapete a economia traz à tona: incompetência, desleixo, má-fé. Bolsonaro é uma ilha, cercado de desgraças por todo lado. E o principal culpado, como diz o relatório da CPI, é um só: ele mesmo.
O que é o teto?
(Do Estadão)
O teto de gastos foi criado em 2016, por meio de uma emenda constitucional, e prevê um limite para as despesas do governo. Esse teto é corrigido todos os anos pela variação da inflação acumulada em 12 meses até junho do ano anterior. Para 2021, por exemplo, a ampliação do teto será de 2,13%.
Por que o teto é importante?
O teto foi uma das primeiras medidas propostas pelo governo Michel Temer como forma de ancorar as expectativas de investidores após um período de forte aumento dos gastos e da dívida pública brasileira. Os juros estavam elevados, refletindo as incertezas sobre a sustentabilidade fiscal do País, o que tornava mais caro para o Brasil emitir títulos e se financiar no mercado. Economistas defensores do teto atribuem a ele o ambiente atual de juros em mínimas históricas e de maior confiança na sustentabilidade fiscal do Brasil, mesmo após o aumento de gastos devido à covid-19.
Qual é o problema?
O teto é corrigido pela inflação, mas cada item de despesa tem seu próprio ritmo de evolução. Gastos obrigatórios, como benefícios previdenciários e salários, têm historicamente crescido acima da inflação. Na prática, isso significa que o espaço para gastos da máquina pública, investimentos e até um aumento de despesas para programas sociais é cada vez menor.
De onde vem a pressão?
Integrantes do próprio governo e lideranças do Congresso defendem maiores gastos, principalmente em investimentos em infraestrutura, como forma de impulsionar o crescimento após a pandemia. A própria equipe econômica, por sua vez, propôs um drible no teto para bancar gastos com o Auxilio Brasil, novo programa que será a marca social do governo Jair Bolsonaro. As manobras foram criticadas e classificadas de contabilidade criativa por economistas.
O que está em jogo?
Defensores do teto dizem que uma mudança na regra poderia minar a credibilidade da política fiscal do Brasil. Integrantes da equipe econômica já alertaram diversas vezes para o risco de, sem o teto, os juros aumentarem e o governo precisar elevar ainda mais a carga tributária para financiar os gastos federais.
Nossa opinião
- Desobedecendo aos limites impostos pelo Teto Fiscal, o governo dá com uma mão (o Auxílio Brasil ou Auxílio Eleição) e tira com a outra, incentivando a inflação que corrói o salário de quem ainda tem salário. Rico não sente a inflação por que ganha o suficiente para encarar qualquer novo gasto. Pobre é quem sofre pois o dinheiro fica cada vez mais curto. E ele tem que correr a atrás de osso e asa de frango. (LGLM)