Moro se torna o ‘sonho’ dos militares para a terceira via

By | 01/11/2021 4:13 pm

Santos Cruz declara apoio à candidatura do ex-juiz à Presidência; Moro deve definir nesta semana se aceita concorrer pelo Podemos

Marcelo Godoy

Marcelo Godoy, Repórter especial

Jornalista formado em 1991, está no Estadão desde 1998. As relações entre o poder Civil e o poder Militar estão na ordem do dia desse repórter, desde que escreveu o livro A Casa da Vovó, prêmios Jabuti (2015) e Sérgio Buarque de Holanda, da Biblioteca Nacional (2015).

Caro leitor,

definição de Sérgio Moro sobre sua candidatura pelo Podemos em 2022 despertou a atenção dos militares. O ex-juiz é de quase uma unanimidade na caserna, não só por ter colocado Luiz Inácio Lula da Silva atrás das grades, mas também por simbolizar as ideias do salvacionismo da República e do combate à corrupção, que acompanham a maioria das manifestações políticas dos militares desde a criação da República.

 Sérgio Moro
O ex-ministro Sérgio Moro. Foto: Gabriela Biló/Estadão

Era 24 de abril de 2020 quando o ministro dos sonhos da caserna decidiu deixar o governo para o qual fora convidado em 2018, quando ainda ocupava a 13.ª Vara Criminal Federal, de Curitiba. Acusava o presidente Jair Bolsonaro de interferir na Polícia Federal, particularmente na superintendência carioca do órgão, responsável entre outras investigações por verificar supostos crimes eleitorais cometidos pelo senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ).

A investigação sobre a rachadinha nos gabinetes da família Bolsonaro se havia transformado então em uma briga nos tribunais, onde o filho rico do presidente tentava a todo custo parar a investigação alegando ilegalidades, para não enfrentar processos de consequências imprevisíveis. Não era então a única preocupação policial do governo. O domínio da PF seria fundamental para Bolsonaro e seus aliados diante das ações que o bolsonarismo ensaiava, investigadas nos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos.

Na manhã da demissão de Moro, um general da ativa disse à coluna que estava “pessimista” em relação ao futuro do governo. Outro resolveu lembrar o gesto do então comandante do Exército, Edson Leal Pujol, que, preocupado com a covid-19, dias antes estendera o cotovelo para o presidente que tentava apertar a sua mão em meio à cerimônia de posse do comandante militar do Sul, general Valério Stumpf. A cena irritou Bolsonaro, que não havia engolido o fato de um dia Pujol tê-lo chamado de “político peculiar”.

A pandemia, que estava apenas em seu começo, colecionaria entre suas vítimas um dos protagonistas daquela cerimônia no Comando Militar do Sul, o general Antonio Miotto, que entregara o cargo a Stumpf. Os militares jamais entenderam por que Bolsonaro jamais visitou um hospital para parabenizar médicos e se compadecer com os doentes e seus familiares. Em vez disso, a Nação o ouviu dizer com desdém: “Eu não sou coveiro”. Depois de mais de 600 mil mortos, o relatório da CPI da Covid tentou mostrar que Bolsonaro foi justamente o que negou ser.

 

Jair Bolsonaro Eduardo Pazuello Motociata Rio de Janeiro
General Eduardo Pazuello (à esq.) com o presidente Jair Bolsonaro em ato pró-governo no Rio. Foto: Wilton Junior/Estadão

Mas o tempo passou, e as crises se sucederam. O general Eduardo Pazuello se tornou ministro da Saúde, faltou oxigênio em Manaus – um colossal descaso logístico apontado por especialistas militares à coluna –, e veio o comício em que o presidente convidou o general da ativa para saudá-lo no palanque no Rio, pouco depois da demissão de Pujol e dos demais comandantes militares. A ausência de punição de Pazuello pelo ato de indisciplina poupou a cabeça do atual comandante, general Paulo Sérgio de Oliveira, mas se tornou um vitória de Pirro para o presidente. Bolsonaro ganhou a batalha, mas perdeu seu Exército.

O que antes era manifestação de uma parte dos oficiais superiores, desconfiados pelos rumos de um governo que eles majoritariamente sufragaram em 2018, transformou-se em torcida pelo surgimento de uma candidatura viável da chamada terceira via. O primeiro desejo foi que o vice-presidente, Hamilton Mourão, pudesse ocupar esse espaço. Mas a relutância de concorrer contra Bolsonaro, fez com que pouco a pouco os olhares se deslocassem para outros possíveis candidatos, como o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

O surgimento de Moro, como um nome viável eleitoralmente e decidido a concorrer contra sua nêmesis – Lula – e seu ex-chefe – Bolsonaro –,  voltou a movimentar agora as águas das casernas. “O que eu não quero é a polarização entre Bolsonaro e Lula, que não vai ajudar em nada o Brasil. Olho para as outras candidaturas válidas e, dessas, se o Moro confirmar a sua presença na disputa, vou nessa. Vou apoiá-lo. Se o Moro se candidatar eu vou apoiar. De todas as opções, neste momento, estou com o Moro”, afirmou o general Santos Cruz à coluna.

 

General Santos Cruz
Para general Santos Cruz, é preciso encontrar governante que restaure honestidade e união nacional. Foto: Monusco/Sylvain Liechti

Nenhum segredo. Há muito ele e outros militares nutrem relações e simpatias pelos magistrados que de alguma forma tiveram seus nomes ligados às decisões da Lava Jato. Esse é o caso também do desembargador Thompson Flores, que presidiu o Tribunal Regional Federal-4 (TRF-4) entre 2017 e 2019, tempo em que o tribunal julgava os processos de Lula. Se dependesse de Mourão e outros, Flores seria ministro da Justiça ou ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), como fora o seu avô,  Carlos Thompson Flores.

Assim, Santos Cruz deixa claro que, em um segundo turno, apoiará qualquer candidatura que rompa a “polarização”. O ex-companheiro de ministério de Moro verbaliza ainda apenas o que outros generais já disseram: torcem por Moro ou por algum outro candidato da terceira via. Esse é o caso também do general Paulo Chagas, que foi candidato ao governo do Distrito Federal em 2018. Assim também pensa a maioria dos generais e coronéis da ativa ouvidos pela coluna. Moro, no entanto, representa para todos a possibilidade de pôr um “sonho” nos trilhos: o trem descarrilado dos militares quer provar que sua carga só não salvou o País pela condução desastrosa do maquinista Jair Bolsonaro.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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